Visão do Direito

A democracia que falta na maior entidade de classe do Brasil

"A ausência de voto direto para a presidência do Conselho Federal é incompatível com os princípios de democracia, igualdade e transparência que a OAB defende publicamente"

Everardo Gueiros - Ex Desembargador Eleitoral, candidato a OAB -  (crédito:  Ed Alves/CB/DA.Press)
Everardo Gueiros - Ex Desembargador Eleitoral, candidato a OAB - (crédito: Ed Alves/CB/DA.Press)

Por Everardo Gueiros* — O processo eleitoral das seccionais da OAB é, sem dúvida, momento crucial para a advocacia nacional. Neste ano, mais uma vez, os advogados demonstraram sua dedicação ao exercer o direito de votar e serem votados. Esse protagonismo dos advogados merece reconhecimento. É por meio do engajamento da classe que o espírito democrático permanece vivo na OAB. Contudo, é preciso destacar que o atual modelo eleitoral das seccionais, embora necessário, não atende plenamente às expectativas de transparência e eficiência.

A construção de um modelo eleitoral sólido deve observar critérios rigorosos de transparência, respeito aos prazos e celeridade processual. Além disso, é indispensável garantir a independência das comissões eleitorais das seccionais, para que não pairem suspeitas sobre a condução e os resultados dos pleitos. Essas questões tornam-se ainda mais relevantes quando olhamos para o cerne do sistema de governança da OAB: a eleição da diretoria do Conselho Federal. Atualmente, essa escolha ocorre de forma indireta, com os conselheiros federais — eleitos pelas seccionais — determinando quem ocupará os cargos de liderança nacional. O modelo está longe de refletir os anseios da advocacia brasileira.

Explico. Cada seccional elege três conselheiros federais, que formam um colégio eleitoral de 81 membros. Esse pequeno grupo decide os rumos da Ordem em âmbito nacional, em nome de mais de um milhão de advogados brasileiros. Não é difícil perceber que essa concentração de poder enfraquece a representatividade e cria um distanciamento entre a base da advocacia e as decisões estratégicas que impactam toda a classe.

A ausência de voto direto para a presidência do Conselho Federal é incompatível com os princípios de democracia, igualdade e transparência que a OAB defende publicamente. Como advogados, somos protagonistas nas lutas pelo Estado de Direito e pelas garantias constitucionais. É inadmissível que esses valores não sejam plenamente aplicados dentro da própria instituição que os representa. A implementação de eleições diretas para a escolha da diretoria do Conselho Federal não é apenas uma questão de modernização. Trata-se de corrigir uma distorção histórica que limita a participação democrática de todos os advogados na escolha de seus líderes nacionais. Essa mudança fortaleceria a legitimidade da instituição e reforçaria o vínculo entre a OAB e seus membros.

A luta por eleições diretas no Conselho Federal é uma causa que transcende interesses individuais ou de grupos. Trata-se de garantir que cada advogado, de norte a sul do país, tenha voz ativa na definição dos rumos da maior entidade de classe do Brasil. Trata-se de reafirmar que a OAB pertence aos advogados e deve refletir os valores democráticos que eles defendem diariamente em suas práticas profissionais.

Diferentemente de uma suposta elite da advocacia que insiste na manutenção do status quo, eu e muitos outros continuamos a acreditar na necessidade de mudanças profundas. A chama do inconformismo que me move ainda queima intensamente. Não é apenas uma questão de discordância com o sistema atual, mas de compromisso com a construção de uma OAB mais democrática, mais transparente e mais conectada com os interesses de sua base.

A mudança não é apenas desejável, ela é urgente. Que os próximos anos sejam marcados pela coragem de transformar a OAB em uma entidade ainda mais democrática e representativa. A advocacia brasileira merece nada menos que isso.

*Advogado e ex-desembargador eleitoral

 


Opinião
postado em 12/12/2024 03:00
x