
Elisa Alonso* e Leonardo Rosler** — No intrincado cenário jurídico brasileiro, poucos temas despertam tanta inquietação quanto a incidência de tributos sobre condenações e acordos trabalhistas. Entre as diversas obrigações fiscais que permeiam as relações de trabalho, as contribuições ao Sistema S emergem como um ponto de atenção crucial. Apesar de amplamente conhecidas por seu papel no financiamento de programas sociais e educacionais, essas contribuições escondem armadilhas legais e financeiras que podem transformar um processo aparentemente encerrado em um passivo inesperado.
As contribuições ao Sistema S possuem natureza parafiscal e são instituídas por lei com o objetivo de financiar entidades de interesse de categorias econômicas e profissionais, como o Serviço Social da Indústria (SESI) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Previstas no artigo 240 da Constituição Federal e regulamentadas por legislações específicas, como a Lei n.º 8.029/1990 e a Lei n.º 9.715/1998, essas contribuições são calculadas sobre a folha de pagamento das empresas e destinam-se a custear programas de formação profissional, promoção do bem-estar social e desenvolvimento econômico setorial. Sua arrecadação é feita pela Receita Federal do Brasil, que repassa os valores às entidades beneficiárias.
No âmbito trabalhista, o debate sobre a incidência dessas contribuições em condenações e acordos é marcado pela divergência entre a obrigatoriedade legal de recolhimento e a competência da Justiça do Trabalho para exigi-las. Embora o Tribunal Superior do Trabalho (TST) tenha reiteradamente decidido que não cabe à Justiça do Trabalho determinar o recolhimento das contribuições ao Sistema S, essa decisão não exime as empresas da responsabilidade de realizar o pagamento, conforme previsto na legislação vigente.
Sob o prisma tributário, a questão apresenta uma série de desafios para as empresas. A jurisprudência atual do TST limita a cobrança, no contexto de condenações trabalhistas, às contribuições previdenciárias patronais (20%) e ao adicional do Risco Ambiental do Trabalho (RAT). Contudo, não exclui a incidência das contribuições ao Sistema S, apenas transfere a competência de cobrança para a Receita Federal do Brasil. Esse cenário gera insegurança jurídica para as empresas, especialmente em relação a possíveis autuações fiscais futuras, já que as contribuições ao Sistema S incidem sobre remunerações, incluindo aquelas oriundas de decisões trabalhistas.
A ausência de campos específicos para o registro dessas contribuições nos sistemas de declaração, como o e-Social e a DCTF-Web, embora aparente ser um ponto favorável às empresas, também pode agravar os riscos de retroatividade, caso a Receita Federal venha a cobrar esses valores de forma retroativa. Além disso, a possibilidade de revisão do entendimento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) eleva o grau de incerteza, podendo culminar em uma obrigatoriedade mais abrangente e imediata de recolhimento.
As consequências financeiras podem ser severas, sobretudo considerando o impacto de multas, juros e correções monetárias. Empresas que possuem Termos de Cooperação com entidades do Sistema S estão ainda mais vulneráveis, uma vez que tais acordos reforçam a legitimidade da cobrança direta pelas entidades, conforme já reconhecido em decisões judiciais do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Diante desse contexto, é essencial que as empresas implementem estratégias preventivas, incluindo uma revisão detalhada de seus registros tributários e trabalhistas, bem como a criação de provisões contábeis para cobrir potenciais passivos fiscais. Paralelamente, recomenda-se um acompanhamento constante das discussões judiciais e legislativas sobre o tema, a fim de antecipar mudanças normativas e jurisprudenciais que possam impactar diretamente suas operações.
Nesse cenário, destaca-se a influência direta da incidência das contribuições sobre a previsibilidade dos custos empresariais em virtude de condenações ou acordos trabalhistas. A ausência de clareza normativa acerca da obrigatoriedade de recolhimento no âmbito de condenações judiciais compromete a capacidade das empresas de realizar um planejamento financeiro preciso. Tal incerteza repercute negativamente tanto na formulação de estratégias de defesa quanto nas negociações de acordos, uma vez que a indefinição sobre a inclusão dessas contribuições na base de cálculo inviabiliza a mensuração exata dos impactos econômicos.
Por fim, a incidência das contribuições ao Sistema S sobre condenações trabalhistas representa um desafio contínuo para as empresas, que devem adotar uma postura preventiva e alinhada às exigências legais, garantindo que suas práticas estejam em conformidade com as normativas vigentes. Em um cenário de incerteza, o acompanhamento das discussões judiciais e a consulta a especialistas tributários e trabalhistas são medidas essenciais para a minimização de riscos e a segurança jurídica das operações empresariais.
*Advogada especialista na área trabalhista do RCA Advogados, atuando no contencioso e preventivo desde 2003
** Do RCA Advogados, gestor de empresas, especialista em direito empresarial e direito tributário
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