Visão do Direito

Enfim, uma justiça tributária!

"Ocorre que essa conta precisa fechar. Se milhões de pessoas cuja capacidade contributiva é nula deixam de pagar imposto — e isso quase por consenso — será necessário identificar aqueles que pagam menos do que sua capacidade contributiva exigiria"

Wagner Balera, professor e especialista em direito previdenciário -  (crédito:  Divulgação)
Wagner Balera, professor e especialista em direito previdenciário - (crédito: Divulgação)

Wagner Balera* — O princípio da capacidade contributiva, inscrito formalmente na Constituição de 1988, é inteligível ao homem comum. Ele expressa o óbvio: quem ganha mais, paga mais. E acrescenta, com a mesma obviedade: quem ganha menos, paga menos. E ousa afirmar: quem não ganha nada, não paga nada.

Eis o que busca, ainda timidamente, o projeto de lei encaminhado ao Congresso Nacional, já alvo dos tubarões de sempre. Quem não tem a mais elementar capacidade contributiva não deve pagar Imposto de Renda, pois sua renda é de nível de subsistência, inapta a ser tributada.

Convenhamos que o valor de referência de R$ 5.000 está bem colocado. Trata-se de uma base que abrange milhões de pessoas situadas na base da escala contributiva. São aqueles, sabemos todos, cujo fim do mês chega bem antes do calendário. Ninguém, nem mesmo os príncipes e potentados, levantará a voz contra esse ponto da tão necessária quanto urgente reforma do Imposto de Renda.

Ocorre que essa conta precisa fechar. Se milhões de pessoas cuja capacidade contributiva é nula deixam de pagar imposto — e isso quase por consenso — será necessário identificar aqueles que pagam menos do que sua capacidade contributiva exigiria. Justiça tributária: quem ganha mais, paga mais.

O projeto sugere — ou melhor, propõe, para a discussão congressual — o valor elementar de R$ 50.000. Algo quase inatingível na cabeça do homem comum. Mas oculta os ganhos de um grupo muito restrito de bem-aventurados que ganham 10, 20, 30 ou 40 vezes mais do que isso.

Mas, alto lá! Querem tirar de mim, que trago investimentos para o Brasil? Que sou um dos patriotas cuja crença neste país é tão grande que me permite investir nos mais diversos projetos? Que gero milhares de empregos? Que impulsiono a exportação de produtos primários? Que estou à frente de negócios beneficiados por incentivos fiscais vultosos? Aí, não!

Quero e vou pagar, mas sem exagero. Por que a conta deveria fechar às minhas custas?

Esse será o embate daqui para frente. E a transparência desse embate permitirá que identifiquemos os congressistas e a serviço de quem eles estão. Quem não aceitar uma justa tributação dos mais ricos não pode, amanhã, receber o voto do mais pobre entre os pobres.

Que bom seria se a comunicação fosse transparente! Se as posições ficassem bem claras! Esse é um tema que consegue escapar das ideologias. A classe dominante (feliz expressão de São João Paulo II) não vencerá essa batalha desta vez.

A capacidade contributiva, finalmente, será levada em conta. A redistribuição — fenômeno viabilizado pela justiça tributária elementar — está ao nosso alcance. E já tem data marcada: janeiro de 2027.

Lembremos a música ufanista da Copa de 1970: "Pra frente, Brasil!"

Advogado, livre-docente em direito previdenciário e coordenador dos cursos de graduação e pós graduação (mestrado e doutorado) da PUC/SP. Doutorando em direito das relações sociais pela PUC/SP*

 

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Por Opinião
postado em 10/04/2025 04:10
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