Entrevista — Jaylton Lopes Jr., professor, ex-juiz do TJDFT

Sucesso na internet, ex-juiz se diz realizado após abandonar a toga

Jaylton Lopes Jr. deixou a magistratura pela liberdade de ensinar e transformar vidas, trocando estabilidade por realização pessoal e qualidade de vida

Ex-juiz Jaylton Lopes Jr

 -  (crédito: Divulgação)
Ex-juiz Jaylton Lopes Jr - (crédito: Divulgação)

Ele trocou a toga, o poder de decidir demandas das pessoas, a estabilidade, a segurança, o status e um salário bruto de R$ 44 mil pela liberdade de escolher os próprios horários, trabalhar muito, mas com mais possibilidade de conviver com a família e, claro, a chance de ganhar uma bolada.

Desde que pediu demissão do cargo de juiz do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), depois de quase nove anos na magistratura, Jaylton Lopes Jr. ouve essa pergunta: por que abandonar uma carreira conquistada por meio de um concurso público que apenas os mais preparados conseguem vencer?

A resposta pode ser vista na repercussão que ele promove nas redes sociais, onde dá aulas on-line, e só no Instagram tem 425 mil seguidores. Ele atua na área de inventários e dá cursos gratuitos para advogados.

O professor Jaylton Lopes Jr. afirma que a mudança na carreira não teve relação com as vantagens financeiras que a iniciativa privada pode propiciar, principalmente para quem, como ele, tem sucesso na carreira. "Foi a transformação que eu estava (e estou) promovendo na vida dos meus alunos", afirma.

Quase três anos depois de pedir exoneração, ele se diz realizado. "Eu agradeço todos os dias pela decisão que eu tomei. Não foi fácil, mas foi importante para mim e para a minha família. Hoje, eu trabalho bem mais, porém de forma mais livre e leve. E isso não tem preço", diz.

A carreira da magistratura é para muitos estudantes de direito um sonho a se realizar. O senhor chegou lá e desistiu. O que o motivou a pedir demissão?

A magistratura foi a realização de um sonho para mim. Ocorre que a minha atuação na docência jurídica me fez enxergar novas oportunidades, tanto no âmbito educacional quanto na advocacia. Além disso, eu percebi que só a iniciativa privada poderia me dar a liberdade que eu sempre quis.

Foi uma questão financeira?

Não. Os juízes no Brasil ganham, merecidamente, um ótimo subsídio. Embora a iniciativa privada possa proporcionar ganhos financeiros maiores, não foi isso que me fez deixar a magistratura. Foi a transformação que eu estava (e estou) promovendo na vida dos meus alunos.

Acha que os vencimentos de juízes são condizentes com a responsabilidade e a carga de trabalho?

Com certeza. Os juízes, no Brasil, precisam ser muito bem remunerados, e por vários aspectos, tais como a responsabilidade do cargo, as limitações impostas pela Constituição e pelos órgãos correicionais e, sobretudo, a excessiva carga de trabalho.

Vemos hoje que muitos juízes acumulam penduricalhos nos salários e ganham acima do teto. Acha correto?

Eu não acho correto um Tribunal criar mecanismos ("penduricalhos") para aumentar indiretamente o subsídio. Aliás, é preciso lembrar que isso não ocorre em todos os tribunais do país. Todavia, entendo que o aumento/reajuste do subsídio é importante para a valorização da magistratura brasileira, porém deve se dar de forma uniforme e por lei, para evitar distorções que, muitas vezes, acabam maculando a imagem do Poder Judiciário.

Acredita que na universidade os estudantes não têm noção da vida prática na carreira de juiz?

Sim. Muitos acham que juiz apenas julga processos, mas poucos têm a exata noção das outras responsabilidades, especificamente no tocante à gestão de processos e à gestão da unidade jurisdicional.

Qual conselho o senhor pode dar para quem está na universidade e ainda não escolheu o caminho no direito?

Procure pesquisar sobre as carreiras jurídicas. E o mais importante: não escolha uma carreira apenas por questões financeiras. De nada adianta ganhar bem, por exemplo, como Juiz ou Promotor de Justiça, e não estar satisfeito na carreira. Quando isso ocorre, quase sempre quem perde é a população.

O senhor tem milhares de seguidores nas redes sociais. A que atribui esse sucesso?

Acredito que esse alcance não vem apenas dos números, mas da verdade que carrego na fala. Eu compartilho o que realmente vivo (as lutas, os aprendizados, as audiências, os acertos e tropeços da advocacia real). E talvez seja isso que cria conexão: eu não falo de um pedestal, falo de dentro da trincheira. Não me distanciei da prática. Ainda respiro os prazos, os atendimentos, os desafios do foro. E é justamente por viver isso, todos os dias, que ensino com a alma de quem sente na pele, não apenas a teoria, mas, sobretudo, a vivência. Nas redes sociais, encontrei uma nova sala de aula. E, ali, tento ensinar o que não se aprende nos livros: a coragem de começar, a importância da simplicidade, e a beleza de transformar conhecimento em resultado. Se hoje há muitos que me escutam, é porque eu nunca deixei de escutar a realidade da advocacia e o coração dos colegas.

Como tem sido sua vida desde que deixou o Tribunal de Justiça do DF?

Eu agradeço todos os dias pela decisão que eu tomei. Não foi fácil, mas foi importante para mim e para a minha família. Hoje, eu trabalho bem mais, porém de forma mais livre e leve. E isso não tem preço.

Como foi a sua formação profissional?

Minha formação profissional não começou em grandes centros nem em instituições renomadas. Começou em uma pequena faculdade particular do interior da Bahia, simples, como eram meus recursos naquele tempo. Eu não tinha como sair da minha cidade para estudar longe, mas tinha algo que ninguém podia me negar: vontade. No direito, encontrei uma porta. E decidi atravessá-la com coragem. Não foi fácil, mas agarrei aquela oportunidade como quem agarra a última chance de mudar de vida. Estudei com dedicação, enfrentei dificuldades e venci limitações. Depois da graduação, veio a advocacia e a especialização. E mais tarde, o cargo de juiz e o mestrado em Portugal.

O que tem mudado na atividade profissional de quem escolheu o direito? Como a IA impacta o trabalho de quem está começando?

A inteligência artificial já não é algo distante. Ela já faz parte do cotidiano. A IA não substitui o advogado. Ela substitui tarefas repetitivas, burocráticas e técnicas. A verdade é que advogados que sabem utilizar IA substituirão aqueles que não sabem. O direito está mudando. Mas a essência da advocacia permanece: servir à Justiça, com inteligência, e agora também, com tecnologia.

 


postado em 19/06/2025 05:00
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