Música

Produtores musicais traçam panorama para mercado da música em 2021

Entre outros temas, Leandro Brito, Gustavo Vasconcelos, Rick Bonadio e Papatinho falam sobre novas configurações provocadas pela pandemia. Confira dicas para entrar ou se consolidar no mercado este ano

Transformado pela pandemia do novo coronavírus, o ano de 2020 apresentou duas dinâmicas principais para a produção e a projeção da música no país. Em uma, os profissionais do setor foram forçados a fazer uma pausa na realização de shows e eventos presenciais, o que gerou grande e repentino impacto no mercado fonográfico. Em outro, testemunharam a aceleração de uma tendência: a digitalização da música, que hoje ocupa diversas plataformas on-line, e dialoga com o grande público como uma experiência multissensorial e interativa.

Diante desta tendência, surge a pergunta: como será o cenário da música em 2021? O Correio conversou com os produtores Rick Bonadio, Papatinho, Gustavo Vasconcelos e Leandro Brito, que, a partir da experiência local e nacional, compartilharam o que esperar deste ano.

Rick Bonadio / Público mais atento

O produtor, compositor, e empresário Rick Bonadio está no mercado há mais de 30 anos, e marcou a história do país por meio das rádios, de realities televisivos de música e do streaming, além de ter colaborado para o legado de nomes como os Mamonas Assassinas e Charlie Brown Jr. Atualmente, ele comanda o Midas Studio e a gravadora Midas Music, em São Paulo. Com a experiência da carreira, e analisando as mudanças enfrentadas no último ano, ele avalia o ano de 2021. “De um modo geral, acho que vai ser um pouco parecido com o segundo semestre de 2020. Ainda não teremos um mercado de shows forte, mas o streaming vai continuar indo muito bem. Os artistas que ficaram receosos de fazerem seus lançamentos, vão entender que não há como esperar e que, felizmente, ainda temos como gravar e gravar música boa”, destaca. Outro lado positivo, segundo ele, é que, por estarem em casa, as pessoas têm prestado mais atenção às músicas. “Acho que isso dá uma melhorada na qualidade das produções. Acredito que vamos continuar tendo uma demanda muito boa por melodias mais trabalhadas, letras mais detalhadas, que tragam a conexão emocional que só a música é capaz de fazer, seja ela alegre ou mais comovente”, explica.

Leandro Brito /Novas plataformas

Dedicando-se à qualidade musical, à criatividade e às oportunidades oferecidas pela plataforma, o brasiliense Leandro Brito alavancou o perfil no YouTube que leva seu nome ao patamar de maior canal de samba e pagode do país, com cerca de 236 milhões de visualizações. Ele conta o que mudou em relação à pandemia e traça um panorama para este ano. “Nos processos não tivemos muitas mudanças. Na verdade, tivemos que nos adaptar para as novas demandas que surgiram. Como os artistas não puderam mais realizar shows com público e outros eventos presenciais, eles procuraram o canal para produzir conteúdos conosco em estúdio e voltados para a internet. A tendência este ano é que essa demanda continue aumentando, e que tenhamos que ocupar novas plataformas, que vêm se popularizando, com os conteúdos que inicialmente iam só para o YouTube”, adianta. Leandro explica que a entrada do samba e do pagode na era digital, conversando também com as novas gerações pelas redes, possibilitou alcance de um público ainda maior. Ele aposta em um grande crescimento do pagode no cenário nacional, que já ocupa boas posições e garante números expressivos com os novos sucessos.

Gustavo Vasconcelos / Compartilhamento

O produtor brasiliense Gustavo Vasconcelos concorda. Ele está há 35 anos no mercado musical da cidade, e comanda festivais como o Prêmio Profissionais da Música, além da produtora GRV. Tendo passado por diversas fases da história da música local, ele acrescenta que este é um ano de parcerias e de valorização das composições. “Os três verbos do nosso ano de 2021 na GRV é ouvir, transformar e compartilhar. É um ano de parceria com todos que estão envolvidos com o trabalho musical e essa união gera uma força qualitativa na cidade e no país. É um indicativo de que estamos entendendo cada vez mais o nosso negócio e sabemos valorizá-lo”, diz. Ele também pontua que os artistas devem estar atentos para proteger suas criações, a partir dos direitos autorais. “Como produtor e gestor, realizo um trabalho que prioriza a longevidade, acessibilidade e sustentabilidade das produções no mercado”, completa. 

Papatinho /Estratégias de monetização

Os produtores concordam que o streaming chegou para reaquecer um mercado que não lucrava com a venda da música desde a queda do CD. As plataformas digitais se consolidam como uma solução que gera oportunidades. Vindo da cena do rap e hip-hop carioca, e ganhando ainda maior notoriedade como membro fundador da ConeCrew Diretoria, Tiago da Cal Alves, ou Papatinho, como é conhecido, se tornou um dos principais nomes da nova geração da produção musical brasileira. Hoje, ele comanda a gravadora Papatunes Records, que está com agenda lotada até o meio do ano. Papatinho escolheu 2021 para lançar o primeiro disco autoral da carreira (Workaholic). Ele destaca que a visibilidade das plataformas digitais fez o cenário mudar. “O Spotify está pagando razoavelmente bem, o Google paga, o YouTube paga, entre outros. Hojé em dia, há uma possibilidade de arrecadação com a música em si, que no meu início era fora da realidade. E isso é legal, porque motiva os artistas dedicados que precisam dar este passo para continuar vivendo do sonho. É um mercado em que os independentes ganham, podendo produzir e subir sua própria música por meio dos agregadores digitais, assim como as gravadoras, que voltaram a lucrar.”

Em linhas gerais, a expectativa é a de que o ano de 2021 ainda terá seus desafios e incertezas, mas também será marcado por maior qualidade nos processos de produção musical. É um ano para colaborações, busca por inovação e originalidade, e desenvoltura artística ainda mais voltada ao meio digital. Os profissionais da área devem se preparar para ouvir, estudar o mercado e combinar técnica, criatividade e emoção. Com promessas, em meio aos desafios, como começar e se destacar no funil do mercado musical?

Confira as dicas dadas pelos produtores

1. Se prepare, trabalhe habilidades artísticas, e ouça muita música.

2. Crie um conceito artístico que te diferencie, ofereça originalidade, mas que ao mesmo tempo alimente um público abrangente.  

3. Se não souber como começar, avalie as estratégias que têm dado certo para o seu nicho no mercado. Especialmente as usadas por novos artistas em ascensão, que se aproximam da sua realidade. Os grandes nomes passam por uma trajetória diferente. 

4. Construa uma equipe de trabalho e estude o que é necessário para desenvolver e gerenciar uma carreira artística. 

5. Invista na produção de conteúdos criativos, ainda que inicialmente de baixo orçamento e com recursos básicos (uma boa câmera, iluminação e captação de som), e disponibilize nas plataformas digitais e redes sociais.

6. É muito importante observar e interpretar o que o público fala nas redes, assim como os números. O início é feito de tentativa e erro, com adequações do conteúdo.

7. Por estar em casa, a tendência é a de que o público analise melhor a qualidade das letras e melodias. Então busque profundidade, mesmo em canções de entretenimento.

8. Se couber na sua proposta, teste parcerias e combinação de gêneros musicais. É uma tendência, especialmente com o público mais jovem, que atualmente é mais eclético. É uma oportunidade de aumentar seu público e oferecer novidade.

9. Conheça bem as plataformas de distribuição e os espaços de divulgação. Se preocupe com os direitos autorais e processos burocráticos, como forma de proteger, monetizar e potencializar o trabalho autoral.

10. Estude estratégias de lançamentos de acordo com o gênero, sempre acompanhando de que forma e por onde seu público consome música (seja em formatos curtos: como EPs e singles; ou mais longos: como shows, álbuns ao vivo) 

*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira