Música

Filho de Tim Maia descobre disco em espanhol gravado pelo cantor

Disco foi gravado por Tim Maia em 1970 em homenagem ao amigo Cassiano. ‘Yo te amo’ está nas plataformas digitais e tem nove faixas

Irlam Rocha Lima
postado em 02/06/2021 06:00
 (crédito: Paola Antony/CB/D.A Press)
(crédito: Paola Antony/CB/D.A Press)

Tim Maia, morto aos 55 anos, em março de 1998, vítima de falência múltipla dos órgãos, deixou um imenso vácuo no universo da MPB, muita saudade entre os fãs e também um valioso acervo. Aos poucos, preciosidades escondidas no baú de relíquias começam a se tornar públicas. A descoberta vem sendo feita por Carmelo Maia, filho e administrador do legado deixado pelo cantor e compositor carioca.


Chegou recentemente às plataformas digitais Yo te amo, álbum que traz nove faixas, com versões em espanhol de sucessos, como Azul color del mar, Coroné Antônio Bento, Primavera, a faixa título e canções menos conhecidas, entre as quais Cristina, Fuiste tu e Risas. O disco foi gravado em 1970, quando Tim, em plena forma, brilhava com vozeirão e suingue impressionantes — principais características do seu canto.


Segundo Carmelo, faltou-lhe ar ao ouvir as fitas encontradas, por estarem naquele ambiente as falas, o jeitão, a respiração, os erros de gravação. O material recebeu tratamento especial, sendo restaurado e remasterizado pelo engenheiro de som André Dias, que precisou usar soluções de engenharia muito específicas, com alto nível de complexidade, para reconstruir e restaurar partes perdidas e danificadas do conteúdo.


“Foram meses restaurando trecho a trecho de cada música. A manipulação era alta, complexa, para reconstruir a estrutura harmônica e distribuição especial, para que cada detalhe e toda a magia dos arranjos e de performance fossem percebidos”, explica Dias, que utilizou tecnologia alemã para limpar ruídos. “Propositalmente, foram deixados no disco partes de conversas que vazaram das fitas”, acrescenta.


Yo te amo, que homenageia Cassiano, parceiro e amigo de Tim Maia, morto recentemente, foi gravado no estúdio Vitória Régia, e conta com a participação de Fininho (baixo elétrico), Luiz Meio Quilo (guitarra), Cabeçote (vibrafone), Célio (piano e órgão), Mesquita, Doria, Cinara e Soninha Terremoto (backing vocal). Tim tocou violão, bateria, percussão, além de ser autor dos arranjos.


Em apenas 18 anos de carreira, oficialmente, Sebastião Rodrigues Maia, nascido no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, tornou-se um dos personagens de maior representatividade da moderna MPB. Com o nome artístico de Tim Maia, lançou 26 discos, sendo 23 de estúdio (incluindo Yo te amo) e três gravados ao vivo. Responsável pela introdução do funk e do soul no país, emplacou incontáveis sucesso, entre os quais Do Leme ao Pontal, Gostava tanto de você, Me dê motivos, Não quero dinheiro, O descobridor dos sete mares e Vale tudo. Teve músicas gravadas por nomes estelares como o amigo Roberto Carlos, Elis Regina e Marisa Monte.

» Entrevista / Carmelo Maia

Como era a relação com seu pai?
Com o Sebastião, uma relação normal entre pai e filho, cobrava estudos, estudei em colégio de freiras e, quando pôde, foi me buscar. Era um show à parte, parava o trânsito na Tijuca, era o momento dele comigo. Me amou da maneira dele. Quando descia no aeroporto Santos Dumont de madrugada, evidentemente todos estavam dormindo, a campainha era sua voz. Todos sabiam que meu pai havia chegado. Com a voz do trovão, não deixava uma alma descansar.

A partir de que idade você passou a acompanhar o trabalho de Tim Maia?
Desde os 18 anos, quando comecei a fazer os borderôs dos show do Canecão.

O que consta do acervo do Tim, que está sob sua administração?
Tudo o que foi dele um dia está comigo. Desde suas marmitas, quando era somente o “Tião Marmiteiro”, o cordão da foto do disco de 1970, blusas dos shows, fitas masters. Enfim, um grande acervo.

Quando garimpou o material do álbum que está sendo lançado?
Eu estava digitalizando parte do acervo, priorizei as fitas que estavam oxidando.

Qual foi sua reação ao descobri-lo?
Quando abriu os primeiros acordes, com um grave e idioma diferentes, foi um misto de alegria e confusão na cabeça, pois eu sabia que ele tinha resgatado seus sonhos ou projetos deixados na década de 1970. Costumo dizer que meu pai foi um cometa que passou, não deu para acompanhar, hoje ainda é muito à frente de sua época. Assim como levou os discos da fase Racional e nenhuma gravadora abraçou, não foi diferente com o álbum em espanhol. Deixou guardados por anos e mais tarde retomou com outra voz.

Havia mais músicas do que estas incluídas no Yo te amo?
No quesito organização, tudo dele não existe um padrão. Já encontrei música inédita na mesma master com outras canções que não tinham relações. O trabalho é de garimpo mesmo. Escutar uma a uma.

Como avalia o trabalho do engenheiro de som André Dias, no restauro do material?
Para trabalhar comigo, só posso estar munido dos melhores do mercado. Afinal, prestarei contas quando eu subir! Ninguém chega ao sucesso sozinho. André era um dos nomes cotados por mim pela sua especialidade em restaurar material analógico e delicado. Minha exigência foi para que não editasse, não fizesse recortes, que preservasse todos os erros de gravações, todo o ambiente criado pelo meu pai. Se tivesse esporro, deixasse. Registros que jamais teremos e de uma riqueza que só o gordinho mais simpático do Brasil sabia fazer.

Na sua análise, que importância teve Cassiano (morto em 7 de maio passado, vítima da
covid-19) para a obra de Tim?
Cassiano foi de extrema importância e influência musical para o meu pai. Afinal, estamos diante de dois gênios, tiveram muitas coisas em comum, autores de clássicos das músicas românticas com temperos condimentados à “la black music”, amigos, negros e dois malucos-beleza. Tínhamos um encontro pré-agendado após a vacinação dele, mas Deus não quis.

SERVIÇO

Yo te amo
Álbum inédito de Tim Maia com nove músicas em
espanhol. Lançamento nas plataformas digitais.

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