ARTES PLÁSTICAS

Após depredação de sua obra, Galeno defende que arte deve estar ao alcance da população

Desde jovem, o artista que cresceu em Brazlândia produz como autodidata, além do calçadão do Veredinha, é possível conferir seu trabalho nos painéis com imagens sacras encontradas no interior da igrejinha da 308 Sul

Os moradores de Brazlândia conviveram por quase 30 anos com a obra de um dos artistas mais importantes do DF, Francisco Galeno, autor dos desenhos em pedras portuguesas no calçadão que circunda o lago Veredinha. Nessa semana, a população foi surpreendida com a remoção do trabalho — que fazia parte da memória da cidade — por uma reforma conduzida pela Administração Regional.

Com a indignação, o Governo do Distrito Federal anunciou o restauro do patrimônio e a polêmica não deixou de ser uma oportunidade para que artistas e defensores da cidade chamassem a atenção para a importância do cuidado com obras públicas e, principalmente, as que estão nas ruas.

Galeno conta que a obra foi o seu grande presente à cidade onde cresceu. Quando estava sendo construído, no início dos anos 1990, ele mesmo foi à administração pedir que fosse feito o seu desenho na calçada. O artista, que não foi remunerado pela obra, frisa que a arte é fundamental para a educação, porque ela desperta a sensibilidade.

Do seu atelier na cidade de Parnaíba, no Piauí, onde vive, ele segue produzindo suas pinturas, esculturas e instalações, além de intervenções em espaços públicos na cidade. Defensor da democratização da arte por meio de instalações de locais com acesso público, Galeno foi surpreendido com a notícia da depredação e se dispôs a colaborar com a restauração. “Quanto mais a arte sair das galerias e dos museus e forem para as ruas, melhor! Ela valoriza o ser humano. A arte salva!”, declara.


Origem

A trajetória de Galeno se confunde com a origem de Brasília. Sua família chegou à capital federal ainda nos anos 1960. A arte sempre foi um trabalho de família, que era composta por artesãos. O bisavô era mestre carpina, nome dado a quem produzia canoas, e o avô, vaqueiro, produzia peças de couro, como gibão, arreios e selas para montaria. A mãe era rendeira, atividade difícil, segundo ele.

Desde jovem Francisco é um autodidata da arte. No início, se interessava por paisagens e figuras humanas, mas logo percebeu que tinha que buscar algo a mais. Foi quando passou a trazer para a arte a sua infância no Piauí. E assim, mesclando cores alegres e geometrias inspiradas na arquitetura de Brasília e nos formatos das dunas, das canoas, surgiu sua inspiração.

Além do calçadão do Veredinha, o piauiense também deixou como legado para o DF os painéis com imagens sacras encontradas no interior da igrejinha da 308 Sul, a convite do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Na época, há cerca de 20 anos, a obra sofreu resistência por parte da comunidade local. “Uma senhora chegou para mim e disse ‘isso é feio, você é feio e você não é daqui’, referindo-se às minhas pinturas”, relembra o artista em tom divertido, pois não deixou de se sentir um filho legítimo de Brasília.

*Estagiário sob a supervisão de Juliana Oliveira