Música

"O Brasil é uma parte grande do Ezra Collective e do nosso som", diz Femi Koleoso

Em entrevista ao Correio, baterista fala sobre o show da banda no Brasil e a importância do país para esse que é um dos maiores grupos de jazz da atualidade

Banda de Jazz Ezra Collective -  (crédito: Alyah Otchere/Divulgação)
Banda de Jazz Ezra Collective - (crédito: Alyah Otchere/Divulgação)

Com a radiodifusão, internet e todas as consequências da globalização, é muito provável que algo feito em um lugar possa influenciar alguém do outro lado do mundo. Um bom exemplo disso é a banda de jazz Ezra Collective. O grupo inglês está em alta e chega ao Brasil pela primeira vez esta semana para selar uma relação que já existe há anos, pois os sons do nosso país são fonte de inspiração para a carreira dos jazzistas.

A banda se apresenta em São Paulo no próximo sábado. Esta é a primeira vez que o quinteto formado por Femi Koleoso, TJ Koleoso, Ife Ogunjobi, James Mollison e Joe Armon-Jones desembarca no Brasil, mas o país estava no coração deles desde sempre. "O Brasil é uma parte grande do Ezra Collective e do nosso som", conta o baterista Femi em entrevista ao Correio.

O músico, que já esteve no Brasil em seis oportunidades tocando em bandas de nomes como Gorillaz e Jorja Smith, conta que cada memória que fez no Brasil passaram a fazer parte das influências da banda. Das músicas que ouviram — Femi é fã de Gilberto Gil, Azymuth, Liniker, Clara Nunes e sonha em colaborar com Marcos Valle — até uma visita ao barracão da escola de samba paulistana Vai-Vai. "Nós somos influenciados muito pelo sabor do carnaval, pela sensação de inclusão e dançar sem se importar com quem está olhando ao seu redor. Esse é o Brasil que nos inspira", reflete.

Femi percebe que há muito em comum entre a maioria da banda e os brasileiros. "É a cultura, são as pessoas, é a luta, são as coisas que amamos, as coisas que não amamos e o fato de que, de algum jeito, nós sempre dançamos no final. Isso que eu amo e me conecta com o Brasil", analisa o artista.

Nigeriano radicado em Londres, o baterista também tem uma relação intensa com o futebol que o aproximou da cultura brasileira. "Muitas das pessoas que ganharam Copas do Mundo pelo Brasil se parecem fisicamente comigo, e eu me via nelas", afirma. "A primeira Copa que lembro é a de 2002. O Brasil ganhou e eu senti que nós tínhamos ganhado. Torci para seleção brasileira do início ao fim", lembra. A relação com o futebol é tão forte que ele até escolheu um time no Brasil. "Eu sou Corinthians. Vai Corinthians!", diz, em português, o artista que torce para o Arsenal, na Inglaterra.

Para Femi, a relação está no fato de que se sente representado pelos brasileiros que compartilham da mesma cor de pele a mesma vontade de festa que ele tem. "Eu me lembro de andar na rua em São Paulo e ouvir pessoas conversando em Iorubá. Eu sou nigeriano e vi gente que se parecia comigo", conta. "Quando você tem um país com uma diversidade tão vasta, você acaba representando muito mais do que só o seu próprio povo e isso é incrível", enaltece. "Tirando Londres e a cultura Nigeriana, a nossa conexão mais profunda é com o Brasil", completa.

Por isso, a banda acredita que estará leve no palco do Cine Joia, no bairro da Liberdade, em São Paulo. Eles apresentam a turnê do álbum Dance, no one's watching, que em tradução literal significa "dance, ninguém está olhando". Dessa forma, os músicos convidam o público a viver essa experiência conjunta. "Queremos transformar o Brasil na maior pista de dança da América do Sul. Quero ver as pessoas felizes, livres e que todo mundo possa se expressar", almeja o artista que não perde a oportunidade de deixar claro o carinho que tem pelo país. "Mais do que tudo isso, gostaria que todos soubessem o quanto somos gratos pelo Brasil por tudo que ele representa". "Mal vemos a hora de tocar em casa. Porque estamos em casa no Brasil", conclui.

Boa influência

Não são apenas as referências brasileiras que o Ezra Collective quer espalhar pelo mundo. Os jazzistas tantam o tempo todo se manter no lugar de bons exemplos para os mais jovens. Na Inglaterra, estão sempre nos youth clubs, lugares onde a juventude se encontra para atividades extracurriculares como esportes e artes. O sentimento é de mostrar que estão abrindo portas para os mais novos se aproximarem.

No quesito carreira eles já são figuras que os mais jovens podem se espelhar. Com pouco mais de 10 anos de estrada, eles acumulam mais de 1,8 milhão de ouvintes mensais no Spotify. As faixas mais populares chegam a casa de dezenas de milhões de reproduções. Com um jazz que desafia as barreiras de gênero e se mistura com afrobeat, reggae, hip-hop e soul conquistaram a crítica especializada tendo sido os vencedores do Mercury Prize em 2023, um dos mais prestigiados prêmios da música britânica. Eles também ficaram em segundo lugar na Sound of 2025 da BBC, lista que o veículo do Reino Unido convida críticos musicais para apontar quem deve se destacar e popularizar no ano. O grupo também foi lembrado por Obama na famosa lista de melhores músicas do ano que o ex-presidente estadunidense sempre faz.

Os shows também são ponto forte do quinteto. Além da primeira turnê sul-americana, eles passearam pela Europa em praticamente todos os álbuns da carreira. No Reino Unido são um fenômeno, tendo se tornado os primeiros artistas de jazz a se apresentarem na OVO Wembley Arena, espaço para mais de 12 mil pessoas mais disputado de Londres, em show esgotado em novembro. "Várias vezes podem ter milhares de pessoas olhando para nós, mas quanto mais entramos na música, mais essas pessoas desaparecem. Porém elas desaparecem de uma forma linda. Quando você nos assiste, é possível ter a percepção de como é dançar quando ninguém está te vendo", explica Femi.

O Ezra Collective fez tudo isso com um repertório majoritariamente instrumental. A banda mostra que a força está na energia que transmitem e não no que faz ou deixa de fazer sucesso com público. "É preciso expor as pessoas a outros tipos de músicas e sons. Não é que as pessoas não gostam de música instrumental, é que elas talvez não ouviram", acredita o baterista. "O papel que podemos abraçar é tentar que essa música chegue ao máximo de pessoas possível", acrescenta.

"Eu sou muito grato de saber que as pessoas se inspiram na gente", comenta. Dessa forma, o conjunto quer aproveitar tudo que conquistaram para dividir com os mais novos. "A ideia é retribuir o que fizeram para mim com os próximos que estão vindo e pretendo fazer isso muito mais nos bastidores do que em cima do palco", afirma Femi.

 

  • Banda de Jazz Ezra Collective
    Banda de Jazz Ezra Collective Alyah Otchere/Divulgação
  • Banda de Jazz Ezra Collective
    Banda de Jazz Ezra Collective Alyah Otchere/Divulgação
  • Banda de Jazz Ezra Collective
    Banda de Jazz Ezra Collective Alyah Otchere/Divulgação

Pedro Ibarra
postado em 05/02/2025 06:00
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