Récem-empossado no cargo de vice-presidente executivo de Varejo do Santander, Ede Viani recebeu o Correio durante sua passagem por Brasília. O banco é uma das maiores instituições financeiras do mundo, com forte presença no Brasil. Entusiasta do setor de tecnologia, área que comandou até 2023, ele está percorrendo os oito territórios do banco no país, para levar aos seus colaboradores a "chama" que faz buscar o grande desafio da sua gestão: tornar o banco cada vez mais multicanal.
"A estratégia do banco é ser o banco digital com gente", sintetiza Ede. Ele ainda acredita no valor da agência bancária tradicional, mas atesta que a pandemia da covid-19 e o Pix mudaram para melhor a relação do brasileiro com o mundo digital. Mudou muito. Na medida em que o pix vem transformando o comportamento das pessoas, melhora a relação delas com os canais digitais", aponta.
Confira os principais trechos da entrevista:
Varejo
Estamos empenhados justamente em um novo modelo comercial de varejo, que foca muito o tema da multicanalidade. Existem três elementos que mudaram muito a competição no cenário do serviço financeiro. Primeiro, o comportamento do consumidor mudou muito. A pandemia da covid-19 acelerou muito a digitalização dos negócios, não apenas de serviço financeiro, mas de banco de maneira geral. Depois, vem a própria tecnologia, cada vez mais se fala de assistente virtuais, de Inteligência Artificial generativa. Essas coisas têm impulsionado a forma como esses negócios são feitos. E tem ainda a regulação, que tem impulsionado muito a inovação, com um mercado cada vez mais aberto.
Físico x digital
Buscamos ressignificar o valor da loja física. O Santander tem uma vantagem competitiva quando se olha a distribuição física e o nosso foco é também explorar essa vantagem, falando mais de multicanalidade. Buscamos trazer mais valor da relação com os novos canais e como é que a gente potencializa o valor da nossa rede física como diferenciação do nosso negócio. Mas também é verdade que há uma mudança que se acelera a cada dia. A pandemia provocou uma profunda transformação, na medida em que as pessoas não só pararam de ir ao banco, mas passaram a pedir comida por aplicativo. Isso rompeu muito a aversão que as pessoas tinham à digitalização. Hoje, uma menor parte dos clientes buscam as lojas.
Mas existem diferenças entre os grandes centros e as cidades médias. Existe a questão da regionalização. O uso das redes digitais tende a ser mais comum nos grandes centros. A distribuição física é importante.
Atendimento presencial
Definitivamente, não há necessidade tão premente de estar dentro de uma loja para fazer um pagamento. Dois, três cliques no celular, a pessoa faz uma transferência. Faz uma transferência no sábado às 3:30 da manhã e entra na mesma hora.
Nós seguiremos tendo a loja física. Mas elas serão cada vez menores. Antes, eram prédios imponentes, com dois ou três mil metros quadrados. Hoje temos lojas de 200 ou 300m² para fazer a mesma coisa. E ela seguirá sendo um ponto de distribuição, ela vai seguir sendo necessária para aquela venda mais especializada. Por exemplo, um financiamento imobiliário, em que a pessoa quer entender com mais detalhes. Tem certos elementos da relação bancária que o humano faz mais diferença. A nossa chairman global, Ana Botín, sempre fala que a estratégia é ser um banco digital como lojas. E aqui, a gente tem falado que a estratégia do banco é ser o banco digital com gente. Porque ao final do dia, a gente tem que oferecer toda a conveniência do canal digital, mas o humano que está por trás disso não pode ser esquecido. Aí entra a diferenciação em relação aos bancos puramente digitais, porque ao final do dia, o que a gente quer da distribuição física é extrair valor do fluxo. Nós recebemos 10 milhões de clientes por mês em nossas lojas e, ao final do dia, quem não quer um cliente entrando na sua loja? É sempre uma oportunidade de venda.
Nós temos, no Distrito Federal, 24 lojas com 200 funcionários. E uma carteira de 1,2 milhão de clientes. O fluxo de clientes nas agências em Brasília é em média de 110 mil clientes ao mês.
O que queremos como banco, é crescer a base de clientes, em especial em Brasília, que é um dos maiores mercados do país. Não acreditamos que precisa abrir mais pontos de venda. (No DF) temos mais de 100 mil folhas de pagamentos, majoritariamente do serviço público, mas temos uma boa parte de clientes privados também.
Universidades
É uma marca do Santander no mundo. Somos a empresa que mais investe em ensino superior e a gente faz isso no mundo inteiro. No Brasil, temos convênios com 400 universidades. Em 2023, no Distrito Federal, nós oferecemos 5.600 bolsas de estudo.
As universidades escolhem os alunos através do processo seletivo que elas mesmas organizam. A gente não opina e eles têm direito a bolsa de estudos de um semestre fora do país em universidades parceiras.
Carteira de crédito
Crescemos na carteira de crédito e queremos seguir expandindo em todos os segmentos. Os dados mais recentes, de setembro, mostraram que a carteira de crédito total havia crescido 7,9%, alcançando R$ 625,5 bilhões. Não temos restrições e em um cenário de inadimplência mais controlada, a gente também reavalia sempre os modelos de risco. Na expectativa de que a economia retome o crescimento, a gente também vai acelerar o crescimento do crédito com mais velocidade. A inadimplência fechou em 3% no terceiro trimestre de 2023.
Crédito sustentável
Estamos em fase de balanço, por isso não posso entrar em detalhes. Mas somos impulsionadores da economia verde no mundo e nós temos investimentos em infraestrutura, em energia limpa. O Santander é dos principais estruturadores de crédito de infraestrutura no mundo. No Brasil, compramos a Waycarbon justamente para investir em transição energética e em sustentabilidade.
Inovações
O Brasil está conseguindo se abrir mais e os bancos conseguem competir com essa questão digital, o setor financeiro é muito regulado. Ele é assim no mundo inteiro. Mas o Brasil é um dos países mais avançados em uma estruturação do sistema financeiro, a gente não deve nada a ninguém, do ponto de vista de estruturação do sistema financeiro. O nosso regulador é conhecido por ser bastante estimulador. O pix e o Open finance são um ótimo exemplo disso. Os Estados Unidos, agora que estão implantando o sistema de pagamentos instantâneo. Então o regulador no Brasil é um impulsionador de um sistema mais aberto. Isso é muito bom.
Open finance é um grande simulador de competição. Porque um cliente que, por exemplo, do Santander, dá o consentimento para passar os dados para o Itaú, pode haver uma oferta melhor para aquele cliente. É isso que o regulador está fazendo, está estimulando um mercado cada vez mais competitivo. É claro que os bancos classificados como bancos S1, S2, que são maiores, têm, obviamente, uma carga de regulação e de tributação mais pesada. Então, de fato, essas coisas existem e elas são debatidas e o regulador está sempre ouvindo e sempre puxando a inovação. Mas o peso disso tem a ver com o tamanho que cada agente tem no sistema financeiro.
Competição
É saudável, mas traz custos elevados. Nós temos investido, e muito, em modelagem de dados e capacidades extrair valor a partir de dados. A gente tem a história do nosso relacionamento com o cliente e tem uma certa quantidade de dados. À medida que a gente traz dados dos outros bancos, a gente incorpora isso e isso nos permite fazer uma oferta mais personalizada. Temos investido muito na personalização.
Temos aumentado a nossa base. A base total de clientes cresceu 12% até o 3º trimestre de 2023, na comparação dos 12 meses. Eram 64,6 milhões de clientes até o fim do terceiro trimestre. Um desafio do setor como todo é crescer com velocidade ainda maior e o desafio ainda maior é rentabilizar isso. Os custos são elevados.
Taxas elevadas
O tema das taxas elevadas tem muito a ver com o patamar da taxa básica, a Selic. No campo individual, no caso a caso, é possível agregar informação que permite dar crédito ou melhorar preço. Pode ser que no agregado não se tenha feito toda a diferenciação, mas, sim, no indivíduo tem tido efeito.
O que a gente acredita, de maneira geral, é que quanto mais aberto o mercado for, melhor para a competição. Esse tema de definir patamares máximos não é o que é necessário para estabelecer a competição. O cliente sempre vai poder escolher. O comportamento do consumidor mudou muito e hoje a oferta é abundante. A gente não vive mais aquele cenário que tem poucos bancos e os clientes não têm opções. Definir patamares máximos de remuneração de taxa ou de preço pode ser legítimo em outra situação, mas o que acontece é que isso aí acaba afetando as decisões do banco de apetite de risco. Ao final do dia, a gente tem que gerir, especialmente no crédito, as perdas. A taxa básica é que determina o patamar de onde as coisas estão e a partir dessa taxa básica que o banco coloca o seu apetite de risco e sua estratégia de competição. Eu acredito mais no mercado aberto de competição.
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