Controle da inflação

BC sinaliza freio no ritmo da taxa Selic

Redução dos juros em meio ponto percentual, para 10,75% ao ano, era esperada. Mas o comunicado do Copom limitou projeções futuras apenas à próxima reunião

Apesar das pressões do setor produtivo para maiores cortes nos juros, o Banco Central manteve a cautela tradicional e sinalizou que poderá reduzir a magnitude do ritmo de redução da taxa básica da economia (Selic) nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom). Na segunda reunião do ano, o colegiado decidiu, ontem, por unanimidade, reduzir a Selic em 0,50 ponto percentual pela sexta vez consecutiva, de 11,25% para 10,75% ao ano.

Apesar do corte, o Brasil continua no ranking dos maiores juros reais (descontada a inflação) do mundo, atrás apenas do México (ver quadro). Além de mostrar maior preocupação com o cenário externo, devido às incertezas sobre a redução de juros em vários países, pelo fato de a inflação ainda demonstrar resistência para voltar para à meta, o Copom mudou a narrativa dos comunicados anteriores e não deixou uma sinalização futura (forward guidance) para as próximas reuniões.

No texto, retirou o plural, deixando a janela aberta para corte do mesmo tamanho apenas para a próxima reunião, em meio ponto, o que fez alguns analistas cogitarem a Selic no fim de 2024 acima da mediana das previsões do boletim Focus, do Banco Central, de 9% ano, chegando, em alguns casos, até a 10% ao ano. “Os membros do Comitê, unanimemente, optaram por comunicar que anteveem, em se confirmando o cenário esperado, redução de mesma magnitude na próxima reunião”, informou o comunicado do Banco Central, após o término do segundo dia do Copom. Segundo o documento, “essa é a condução apropriada para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário”, ou seja, com juros reais (descontada a inflação) acima do nível neutro (que não interfere na atividade econômica), taxa que varia entre 4,5% e 5%, dependendo das projeções do mercado.

O economista Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central e professor adjunto da Georgetown University, em Washington, recorda que o Copom “puxou o freio” no comunicado no mesmo dia em que o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) decidiu manter o intervalo de juros básicos entre 5,25% e 5,50%. Ele alertou para os riscos inflacionários dos EUA em pleno ano eleitoral, que podem, inclusive, fazer com que o Fed aumente os juros em vez de reduzir.

“O mercado comprou muito a tese do pouso suave aqui, e está totalmente comprado. Mas estou vendo um cenário de riscos que estão sendo sub precificados e não parecem estar no radar dos gestores de política econômica em vários países. Não é uma crítica que eu faço ao Brasil, especificamente. Ninguém está pensando nisso”, alertou Volpon. Ele não descarta que as projeções para a Selic no fim do ano aumentem. “A Selic terminal está mais perto de 10% anuais, entre 9,50% e 9,75%”, afirmou.

Decisão esperada

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, lembrou que a decisão do Copom não surpreende, pois a única dúvida era se haveria mudança no forward guidance da política monetária para buscar o centro da meta de inflação de 3% neste ano e no próximo. “Foi o que aconteceu. A partir de agora, as decisões são apenas sobre a próxima reunião, não ampliando para frente. Faz sentido, pois os riscos permanecem elevados no fiscal e na inflação de serviços e a inflação segue desancorada da meta, em 3,8%, em 2024, e em 3,5%, em 2025”, explicou.

“A decisão confirma nossa expectativa de a Selic chegar a 9,25% no fim do ano. Até lá, vão ser poucas novidades vindas do BC. A maior incerteza virá no segundo semestre”, acrescentou. Na avaliação de Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, ao abandonar o plural na sinalização futura, o Copom » Rosana Hessel Estou vendo um cenário de riscos que estão sendo subprecificados e não parecem estar no radar dos gestores de política econômica em vários países” Tony Volpon, ex-diretor do BC e professor adjunto da Georgetown University “passou a seguir a estratégia do Fed, de reunião a reunião”.

William Jackson, economista-chefe de Mercados Emergentes da Capital Economics, a mudança da orientação futura do Copom apoia a tese de que que o ciclo de flexibilização dos juros vai desacelerar para cortes de 0,25 ponto percentual “em breve”, mais provavelmente na reunião de junho. Portanto, “a taxa Selic não será reduzida tanto quanto a maioria espera este ano”. Ele considera “altamente provável” outro corte na Selic de 50 pontos-base na próxima reunião do Copom, em maio, para 10,25% e acredita que “a mudança na orientação futura não exclui outro corte de 50 pontos-base na reunião subsequente, em junho”. Contudo, Jackson reconheceu que, com o mercado de trabalho mais aquecido, a inflação de serviços deve continuar elevada, e, por conta disso, o Copom poderá escolher mais cortes de 0,25 ponto percentual. Ele manteve a previsão para a Selic em 9,5% no fim do ano.

De acordo com Daniel Cunha, estrategista-chefe da BGC Liquidez, o mercado deverá fazer ajustes marginais para cima nas projeções futuras dos juros, a partir de hoje, após a sinalização do Copom em mudar a narrativa de orientação para os próximos cortes. “Apesar de o cenário-base não ter se alterado de maneira significativa, a autoridade monetária entende que a incerteza aumentou, o que demanda uma maior flexibilidade na condução da política monetária. Mantemos nosso cenário-base de mais duas reduções de 0,50 ponto percentual e uma final de 0,25 ponto com a Selic terminal em 9,5%”, completou.

 

 

 

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