
Em dia marcado por acusações de ambos os lados na guerra comercial entre Estados Unidos e Brasil, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, voltou a comentar sobre a reunião desmarcada com o secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, na última semana. Em um evento organizado pelo canal de notícias Times Brasil, o titular da pasta defendeu que não há má vontade do governo brasileiro em negociar com os norte-americanos, e que essa falta de abertura está inteiramente ligada ao governo de Washington.
"Pairava uma dúvida: será que o governo brasileiro está sabendo negociar? Será que o governo brasileiro está fazendo gestão diplomática junto ao governo dos Estados Unidos para sentar à mesa? E nós quisemos dissipar essa dúvida, demonstrando cabalmente, até por meio de documentos, de que a má vontade não partia do Brasil. A má vontade partia dos Estados Unidos", disse, ontem, o ministro.
Haddad explicou que, quando recebeu o e-mail de Bessent, marcando dia e horário da reunião, ele já sabia que, ao divulgar a notícia, o governo corria o risco de haver alguma obstrução por parte de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, preso preventivamente no caso do suposto golpe tramado após as eleições de 2022.
No último dia 15, o filho 03 do ex-presidente, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, postou em suas redes sociais uma foto ao lado do secretário norte-americano, que teria sido tirada no mesmo dia em que haveria a reunião do ministro de Lula com o representante do governo do presidente Donald Trump.
Diante disso, o chefe da Fazenda comentou que os EUA tentam impor uma solução "constitucionalmente impossível" ao Brasil, que seria a interferência do Poder Executivo no Judiciário, se referindo às críticas do governo norte-americano ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. "Nós não temos uma situação constitucional que nos permitisse, política e juridicamente, atuar no caso. Então, gerou-se um impasse, que é pedir o que não pode ser entregue", acrescentou.
Ainda na semana passada, o governo anunciou um plano de contingência para socorrer os setores e empresas afetadas diretamente pela tarifa de 50% aplicada pelo governo norte-americano às importações de produtos brasileiros. A medida provisória publicada em Diário Oficial prevê um crédito especial na casa de R$ 30 bilhões para este público, além do incentivo à manutenção de empregos e à compra de produtos de exportadores.
Apesar da promessa de estimular a economia, ao mesmo tempo em que há o objetivo de socorrer os mais impactados pelo tarifaço, o mercado avalia que ainda há muitas incertezas sobre o programa, o que pode repercutir no resultado fiscal do governo ao final do ano. Mesmo assim, o ministro ressaltou que o governo vai atingir o cumprimento das metas previstas até o ano que vem. "Tem lei, tem um arcabouço fiscal, tem uma LDO, tem uma lei orçamentária, e nós vamos cumprir o que está pactuado", sustentou Haddad.
Dólar e bolsa
Ontem, o dólar comercial encerrou o dia em queda de 0,68%, cotado a R$ 5,43. A valorização da moeda norte-americana ante o real vai na mesma direção que a maioria dos outros países. O Índice DXY, que mede a força da divisa mundo afora, subiu 0,27%. Já o Índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Ibovespa/B3) surfou na direção contrária à maré negativa e emplacou a primeira alta da semana, de 0,72%, aos 137.321 pontos.
O otimismo de investidores é reflexo de projeções mais animadoras para a economia brasileira em 2025, principalmente após a divulgação do Boletim Focus, pela manhã. O relatório, publicado pelo Banco Central, reduziu em 0,1% a estimativa para a inflação em 2025, em apenas uma semana.
Para o analista da Ouro Preto Investimentos Sidney Lima, o movimento reflete a combinação de câmbio mais estável e menor pressão de atacado, confirmando a 12ª revisão consecutiva para baixo da expectativa para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). "Além disso, as projeções para o PIB foram mantidas neste ano, com Selic em 15% ao fim de 2025, sinalizando que, embora a atividade mostre sinais de enfraquecimento, há espaço para expectativas mais benignas sobre preços", destaca Lima.
Otimismo
O especialista em mercado financeiro e sócio da G2W Invest, Ciro de Avelar, por sua vez, acredita que o mercado já vê os dados do Boletim Focus como positivos. O que ainda deve seguir no radar é a forma com que o governo brasileiro vai lidar com a pressão na atividade econômica que foi freada pelo tarifaço. Ele ressalta que, com os incentivos fiscais, a dívida do país deve aumentar, o que traz um nível a mais de incerteza para o mercado brasileiro.
"Essa baixa também da inflação é puxada por essa baixa do dólar, que teve desde o tarifaço. E a gente entende que vai continuar essa volatilidade, principalmente por causa das incertezas da política econômica norte-americana e das incertezas da política fiscal brasileira", considera Avelar. Por outro lado, o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) recuou 0,1%, mas abaixo das expectativas do mercado. O dado é considerado por economistas como a "prévia do PIB".
Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular
Enquanto a bolsa brasileira se saiu bem nesta segunda-feira, não é possível afirmar o mesmo dos índices norte-americanos e europeus. Nos EUA, o Dow Jones e o S&P 500 apresentaram leve recuo de 0,08% e 0,01%, enquanto que o Nasdaq ficou praticamente estável, com ligeiro avanço de 0,03%. Na Europa, o índice Euro Stoxx 600 fechou praticamente estável, com 0,01% de alta, enquanto que as bolsas de Paris (-0,5%) e Frankfurt (-0,18%) tiveram resultados negativos ao final do pregão.
O dia também foi marcado pelo encontro de líderes europeus com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Na agenda do republicano, houve um encontro com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, para tratar sobre a guerra no leste europeu, o que causou um movimento de espera dos mercados sobre o resultado da reunião, que ao final não surtiu efeitos mais imediatos.
Para o analista de investimentos Felipe Sant'Anna, as bolsas ficaram "murchas" no primeiro dia da semana, pela expectativa que havia no mercado por uma negociação melhor, que envolvesse alguma proposta mais concreta de ambos os lados. O especialista ainda destaca que os investidores aguardam uma possível sinalização do presidente do Federal Reserve (Fed) — o banco central dos EUA —, Jerome Powell, a respeito da taxa de juros no país, que segue entre 4,25% e 4,5% ao ano, mas com perspectiva de corte já para a reunião de setembro.
Saiba Mais
Economia
Economia
Economia
Economia
Economia
Economia