Nota técnica

Sem regulamentação do home office, seguir nota do MPT evita judicialização

Confira análise de Silvia de Almeida e Rodrigo Perrone, especialistas em relações do trabalho e sócios do Almeida Barros Advogados sobre o teletrabalho

Isabela Oliveira*
Talita de Souza *
postado em 14/02/2021 17:51 / atualizado em 14/02/2021 19:28
Silvia de Almeida Barros é especialista em relações do trabalho -  (crédito: Fernando Zeferino/Divulgacao)
Silvia de Almeida Barros é especialista em relações do trabalho - (crédito: Fernando Zeferino/Divulgacao)

Confira análise de Silvia de Almeida Barros e Rodrigo Perrone advogados, especialistas em relações do trabalho, sócios do Almeida Barros Advogados:

“Em tempos de isolamento social e a necessidade de se evitar aglomerações, as atividades econômicas se tornaram restritas gerando diversas alterações no mercado de trabalho.

Devido à pandemia que assola o mundo e também o nosso país, as empresas brasileiras foram obrigadas a se adaptarem a esta situação atípica, sendo o home office uma importante ferramenta para a manutenção de suas atividades e dos empregos, bem como da preservação da saúde de seus colaboradores em face do alastramento da covid-19, e do lapso temporal a que estamos nos sujeitando.

Assim, do dia para a noite, as empresas foram obrigadas a colocar os funcionários em regime de home office para dar continuidade às atividades da empresa, situação que gera diversos desafios e dúvidas, como o fornecimento das ferramentas de trabalho para esses empregados, questões ligadas a saúde do trabalhador, jornada de trabalho, além de horas extras e controle dessas.

Apesar da importância dessas alterações, a Consolidação das Leis do Trabalho não prevê normas específicas a respeito do home office, portanto, estão sendo adotadas as regras gerais do teletrabalho, previstas nos artigos 75-A a 75-E, como regulamentação dessa matéria polêmica.

Ocorre que essas regras não são suficientes para resolver os desafios que envolvem esta nova modalidade de trabalho, ocorrendo, portanto, uma enorme insegurança jurídica a respeito de diversos pontos que abrangem o home office, como no caso das horas extras, controle de jornada etc.

Diante desta situação, o governo editou a Medida Provisória nº 927, a qual aborda diversos temas ligados ao trabalho remoto, porém essa já perdeu a sua vigência. Em razão desse vácuo legislativo, surge a Nota Técnica do Ministério Público do Trabalho (MPT), no qual se destacam os seguintes pontos:


» O contrato de trabalho deverá ter um aditivo por escrito versando sobre a sua duração, a responsabilidade, a infraestrutura para o trabalho remoto e o reembolso de despesas relacionadas ao trabalho realizadas pelo empregado;

Rodrigo Perrone é especialista em direito e processo do trabalho
Rodrigo Perrone é especialista em direito e processo do trabalho (foto: Fernando Zeferino/Divulgacao)

» As empresas devem ter parâmetros de ergonomia quanto às condições físicas ou cognitivas de trabalho (mobiliário e equipamentos de trabalho, postura física), quanto à organização do trabalho (conteúdos, exigência de tempo e ritmo de atividades), quanto às relações interpessoais no ambiente de trabalho (reuniões, transmissão e feedback dos trabalhos). E ainda, o empregador deve reembolsar os bens necessários ao atendimento destes parâmetros;

» Devem ser respeitadas as disposições contidas na NR-17, anexo II (que versa sobre regras para o trabalho de telemarketing e teleatendimento);

» As empresas deverão adotar uma etiqueta digital para orientar a equipe com relação aos horários para atendimento virtual da demanda, assegurando os repousos legais e o direito à desconexão, bem como medidas que evitem a intimidação sistemática (bullying) no ambiente de trabalho;

» Devem ser criados mecanismos de controle de jornada por meio de plataformas digitais.


Importante acrescer que essa Nota Técnica não é obrigatória, pois não é uma lei, mas um indicativo, uma orientação do Ministério Público do Trabalho a respeito deste tema. Logo, se não for cumprida, poderá gerar fiscalizações com autuações, ações judiciais, bem como Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), nos quais a empresa deverá se ajustar às disposições da Nota Técnica e evitando-se, assim, a judicialização da matéria.

Diante deste cenário, a empresa deverá ter uma política específica para o home office e recomenda-se que a Nota Técnica seja adotada, com o objetivo de se evitar futuras discussões na Justiça do Trabalho.”

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Jornada de oito horas com dias contados?

Mais do que nunca, modelos flexíveis de trabalho estarão presentes na vida das pessoas, por isso até mesmo a jornada de oito horas diárias deve se ressignificar. No episódio 220 do podcast Café com ADM, do portal Administradores.com, o CEO do site, Leandro Vieira, conversou com o mestre em psicologia do trabalho pela Universidade de São Paulo (USP) Alexandre Pellaes.

Alexandre é palestrante, pesquisador e especialista em modelos flexíveis de gestão e o papel da produção individual na vida das pessoas.

O bate-papo abordou as tendências do mercado e porque a maneira como pensamos o trabalho atualmente precisa mudar.

O Café com ADM está disponível em todas as plataformas de streaming, incluindo o Spotify. Quer saber se a jornada de oito horas está com os dias contados? Prepare os fones de ouvido e escute o episódio pelo link: bit.ly/cafecomADM ou então aponte a câmera do celular para o QR Code:

Assédio moral a domicílio

A adoção compulsória do home office impulsionou o crescimento de casos de assédio moral em empresas em 2020. É o que mostra o levantamento da ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, auditoria interna e investigação.

No segundo trimestre de 2020, início da pandemia, o número de denúncias recebidas pela ICTS foi de 926. Três meses depois, entre julho e setembro, 1.329 queixas foram feitas. No último trimestre do ano passado, foram 1.540.

De acordo com os consultores da ICTS Iuri Camilo de Andrade e Antonio Gesteira, os assédios nessa modalidade de trabalho são feitos por meio de diálogo escrito, verbal e não verbal, propagados em ambiente virtual.

Os casos analisados pela consultoria mostram que os fatos ocorreram pelo abalo emocional de colaboradores vivido após o surgimento da pandemia e pela inexperiência no trabalho remoto. Para eles, a ausência de mecanismos de controle para reger a prática fez com que os casos fossem agravados.

Em contrapartida, os especialistas afirmam que também houve aumento na iniciativa das empresas de investigarem as denúncias e solucionarem os casos, o que representa crescimento de 30% em relação ao período pré-pandemia.

 

Estagiárias sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

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