Leste europeu

Otan, Ucrânia e Rússia: entenda o que motivou o conflito no leste europeu

Especialistas explicam como a história do país e sua antiga relação com a Rússia vai muito além do interesse de entrar para a Otan

Camilla Germano
postado em 27/02/2022 16:00 / atualizado em 01/03/2022 10:15
 (crédito: Gênia Savilov / AFP)
(crédito: Gênia Savilov / AFP)

Criada durante a Guerra Fria, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) é uma aliança militar comandada pelas potências do Ocidente. Em 1949, tinha 12 membros e servia como uma frente militar contra a União Soviética (URSS), que seis anos mais tarde criou uma organização própria — o Pacto de Varsóvia.


Considerado como um dos estopins da invasão russa à Ucrânia, a possível entrada da Ucrânia na Otan não vem de hoje. Virgílio Caixeta Arraes, professor de história contemporânea na Universidade de Brasília (UnB), explica que durante o processo de fragmentação da URSS, a Ucrânia conseguiu se tornar independente, mas precisou concordar com algumas medidas, como permanecer alinhada com a Rússia, ou seja, sem se aproximar excessivamente do Ocidente, considerar entrar na Otan ou até mesmo na União Europeia. “Em 1994, a Ucrânia entregou as armas nucleares que tinha, em troca da integridade territorial”.


O professor pontua ainda que mesmo tendo que estar alinhada com a Rússia, a Ucrânia manteria a autoridade como país de se aproximar do Ocidente, caso quisesse. “Mas, ao mesmo tempo, parte da Rússia vai questionar isso, alegando questões de segurança”, explica ele.


Só que, com a queda do governo ucraninano, que tinha ideais mais próximos da Rússia, em 2014, a Ucrânia passou a se aproximar mais uma vez do Ocidente e então a retaliação da Rússia foi retomar a região da Crimeia. “E agora a tentativa de entrada mais uma vez da Otan. E isso seria só mais um pretexto para o Putin”.


Além disso, há também o precedente da entrada de ex-membros da antiga União Soviética na Otan, como Estônia, Letônia e Lituânia. A partir disso, já havia um incômodo russo sobre a entrada de países próximos à ele na Organização. Isso porque houve um pacto formal, que não foi assinado, de que os EUA não iriam abordar países da antiga URSS para entrar na Otan.


É importante frisar que entrar na Otan significaria ter uma defesa coletiva — presente no artigo 5º do Tratado — ou seja, uma garantia de proteção militar em caso de ataques.

 

"As Partes concordam em que um ataque armado contra uma ou várias delas na Europa ou na América do Norte será considerado um ataque a todas, e, consequentemente, concordam em que, se um tal ataque armado se verificar, cada uma, no exercício do direito de legítima defesa, individual ou colectiva, reconhecido pelo artigo 51.° da Carta das Nações Unidas, prestará assistência à Parte ou Partes assim atacadas, praticando sem demora, individualmente e de acordo com as restantes Partes, a acção que considerar necessária, inclusive o emprego da força armada, para restaurar e garantir a segurança na região do Atlântico Norte.<br>Qualquer ataque armado desta natureza e todas as providências tomadas em consequência desse ataque serão imediatamente comunicados ao Conselho de Segurança. Essas providências terminarão logo que o Conselho de Segurança tiver tomado as medidas necessárias para restaurar e manter a paz e a segurança internacionais." Artigo 5.º - Tratado do Atlântico Norte


No entanto, segundo Argemiro Procópio Filho, professor titular de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), a Ucrânia teria muito a perder ao se junta-se a Otan e estreita-se as relações com a Rússia.


“Uma das grandes fontes de renda da Ucrânia são os gasodutos da Rússia e o petróleo russo que passa no território ucraniano. E se ela [Ucrânia] entrasse na Otan os russos iriam fechar essa torneira”, explica o professor Argemiro. “Você não pode brigar com vizinho, vizinho você não escolhe. Ainda que você não goste dele, você tem que se dar bem com ele. A tua paz vai defender o vizinho. A vizinhança, em termos de relações internacionais, é estratégica. Ter boas relações com vizinhos é essencial para você”, ele afirma.


Caminhando para o fim?


Para Argemiro, seria necessário, por parte da Ucrânia, adquirir uma postura de neutralidade entre a Otan e a Rússia, para que o conflito chegue em algum tipo de resolução. “Primeiro passo para a paz é ter paz com o vizinho”.


No entanto, Virgílio Caixeta Arraes, professor de história contemporânea na Universidade de Brasília (UnB), explica que agora que já houve uma invasão por parte da Rússia, é muito mais complexo de se resolver o conflito. “Agora isso é uma questão mundial”, relata. Mas o professor concorda que deve existir um distanciamento entre Ucrânia e Otan para que o conflito encontre alguma resolução.

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