Em um momento de escalada dos confrontos, com a intensificação de ataques russos a cidades estratégicas da Ucrânia, uma notícia pode deixar o clima, dentro e fora da região, ainda mais acirrado. Soldados britânicos podem ter trabalhado a favor dos ucranianos in loco, em Kiev — o que representaria a primeira participação mais direta de forças de um membro da Otan no confronto.
Em entrevista ao jornal inglês The Times, dois comandantes ucranianos informaram que tropas da capital receberam treinamento de forças militares do Reino Unido. No mesmo dia, sem fazer referência à declaração, o governo russo anunciou que a entrada de Boris Johnson, o primeiro-ministro britânico, está proibida em seu território.
De acordo com oficiais de dois batalhões ucranianos, as forças especiais britânicas teriam ido à região para aplicar um curso intensivo para o manuseio do antitanque leve de próxima geração (NLAW), arma de alta potência fornecida pelo Reino Unido. Antes do auxílio, os combatentes ucranianos buscavam ajuda em vídeos na internet.
"Tivemos que ir ao YouTube para aprender, em lições de cinco a sete minutos (…) Depois disso, tivemos um bom treinamento", contou o capitão Yuriy Myronenko, cujo batalhão está acampado na região de Obolon, nos arredores do norte de Kiev.
Oficiais britânicos teriam estado na Ucrânia há duas semanas e treinado os ucranianos "muito bem", relatou Myronenko. "Tivemos sucessos. Agora, temos autoconfiança", acrescentou ao The Times. O Exército ucraniano recebeu mais de 3.600 armas do tipo, que, segundo as autoridades, ajudaram a evitar ataques de tanques russos. As informações foram confirmadas por um segundo comandante das forças especiais ucranianas chamado, pela reportagem, de Skiff.
Também ao jornal britânico, o militar disse que o 112º batalhão, ao qual sua unidade estava ligada, havia passado por treinamento "na semana passada". "Eles eram bons rapazes, os britânicos", informou um subcomandante de Skiff apelidado de Urso. "Eles nos convidaram para visitá-los quando a guerra acabar", revelou. As afirmações não foram confirmadas pelo Ministério da Defesa do Reino Unido, que alega não comentar sobre operações especiais, cumprindo uma antiga convenção.
"Erros de cálculo"
A presença dos soldados britânicos no país não seria novidade: tropas foram enviadas após a invasão da Crimeia, em 2014, mas retiradas, em fevereiro último, para evitar embates diretos com a Rússia, o que poderia incluir a Otan no conflito atual. No início do mês passado, Boris Johnson declarou que não existiam circunstâncias que justificassem o envolvimento da Otan de forma direta na guerra no leste europeu. "É muito, muito importante entender que a Otan é uma aliança defensiva. Esse é um momento em que erros de cálculo e mal-entendidos são muito possíveis", justificou, à época.
O primeiro-ministro e outras autoridades britânicas tiveram ontem a entrada proibida em território russo. "Essa medida foi tomada como uma resposta à desenfreada campanha informativa e política destinada a isolar a Rússia intencionalmente (...) e estrangular nossa economia", informou, em comunicado, o ministério das Relações Exteriores russo. No mês passado, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, também foi alvo da mesma decisão.
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Em resposta, um porta-voz do governo britânico declarou que "o Reino Unido e seus parceiros internacionais estão juntos na condenação das ações repreensíveis do governo russo na Ucrânia e pedindo ao Kremlin que pare a guerra. Continuamos resolutos em nosso apoio à Ucrânia". No início deste mês, Boris Johnson se encontrou com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, em Kiev, para prometer o "apoio inabalável".
Em um comunicado após o encontro, o britânico declarou que a Ucrânia desafiou as probabilidades e afastou as forças russas dos portões de Kiev, alcançando "o maior feito de armas do século 21". "É por causa da liderança resoluta do presidente Zelensky e do heroísmo e coragem invencível do povo ucraniano que os objetivos monstruosos de Putin estão sendo frustrados", declarou.
Fábrica militar e refinaria bombardeadas
Cumprindo a promessa de intensificar os ataques depois de perder, na quinta-feira, seu principal navio simbólico no Mar Negro, a Rússia investiu, ontem, contra ao menos 10 regiões ucranianas — incluindo os bombardeios a mais uma fábrica de armas e a uma refinaria de petróleo. Ao fim do dia, o Kremlin estipulou um novo ultimato para que os militares de Mariupol se rendam — o primeiro foi feito no último dia 20. E o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, alertou que a perda da cidade estratégica "acabaria com qualquer negociação de paz".
Localizado no distrito de Darnytsky, na periferia da capital, o complexo industrial atingido fabrica tanques e armamentos. Segundo o Ministério da Defesa russo, "armas ar-terra de longo alcance e alta precisão destruíram edifícios" da fábrica. O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, afirmou que ao menos uma pessoa morreu e que várias ficaram feridas. "Nossas forças fazem o possível para nos proteger, mas o inimigo é insidioso e implacável", enfatizou.
Um dia antes, uma fábrica armamentista próxima havia sido destruída. O local produzia mísseis Neptune, usados, segundo o Exército ucraniano, para afundar o principal navio da Rússia, batizado de Moskva. Moscou sustenta que a embarcação foi danificada pelo fogo após a explosão da própria munição, e que a tripulação — cerca de 500 homens — foi evacuada. Também ontem, o Ministério da Defesa russo divulgou um vídeo, de 30 segundos, que mostra o encontro entre o chefe da Marinha e tripulantes resgatados do cruzador.
Em meio à guerra de versões, moradores de Lisichansk foram surpreendidos por um incêndio em uma refinaria de petróleo provocado por outro ataque russo. A cidade fica no leste da Ucrânia, área onde tem se concentrado a investida do Kremlin. "Os russos a alvejam sistematicamente para esgotar os socorristas. Não há combustível lá. Apenas resíduos de petróleo são queimados", detalhou, em sua conta no Telegram, o governador Serguii Gaida. Lisichansk e a vizinha Severodonetsk são alvos quase diários dos bombardeios russos, segundo jornalistas da agência France-Presse (AFP) que estão no local.
Mariupol
Ataques com mísseis e bombardeios também ocorreram, ontem, em Donetsk, Kharkiv, Dnipropetrovsk, Poltava, Kirovohrad, Mykolaiv e Kherson. A tensão se concentra em Mariupol, onde, segundo Moscou, toda a área urbana está tomada por forças russas. "Resistem ainda na região alguns soldados ucranianos que estariam ocupando uma fábrica na periferia da cidade", informou o porta-voz russo Igor Konashenkov.
No relato do presidente ucraniano, ambas as forças estão em "um beco sem saída" . Em entrevista ao site Ukraïnska Pravda, Zelensky enfatizou que a "eliminação dos militares" "acabará com qualquer negociação de paz". "É uma crise humanitária, não há alimentos, água ou medicamentos", acrescentou o presidente, acusando a Rússia de "rejeitar" a criação de corredores humanitários.
Zelensky afirmou querer um tratado de paz com Moscou que consista em "dois documentos separados". "Um deles será sobre as garantias de segurança para a Ucrânia, e o outro será diretamente dedicado a suas relações com a Rússia", explicou.
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Fábrica militar e refinaria bombardeadas
Cumprindo a promessa de intensificar os ataques depois de perder, na quinta-feira, seu principal navio simbólico no Mar Negro, a Rússia investiu, ontem, contra ao menos 10 regiões ucranianas — incluindo os bombardeios a mais uma fábrica de armas e a uma refinaria de petróleo. Ao fim do dia, o Kremlin estipulou um novo ultimato para que os militares de Mariupol se rendam — o primeiro foi feito no último dia 20. E o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, alertou que a perda da cidade estratégica "acabaria com qualquer negociação de paz".
Localizado no distrito de Darnytsky, na periferia da capital, o complexo industrial atingido fabrica tanques e armamentos. Segundo o Ministério da Defesa russo, "armas ar-terra de longo alcance e alta precisão destruíram edifícios" da fábrica. O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, afirmou que ao menos uma pessoa morreu e que várias ficaram feridas. "Nossas forças fazem o possível para nos proteger, mas o inimigo é insidioso e implacável", enfatizou.
Um dia antes, uma fábrica armamentista próxima havia sido destruída. O local produzia mísseis Neptune, usados, segundo o Exército ucraniano, para afundar o principal navio da Rússia, batizado de Moskva. Moscou sustenta que a embarcação foi danificada pelo fogo após a explosão da própria munição, e que a tripulação — cerca de 500 homens — foi evacuada. Também ontem, o Ministério da Defesa russo divulgou um vídeo, de 30 segundos, que mostra o encontro entre o chefe da Marinha e tripulantes resgatados do cruzador.
Em meio à guerra de versões, moradores de Lisichansk foram surpreendidos por um incêndio em uma refinaria de petróleo provocado por outro ataque russo. A cidade fica no leste da Ucrânia, área onde tem se concentrado a investida do Kremlin. "Os russos a alvejam sistematicamente para esgotar os socorristas. Não há combustível lá. Apenas resíduos de petróleo são queimados", detalhou, em sua conta no Telegram, o governador Serguii Gaida. Lisichansk e a vizinha Severodonetsk são alvos quase diários dos bombardeios russos, segundo jornalistas da agência France-Presse (AFP) que estão no local.
Mariupol
Ataques com mísseis e bombardeios também ocorreram, ontem, em Donetsk, Kharkiv, Dnipropetrovsk, Poltava, Kirovohrad, Mykolaiv e Kherson. A tensão se concentra em Mariupol, onde, segundo Moscou, toda a área urbana está tomada por forças russas. "Resistem ainda na região alguns soldados ucranianos que estariam ocupando uma fábrica na periferia da cidade", informou o porta-voz russo Igor Konashenkov.
No relato do presidente ucraniano, ambas as forças estão em "um beco sem saída" . Em entrevista ao site Ukraïnska Pravda, Zelensky enfatizou que a "eliminação dos militares" "acabará com qualquer negociação de paz". "É uma crise humanitária, não há alimentos, água ou medicamentos", acrescentou o presidente, acusando a Rússia de "rejeitar" a criação de corredores humanitários. Zelensky afirmou querer um tratado de paz com Moscou que consista em "dois documentos separados". "Um deles será sobre as garantias de segurança para a Ucrânia, e o outro será diretamente dedicado a suas relações com a Rússia", explicou.