Catástrofe natural

Terremoto e alerta de tsunami forçam retirada de milhões de pessoas

Tremor de magnitude 8.8 na escala Richter, na Rússia, leva mais de 10 países a ativarem alerta de tsunami e a removerem milhões de cidadãos de áreas costeiras. Brasileira relata drama enfrentado no Havaí. Especialistas explicam fenômeno

Imagem feita por drone mostra tsunami atingindo a cidade de Severo-Kurilsk, na ilha de Paramushir, no arquipélago russo de Kuril -  (crédito: AFP)
Imagem feita por drone mostra tsunami atingindo a cidade de Severo-Kurilsk, na ilha de Paramushir, no arquipélago russo de Kuril - (crédito: AFP)

As lembranças daquele 26 de dezembro de 2004 ressurgiram, 7.521 dias depois do tremor de magnitude 9.1 na escala Richter (aberta, raramente chega a 10) e do tsunami devastador, que mataram 227.898 pessoas e deixaram 1,7 milhão de desabrigadas na Indonésia, Tailândia, Índia e Sri Lanka. Às 11h24 desta quarta-feira (3/7) (20h25 de terça-feira em Brasília), um terremoto de magnitude 8.8 sacudiu o norte do Oceano Pacífico, a 126 km da costa de Petropavlovsk-Kamchatsky, capital da península russa de Kamchatka (nordeste). 

Com uma profundidade considerada rasa (20,7km), o sismo provocou alertas de tsunami em mais de 10 países e forçou a retirada de milhares de cidadãos de áreas litorâneas de Estados Unidos, Rússia, Japão, Chile, Peru, Equador, Colômbia e México. Horas depois do terremoto, o vulcão Klyuchevskoi entrou em erupção. "É possível ver a lava incandescente fluindo pela encosta oeste. Há um brilho intenso acima do vulcão e explosões", anunciou o Serviço Geofísico da Rússia.

As autoridades de Guatemala, Costa Rica, Panamá, México, Polinésia Francesa, Guam e outras ilhas do Pacífico pediram à população que evitasse atividades aquáticas. Ondas de tsunami podem viajar a 800km/h e atingir regiões logínquas até um dia depois. O sismo de Kamchatka foi o sexto mais intenso desde 1960 e o mais forte da região nos últimos 73 anos. Até a noite desta quarta-feira, não havia informações sobre mortos ou feridos. O Peru fechou 65 portos, e o Equador registrou ondas de até 1,3m em regiões insulares. No arquipélago de Galápagos, a 1 mil quilômetros do contubente, praias e docas foram esvaziadas, e os parques nacionais, fechados. 

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Policial de trânsito peruano bloqueia estrada em La Punta, na província de Callao: "Alerta de tsunami"
Policial de trânsito peruano bloqueia estrada em La Punta, na província de Callao: "Alerta de tsunami" (foto: Connie France/AFP)

Um tsunami inundou o porto de Severo-Kurilsk, no arquipélago de Kuril, a cerca de 350km do epicentro do terremoto. Uma unidade de produção pesqueira ficou totalmente submersa. Alexander Ovslannikov, prefeito do distrito de Kuril do Norte, confirmou que 2 mil pessoas foram retiradas às pressas da localidade, antes de ondas de quatro metros avançarem 400m terra adentro e atingirem um memorial da Segunda Guerra Mundial. Uma moradora de Kamchatka afirmou ao veículo estatal russo Zvedza que, por sorte, chegou a deixar uma mala com água e roupas perto da porta. "Rapidamente a pegamos e corremos. Foi assustador", descreveu. O Japão emitiu uma ordem de evacuação para 2 milhões de moradores, e removeu os funcionários da usina nuclear de Fukushima, por precaução — em 11 de março de 2011, um tsunami de 15m de altura levou à perda de energia da central atômica e provocou um acidente nuclear. 

Em entrevista ao Correio, Uri S. ten Brink, geofísico do Serviço Geológico dos EUA (USGS, pela sigla em inglês), explicou que o terremoto desta quarta-feira ocorreu em uma chamada zona de subdução. "Isso significa que uma placa tectônica passou por baixo de outra. Nesse caso, a Placa do Pacífico moveu-se sob a Placa Norte-Americana, que se estende até a parte mais oriental da Sibéria. Não foi um terremoto catastrófico por três razões: a área é pouco povoada; o Oceano Pacífico é completamente aberto a leste, enquanto a Índia e o Sri Lanka estavam a uma distância relativamente curta do epicento do terremoto de Sumatra; e o tremor de ontem foi menor que o de 2004", afirmou. 

De acordo com Brink, a mesma região onde houve o terremoto desta quarta-feira registrou dois abalos semelhantes: em 1923, de magnitude 8.4, e em 1952, de magnitude 9, além de vários sismos menores. "A atividade é parcialmente intensa porque a Placa do Pacífico subduz a uma alta taxa geológica — oito centímetros por ano, ou seis metros nos últimos 73 anos", observou. 

"Evento histórico"

Por sua vez, Rafael C. Abreu París — também geofísico do USGS, em Golden (Colorado) — classificou o terremoto de Kamchatka como um "evento histórico". "Ele se compara ao terremoto de magnitude 8.8, no Chile, em 2010, como o sexto mais registrado. O impacto mínimo se dá principalmente ao fato de ter atingido uma área pouco habitada. Felizmente,a localização na região de Kamchatka significava que não havia centros densamente povoados que pudessem ser afetados por fortes tremores de terra e/ou tsunamis", disse à reportagem. 

Moradores e turistas deixam Ala Way Harbor, em Waikiki, no Havaí, com medo da chegada das ondas gigantes
Moradores e turistas deixam Ala Way Harbor, em Waikiki, no Havaí, com medo da chegada das ondas gigantes (foto: Eugene Tanner/AFP)

Horas depois do tremor na Rússia, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, confirmou o alerta de tsunami para o Havaí, o Alasca e a costa do Pacífico no país. "Permaneçam fortes e fiquem seguros!", pediu, em publicação nas redes sociais. Moradora de Boston (Massachusetts), a empresária capixaba Carolline Jabour, 42 anos, passa férias no Havaí com o marido, Rony Jabour, e os filhos. "O dia amanheceu perfeito. Fomos à praia, em Honolulu, e, por volta das 14h, as crianças estavam na água, quando recebemos o primeiro aviso. Pensamos que o alerta seria cancelado logo, mas, infelizmente, não aconteceu. Depois do alarme, veio um segundo e, então, chamamos as crianças, evitando alarmá-las. No terceiro aviso, nós as tiramos da água e decidimos ir embora. Quando saímos, vimos que todo mundo fazia o mesmo. O pessoal da Guarda Costeira também começou a retirar os banhistas do mar", contou Carolline ao Correio

Foi nesse momento que Carolline e Rony perceberam a gravidade da situação. "Um percurso até o nosso hotel, no bairro de Waikiki, que costuma durar 20 minutos, levou duas horas e meia. Nós cogitamos ficar nas montanhas, mas o pessoal do hotel pediu que retornássemos ao hotel, pois estávamos no 12º andar e lá era mais seguro", disse a brasileira. Ela descreveu o caos em Waikiki, com viaturas de polícia, bombeiros e helicópteros para ajudarem na retirada dos banhistas da praia. "Todo os restaurantes fecharam, e o barulho era absurdo, pois as sirenes não paravam de tocar nenhum minuto. Tomamos noção do que estava acontecendo. Depois de um banho rápido, preparamos comida e água para o caso de uma emergência. A cada hora, todas as sirenes tocavam e alto-falantes anunciavam que o tsunami poderia estar se aproximando. Os avisos eram feitos em vários idiomas", acrescentou a brasileira. O drama durou a noite inteira e só terminou na manhã desta quarta-feira. "Cheguei a pensar que algo ruim pudesse ocorrer. Vimos o mar recuar e ficar diferente. Foi muito difícil essa experiência."

Morador de Iquique, no norte do Chile, o professor de educação física e surfista Francisco Javier Figueroa, 35 anos, contou ao Correio que o alerta contra tsunami foi dado pelas autoridades às 11h desta quarta-feira (meio-dia em Brasília). "Toda a área costeira da comuna de Iquique foi esvaziada. Muitas pessoas tiveram que sair de suas casas e buscar áreas seguras. Os alarmes para evacução foram dados três horas depois. As primeiras ondas chegaram à costa de Iquique às 14h55 (hora local). Não foram significativas. Houve um aumento no nível do mar de 17cm", relatou. 

EU ACHO...

Uri S. ten Brink, geofísico do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS)
Uri S. ten Brink, geofísico do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS) (foto: Arquivo pessoal )

"Terremotos, como o de Kamchatka, não mudarão o padrão geral das placas tectônicas. No entanto, localmente, é provável que causem elevação e subsidência. É um assunto discutível na comunidade científica mundial até que ponto grandes terremotos desencadeiam outros terremotos ao redor do mundo, mas não existe um consenso claro."

Uri S. ten Brink, geofísico do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS)

"Em relação às características do terremoto, ele teve uma profundidade relativamente rasa de 20,7 quilômetros. O movimento da falha foi de empurrão reverso, um tipo de movimento de falha predominantemente vertical. Este é o tipo de movimento de falha que gera tsunamis, como vimos neste caso. O tremor de Kamchatka foi produzido por uma zona de ruptura com cerca de 390km x 140km de área. Antes do terremoto de magnitude 8.8 de Kamchatka, a região tinha experimentado uma atividade sísmica na semana anterior, que incluiu um evento de magnitude 7.4 e três de magnitude 6.7; todos, agora, são considerados abalos prévios."

Rafael C. Abreu París,  também geofísico do USGS, em Golden (Colorado) 

"O futuro que eu vi", obra da japonesa Ryo Tatsuki
"O futuro que eu vi", obra da japonesa Ryo Tatsuki (foto: Facebook/Reprodução)

O mangá das previsões

O nome do mangá é sugestivo: O futuro que vi, pela tradução literal. Publicada pela primeira vez em 1999, a obra da japonesa Ryo Tatsuki traz uma compilação de sonhos registrados pela autora desde 1985, alguns deles considerados proféticos para muitas pessoas. A própria Tatsuki rejeita a alcunha. Na capa do livro, ela publicou: "O desastre chegará em março de 2011". Nas páginas internas, ela citou um sonho com um grande tsunami. Em 11 de março de 2011, o Japão foi atingido por um terremoto de magnitude 9.1 que matou quase 20 mil pessoas, provocou um tsunami e levou ao acidente nuclear na usina de Fukushima. A capa da última edição do mangá, datada de 2021, traz a frase: "O desastre verdadeiro chegará em julho de 2025". Tatsuki escreveu que, em um de seus sonhos, o assoalho oceânico entre o Japão e as Filipinas rachou, deflagrando um imenso tsunami. Ela até mesmo determinou uma data: 5 de julho. Fãs da autora atribuem a ela as previsões das mortes da Princesa Diana e de Freddie Mercury, líder e vocalista da banda de rock britânica Queen, além da covid-19. 

 

 

  • Policial peruano bloqueia estrada em Callao:
    Policial de trânsito peruano bloqueia estrada em La Punta, na província de Callao: "Alerta de tsunami" Foto: Connie France/AFP
  • Moradores e turistas deixam Ala Way Harbor, em Waikiki, no Havaí
    Moradores e turistas deixam Ala Way Harbor, em Waikiki, no Havaí, com medo da chegada das ondas gigantes Foto: Eugene Tanner/AFP
  • Uri S. ten Brink, geofísico do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS)
    Uri S. ten Brink, geofísico do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS) Foto: Arquivo pessoal
  • "O futuro que eu vi", obra da japonesa Ryo Tatsuki Foto: Facebook/Reprodução
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    Aponte a câmera do celular para o QR Code e assista ao depoimento da turista brasileira Carolline Jabour, surpreendida com o alerta de tsunami no Havaí Foto: QR Code
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postado em 31/07/2025 05:50
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