Venezuela

Após viagem a Oslo, Nobel da Paz prepara o regresso

María Corina Machado faz viagem secreta, com apoio dos EUA, e chega a Oslo depois de ser premiada com o Nobel da Paz. A líder opositora reafirma que voltará ao país "no momento adequado", apesar dos riscos, e anuncia planos para percorrer a Europa em protesto contra o regime de Nicolás Maduro

Na primeira aparição pública depois de 11 meses, a líder opositora venezuelana e ganhadora do Prêmio Nobel da Paz María Corina Machado anunciou para centenas de apoiadores, em Oslo, que atenderá a "diversos convites" que recebeu para eventos na Europa e acompanhará o desenvolvimento da situação no país para regressar quando identificar "condições propícias" de segurança. María Corina vive clandestina desde agosto de 2024, quando foi proclamada a reeleição do presidente Nicolás Maduro, e viajou em segredo, com ajuda do governo norte-americano. Não chegou à capital norueguesa a tempo para a cerimônia de entrega do prêmio, recebido por sua filha, Ana Corina, mas desde o desembarque aproveitou cada oportunidade para atacar o regime de Caracas e agradecer o apoio dos EUA, em especial do presidente Donald Trump.

"Meu retorno à Venezuela será quando considerarmos que existem as condições propícias em termos de segurança, e não depende da saída ou não do regime", afirmou. "Será o quanto antes", antecipou, dirigindo-se a apoiadores reunidos no Grand Hotel de Oslo, que costuma hospedar os laureados com o Nobal da Paz. "Vim receber o prêmio em nome do povo venezuelano e o levarei à Venezuela no momento adequado", continuou. "Não direi quando nem como isso acontecerá, mas farei todo o possível para poder retornar, e também para acabar com essa tirania muito em breve."

Venezuelanos exilados e outros apoiadores aplaudiram María Corina com entusiasmo, quando acenou da sacada do hotel, e depois a receberam na rua com cantos e gritos por liberdade e democracia. A líder opositora aproveitou uma entrevista coletiva para confirmar que sua saída do país, realizada em sigilo, teve apoio e cobertura dos EUA — sem entrar em detalhes sobre como driblou a vigilância policial. Em outro compromisso, no Parlamento norueguês, agradeceu "a todos os homens e mulheres que arriscaram suas vidas" para que ela pudesse viajar a Oslo.

 "Ela disse que vai regressar, mas reconhece também os riscos que isso representa para ela, pessoalmente", disse ao Correio a cientista política venezuelana Maria Isabel Puerta, professora da Universidade Estadual do Colorado (EUA). A acadêmica avalia que o Nobel da Paz "torna mais visível sua luta e a dos venezuelanos, em um momento crítico na luta pela democratização do país". Na mesma linha, o cientista político Orlando Vieira-Blanco, colunista do jornal venezuelano El Universal, elogiou o Comitê do Nobel pela escolha da premiada, e criticou os que questionam a decisão como ingerência externa. "Os direitos humanos não podem continuar sendo subjugados e sujeitos aos postulados de soberania e não intervenção quando um Estado está sequestrado por um regime criminoso", afirmou à reportagem. 

Petroleiro

A reaparição pública da dirigente opositora coincide com o acirramento da crise entre o regime de Maduro e os EUA, que na véspera arrestaram um petroleiro venezuelano e confiscaram a carga a bordo — segundo informações que circularam ontem, o carregamento seria destinado a Cuba. A porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, informou que o navio era objeto de sanções havia anos seria conduzido a um porto norte-americano. Paralelamente, o Departamento de Estado anunciou que as medidas serão estendidas a outras empresas marítimas que transportam petróleo venezuelano.

O comunicado também formaliza a imposição de sanções a três sobrinhos de Maduro acusados de envolvimento com o narcotráfico. Dois deles, Franqui Francisco Flores de Freitas e Efraín Antonio Campos Flores, foram detidos em Nova York, em 2016, e condenados, mas receberam indulto em 2022, durante a presidência do democrata Joe Biden. Como o terceiro, Carlos Erik Malpica Flores, são sobrinhos do presidente por parte da primeira-dama, Cilia Flores.

A apreensão do petroleiro diante da costa venezuelana marca uma nova etapa no cerco político e militar imposto ao regime de Caracas pelo governo de Trump, que em setembro deslocou para o Caribe o grupo naval de combate liderado pelo porta-aviões USS Gerald Ford. A operação, apresentada oficialmente como uma ofensiva contra o narcotráfico, resultou desde então no afundamento de mais de 20 embarcações, com ao menos 84 mortes.

A Venezuela protestou contra o arresto do navio e denunciou-o como "roubo descarado" e "ato de pirataria". Diante da ação militar norte-americana, Maduro decretou mobilização nacional e vem repetindo a promessa de resistir a um ataque direto ao país. Os estudiosos ouvidos pelo Correio, porém, duvidam que o presidente possa levar a efeito as ameaças. "Ele não respondeu às incursões contra as lanchas (afundadas), e o novo episódio é muito mais sério, pois envolve o regime de sanções", disse a professora Maria Isabel Puerta. "O regime carece de capacidades para uma confrontação direta com os EUA", concorda Orlando Vieira-Blanco.

 


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