Visão do Correio

A virada ainda parece distante

Correio Braziliense
postado em 01/12/2021 06:00

Enquanto mais uma onda de contaminação pelo coronavírus varre a Europa, e outra, de preocupação com a nova variante Ômicron, corre o mundo, no Brasil, cidades e setores da economia que faziam contas para o carnaval 2022 já percebem que a folia está longe de representar reais, ou dólares, garantidos em caixa. Mas, antes disso, há outras datas a considerar — no calendário, no orçamento, nas relações sociais e, sobretudo, nas políticas públicas de saúde.

O réveillon também representa, especialmente para cidades turísticas, valiosa fonte de receita. Não é de se estranhar, portanto, que no momento em que a ocasião bate à porta, gestores públicos enfrentem pressão mais ou menos velada para manter a programação da festa.

Até uma semana atrás, essa possibilidade parecia bem plausível, apesar dos alertas que vinham de uma Europa novamente adoecida. O continente africano e a nova variante cuidaram de desfazer, uma vez mais, certezas aparentes sobre a pandemia.

Nesse contexto, convém dar voz aos pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz, que monitoram semana após semana a evolução da crise no país. Na mais recente edição do Boletim Observatório Covid-19, divulgada há dois dias, cientistas da Fiocruz atestam que os indicadores de casos e óbitos vêm mantendo tendência de queda desde fins de junho no Brasil, graças à vacinação. Como consequência, a ocupação de leitos de UTI no período monitorado mostra 24 unidades da Federação fora da zona de alerta — embora chamem a atenção taxas do Distrito Federal (84%), Rondônia (71%) e Pará (65%).

Mas o panorama aparentemente tranquilizador — para um país que já teve praticamente todos os estados com ocupação crítica nas UTIs, em março - vem seguido de um alerta. "O fim de ano se aproxima, e a perspectiva das festas e do verão, em um contexto em que as pessoas vão se sentindo mais tranquilas e relaxadas frente à pandemia, remete para a necessidade de se clamar por cautela e monitorar quaisquer possíveis sinais de recrudescimento da doença", ressalta a Fiocruz.

Ao contrário de relaxar com o atual panorama de baixa transmissão da covid-19, acrescenta, é hora de a América do Sul estar alerta para a possibilidade de disseminação de novas variantes do coronavírus, em um cenário de grande mobilidade internacional.

O boletim mais recente da fundação — que monitora o período de 7 a 20 de novembro — não aborda ainda a nova variante de preocupação identificada na África. Mas um indicador da validade de sua advertência sobre o risco de disseminação de mutações do vírus pode ser medido pelo fato de Belo Horizonte e Brasília, por exemplo, já monitorarem pacientes com suspeita de contato pela cepa ômicron, e de dois casos positivos terem sido identificados no estado de São Paulo. Isso menos de uma semana após alerta do Ministério da Saúde para a mais recente ameaça.

Não por acaso, Belo Horizonte e Distrito Federal estão entre as administrações que não planejam ou cancelaram festas oficiais na virada do ano. Outras capitais vêm se movimentando nesse sentido. Permanece a dúvida quanto ao mais concorrido réveillon do país, o do Rio de Janeiro — que costuma arregimentar multidões e é o mais visado pelos turistas, inclusive internacionais.

Em momento de decisões que têm potencial de impacto para a saúde em todo o Brasil, acima das pressões políticas e econômicas, convém que as autoridades do país se lembrem dos erros provocados tanto por estas quanto por aquelas no início da crise sanitária. O panorama da pandemia vem mudando, mas o melhor remédio contra a covid-19 ainda parece ser um coquetel que combina informação científica, prevenção e — muita — cautela.

 


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