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NOVO GOVERNO

Artigo: Melhores dias virão

 Faith of christian concept: Spiritual prayer hands over sun shine with blurred beautiful sunset background (esperança, fé)
     -  (crédito: jcomp/Freepik)
Faith of christian concept: Spiritual prayer hands over sun shine with blurred beautiful sunset background (esperança, fé) - (crédito: jcomp/Freepik)
Maurício Melo Júnior
postado em 09/01/2023 06:00

Maurício Melo Júnior - Jornalista e escritor

Quando o desânimo ameaça vir, canto com Sérgio Sampaio: Luiz Melodia, melhores dias virão. A esperança não é só minha. Lula, empossado presidente em 2003, anunciou: "Ninguém está mais otimista que eu".

Minha esperança renasce no direcionamento que se anuncia para a cultura. Chega de chorar, pela frente temos a reconstrução, sobretudo do Ministério da Cultura.

Criado no governo Sarney, o ministério nasceu com a pecha de acomodação para Celso Furtado. Esqueciam os críticos que, como congressista, Sarney criou a lei de renúncia fiscal para a cultura.

Inicialmente ela levou seu nome, mas, reformulada no governo de Fernando Henrique, se firmou como Lei Rouanet. Também vale lembrar que, no Maranhão dos anos 1950, Sarney, crítico literário e leitor de Fernando Pessoa, ligado ao grupo da Movelaria, era moderno, e Ferreira Gullar, sonetista do Centro Cultural Gonçalves Dias, era arcaico.

O Ministério da Cultura, nos últimos anos, minguou à condição de secretaria do Ministério do Turismo e colecionou descasos. Fora repaginado - o ministro Gilberto Gil dizia refundado - na primeira gestão de Lula, quando ganhou recursos além da renúncia fiscal. Vivia-se um terrível padrão: toda política cultural era vinculada à Lei Rouanet, ou seja, estava nas mãos do marketing empresarial. A maior parte dos recursos, assim, ficava com o cinema e sempre no eixo Rio-São Paulo. Os marqueteiros industriais desconheciam a amplitude cultural do país e outras manifestações além das já consolidadas.

Gil equalizou a conta, mas persistiram muitas desigualdades. Os fatos de agora, no entanto, apontam para uma reconstrução mais justa e igualitária. Os sinais vêm da campanha quando Lula declarou com todas as letras e esperanças que o país não precisa de armas, precisa de livros.

Luzes se jogam nesse caminho com a indicação de Marco Lucchesi para a presidência da Fundação Biblioteca Nacional e Fabiano Piúba para a Secretaria de Formação, Livro e Leitura. São pessoas ligadas à literatura, conhecem seus problemas e desejos. Lucchesi, poeta, escritor, tradutor e membro da Academia Brasileira de Letras, frequenta a Biblioteca Nacional desde a adolescência. Ex-Secretário da Cultura do Ceará, Piúba foi diretor de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do MinC, é doutor em Educação, mestre em História e historiador.

Margareth Meneses, inicialmente recebida com descrença, demonstra acertos indiscutíveis. Isso não chega a surpreender, afinal, ela conhece o riscado. Cantora e compositora, é produtora cultural, sabe dos pedregosos caminhos para fazer cultura, e da importância econômica e social do setor. Criou a Fábrica Cultural, destinada à formação de jovens carentes na Bahia, estado que tem na cultura o principal canal de inserção social.

Creio que ela tem força e conhecimento para tocar a reconstrução. A vontade política está no governo. Assim nos diz a festa da posse, aberta com grupos de cultura popular e, nos palcos Gal Costa e Elza Soares, o refinamento e a diversidade de nossa música.

O jornalista Ênio Lins lembra outro fato importantíssimo: a volta do quadro Orixás, pintado por Djanira, ao Salão Nobre do Palácio do Planalto. Obra da década de 1960, é uma referência nas artes plásticas brasileiras e foi retirada de lá em 2020, num gesto denunciado por Ana Miranda como "de violência e agressão contra a liberdade religiosa, contra um patrimônio brasileiro, e contra a arte de nosso país". "Devolver Orixás a seu devido lugar simboliza o retorno do respeito à cultura brasileira ao Palácio do Planalto", lembra Ênio.

Os indicativos mostram que o novo governo acredita na força econômica e social da cultura. Agora é fazer a crença chegar àqueles que fazem cultura - poetas, seresteiros, namorados do fazer, sonhadores.

Tradicionalmente se remunera mal a essa gente, sob o terrível prisma de que produzir bens culturais é um exercício diletante. Precisamos lembrar Clarice Lispector. Convidada a escrever um calendário para a Petrobras, soube que não havia verba para pagar seu trabalho. Sua resposta deve figurar nas portas do Ministério da Cultura: "Não me peçam para fazer de graça a única coisa que sei fazer para ganhar dinheiro".

Secundando Milton Nascimento, é preciso ter força, é preciso ter garra, é preciso ter sonho sempre, afinal, Luiz Melodia, indiscutivelmente melhores dias virão.

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