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COP28

Artigo: Ativos naturais empoderam a agricultura e fortalecem os ecossistemas

A seleção de Belém, Pará, como sede da COP30 em 2025 representa uma oportunidade única para se introduzir abordagens assim ousadas no tratamento do patrimônio natural

Pesquisa do IPEDF mostra agricultura urbana e periurbana  -  (crédito: Aline Nóbrega/IPEDF)
Pesquisa do IPEDF mostra agricultura urbana e periurbana - (crédito: Aline Nóbrega/IPEDF)
postado em 10/12/2023 06:00

Por: Maurício Antônio Lopes - Pesquisador da Embrapa Agroenergia

A realização da COP28 nos Emirados Árabes Unidos evidenciou, mais uma vez, a pronunciada disparidade entre os setores proeminentes no debate sobre a crise climática: petróleo e agricultura. Dubai, um epicentro vital para a indústria de energia fóssil, foi escolhida como sede da conferência, ressaltando sua influência. Ao fim do evento, o setor do petróleo acentuou sua posição de poder, devendo seguir influente e subsidiado por bilhões de dólares anualmente.

A agricultura, embora crucial para a humanidade, enfrenta uma realidade distinta. Responsável por parcela muito menor das emissões globais de gases de efeito estufa, o setor carece da mesma influência política da indústria do petróleo. Fragmentado e disperso, lida com desafios complexos, como regulamentações ambientais rigorosas, eventos extremos decorrentes das mudanças climáticas, mercados competitivos e consumidores exigentes.

A agricultura desempenha um papel singular na equação da sustentabilidade. A depender da perspectiva analisada, pode ser considerada vítima, pois o aquecimento da atmosfera, dos oceanos e do solo tornam o clima menos estável e previsível, com impactos diretos na produção de alimentos. E pode também ser taxada de vilã, pois emite gases de efeito estufa, contribui para a perda de habitats e biodiversidade e é grande usuária de água doce.

Embora a indústria do petróleo seja reconhecida como mais poluente e uma das principais impulsionadoras das mudanças climáticas, é a agricultura que segue sendo sistematicamente taxada de grande responsável pelas mudanças de clima. Com a narrativa climática concentrada na produção de alimentos, muitos se sentem menos inclinados a questionar ou pressionar por mudanças em outros setores.

Enfrentar tal realidade exigirá da agricultura uma mudança de estratégia, transcendendo a abordagem convencional centrada apenas na produção de alimentos, fibras e energia renovável. Uma visão ampliada é necessária, englobando ativos até então elusivos e subestimados, tais como serviços ecossistêmicos, preservação da biodiversidade, expansão das reservas hídricas, qualidade do solo e sequestro de carbono. A agricultura poderá se tornar apta a prover todos esses benefícios, que são tão essenciais para fortalecer a produção quanto para garantir a resiliência dos ecossistemas.

Ao ampliar a visão para além dos tradicionais pilares produtivos, reconhecendo o valor dos ativos naturais, o setor não apenas se fortalecerá frente aos desafios mais imediatos, mas também se posicionará como agente fundamental na construção de um futuro sustentável e resiliente, alinhado com as expectativas de uma sociedade comprometida com a preservação do meio ambiente. Os ativos naturais exercem, cada vez mais, um forte apelo sobre uma população cada vez mais urbana, exigente e ávida por práticas sustentáveis.

Muitos podem argumentar que tal visão é apenas um sonho impossível de se realizar. No entanto, a convergência de tecnologias avançadas, como inteligência artificial (IA), algoritmos e modelagem avançada, juntamente com sistemas de satélite e monitoramento sofisticados, já viabiliza a qualificação, a verificação e o rastreamento preciso de ecossistemas terrestres. Esses avanços tecnológicos promovem a criação de ativos associados a melhorias naturais, como o aumento da biodiversidade, a capacidade de retenção de água, a qualidade do solo e a quantidade de carbono sequestrado.

Ativos que se apresentam como uma oportunidade tangível para a monetização do capital natural, capaz de regenerar e preservar a natureza. Assim, investidores e corporações interessados em fortalecer suas cadeias de suprimentos podem participar de iniciativas que não apenas contribuam para a sustentabilidade, mas também gerem retornos financeiros. Produtores têm a possibilidade de acessar incentivos que os auxiliem na transição para um modelo de agricultura voltado para a proteção e potencialização de seus ativos naturais.

À primeira vista, a monetização ou atribuição de valor econômico a esses ativos e a recompensa para aqueles que contribuem para sua manutenção e fortalecimento podem gerar distorções nas relações dos sistemas econômicos com a natureza. No entanto, tal abordagem pode ser a única maneira de integrá-los de forma duradoura nos processos decisórios da sociedade, evitando, assim, sua diminuição ou perda, o que acarretaria impactos desastrosos para todos.

Essa estratégia pode se tornar relevante não apenas para a agricultura, mas para muitos outros setores dependentes de recursos naturais, como o turismo, que representa uma importante fonte de renda para cidades, regiões e países. Esse setor é altamente dependente de recursos como paisagens, praias, parques e reservas naturais. Ao aplicar o conceito de ativos naturais valorados, torna-se possível recompensar aqueles que se empenham na preservação e proteção desses recursos, promovendo práticas sustentáveis no turismo.

A seleção de Belém, Pará, como sede da COP30 em 2025 representa uma oportunidade única para se introduzir abordagens assim ousadas no tratamento do patrimônio natural. O simbolismo de uma COP na Amazônia pode servir de inspiração para se estabelecer um paradigma transformador na gestão ambiental global, ressaltando a interconexão vital entre conservação, prosperidade econômica e bem-estar humano.

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