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Artigo: Uma polícia eclética, plural e eficiente

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) iniciou o processo de posse dos novos agentes e escrivães de polícia aprovados no último certame

PRI-1803-OPINI -  (crédito: Maurenilson Freire)
PRI-1803-OPINI - (crédito: Maurenilson Freire)
postado em 18/03/2024 06:00

A pós quatro anos de espera, expectativas e eventos fortuitos, em dezembro de 2023, a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) iniciou o processo de posse dos novos agentes e escrivães de polícia aprovados no último certame. O tão esperado aumento do efetivo veio com uma novidade: é a primeira vez que a instituição adota o sistema de cotas para o ingresso de negros em seus quadros. Das 1490 vagas oferecidas aos dois cargos, 20% foram destinadas a negros, conforme preceitua a Lei nº 12.990/2014 — a chamada lei de cotas no serviço público.

O certame teve seu edital publicado em 2019 e contou com alguns obstáculos: epidemia da covid-19, falta de previsão orçamentária e várias interrupções judiciais. Ao final, segundo dados do Cebraspe, das 285 vagas aprovadas para o cargo de escrivão, 45 foram preenchidas por negros; das 1.240 vagas para agentes considerados aptos, 247 foram ocupadas por pretos e pardos. É uma nova roupagem da Polícia Judiciária da Capital da República, que teve sua origem em 1808, com a criação da Intendência Geral. Instituição que, em tempos não muito remotos do ponto de vista histórico, prestou-se a caçar e a castigar negros que fugiam dos seus senhores, prendendo capoeiras, mendigos e vadios, em uma época em que, aos afrodescendentes, era negado acesso à educação, ao trabalho e à comida.

Segundo o censo de 2022, o Brasil assimila em sua população 43,5% de brancos e 45,7% de negros — a maior população negra do mundo, precedida apenas pela da Nigéria. A mesma pesquisa indigita o Distrito Federal como um território de população predominantemente negra, sendo 40% de sua população constituída de brancos e 59,4% de pretos e pardos. Entretanto, mesmo com essa quantificação, segundo o historiador Guilherme Lemos (que utilizou em sua pesquisa dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico — OCDE), o DF é uma das cidades que mais segrega no mundo, superando Emufuleni, na África do Sul, local em que, por anos, vigorou a política do apartheid.

O DF é, majoritariamente, branco na sua região central e negro nas demais regiões administrativas, principalmente nas áreas periféricas, onde se concentram: baixos salários, desemprego, violência e, por conseguinte, onde a presença policial é crucial. A política de cotas no ambiente policial é uma forma de reparação do Estado para com a comunidade negra, proporcionando uma representação mais diversificada dos agentes encarregados da aplicação da lei, um dos serviços mais sensíveis às suas necessidades. No âmbito institucional, a presença de policiais negros também trará o desafio de desenvolver políticas antirracistas para melhorar a qualidade do já eficiente serviço.

Levantamento realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudo (Dieese) constatou que o funcionalismo público brasileiro não refletia a diversidade de seu povo. Segundo o estudo, do total de 519.369 servidores públicos federais, apenas 30% eram negros; além de pouca representatividade, os negros exercem posição de menor relevo e com menores salários. O aumento gradual na participação de negros nos últimos anos indica um progresso, mas ainda há muito a ser feito para alcançar uma verdadeira representatividade e equidade.

É tempo de promover uma nova cor ao serviço público brasileiro e dar um basta a exemplos únicos e solitários que romperam as barreiras do racismo estrutural e ocuparam espaços, até então, embranquecidos. Há uma espera para o próximo concurso de delegado de polícia, que fará com que mais negros ocupem cargos diretivos. É a PCDF atuando e se aperfeiçoando na agenda ESG racial, ou seja, nas práticas ambientais, sociais e de governança, que se amoldam aos princípios da impessoalidade, moralidade e eficiência do serviço público. É uma diretriz que tem o feito de, internamente, letrar os policiais e ofertar um atendimento e um serviço mais eficientes à população do DF, principalmente à mais carente, que tem cor e, em parte, vive na dor.

* RICARDO NOGUEIRA VIANA, Delegado chefe da 35ª Delegacia de Polícia e professor de educação física e JOÃO MACIEL CLARO Delegado coordenador de Proteção ao Meio Ambiente e Animal da PCDF

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