Opinião

Visão do Correio: Preços de alimentos não devem ser contidos na canetada

O incômodo maior é com o fato de a desaprovação ao governo Lula ter superado, no início deste mês, a aprovação, conforme pesquisa Atlas Intel. A reprovação atingiu o maior nível da série histórica e chegou a 49,8%, enquanto a aprovação foi de 47,8%

Associação dos Supermercados afirma que quer colaborar para baixar preço dos alimentos - Capital S/A -
Associação dos Supermercados afirma que quer colaborar para baixar preço dos alimentos - Capital S/A -

A bronca que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu nos seus ministros, na última segunda-feira, teve endereço certo e meta estabelecida. Lula cobrou trabalho e resultados de todos os ministros, mas especificamente ao titular da Agricultura, Carlos Fávaro, e ao da Fazenda, Fernando Haddad. O primeiro, pelo aumento dos preços dos alimentos e o segundo, pela confusão feita com a portaria da Receita Federal com a divulgação de novas normas de fiscalização envolvendo operações com o Pix e também pela alta dos preços. O motivo é simples e o presidente anunciou na abertura da reunião ministerial: "2026 já começou".

O incômodo maior é com o fato de a desaprovação ao governo ter superado, no início deste mês, a aprovação, conforme pesquisa Atlas Intel. A reprovação atingiu o maior nível da série histórica e chegou a 49,8%, enquanto a aprovação foi de 47,8%. O presidente sabe que, com esses níveis de desaprovação, se torna alvo fácil para os opositores, e identificou na alta de preços o problema que precisa ser resolvido no decorrer deste ano. Embora deseje e tenha pedido esforço dos ministros no sentido de baratear o custo de vida dos brasileiros, a tarefa vai exigir mais do que medidas de gabinete.

No ano passado, a inflação voltou a estourar o teto da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), chegando a 4,83%, puxada pelo item alimentos e bebidas, que subiu 7,69%, portanto, muito acima da inflação medida pelo  Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Pesaram no custo da alimentação, que sozinha teve alta de 8,23%, os preços do café e das carnes. Os cortes de proteína animal subiram 20,48%, enquanto o café moído disparou e subiu 39,6% no ano. E o que explica esses aumentos, entre outros fatores, são problemas climáticos, ciclo de produção e maior demanda no mundo e no mercado interno.

Não são fatores que permitam uma atuação vertical para redução dos preços. Depois da reunião na segunda-feira, informações desencontradas, partidas da Casa Civil, indicavam uma intervenção para baixar o valor dos alimentos. É, sim, necessário encontrar formas de conter os aumentos de preços de itens da cesta básica que pesam sobretudo na população com menor renda, mas é preciso cuidado na forma de buscar soluções. Intervenções de governo no mercado costumam causar mais problemas do que soluções.

O presidente Lula tem pressa, mas não é possível uma solução rápida. Incentivos para aumento da produtividade no campo levam tempo para surtir efeito, assim como a formação de estoques reguladores para equacionar oscilações nos preços de grãos e cereais, uma operação que depende de recursos públicos para compra dos produtos e de capacidade de armazenamento. Outra forma seria autorizar a importação de produtos cujos preços estão mais elevados. Nesse caso, no entanto, os itens que mais subiram têm cotações internacionais, com preços formados pela demanda e oferta, o que dificulta a busca por fornecedores com preços mais baixos.

É preciso agir e, sobretudo, mostrar que há preocupação com o que afeta o bolso da população, principalmente considerando a relação direta da alta do custo de vida com queda na aprovação do governo e do presidente Lula. Mas provocar ruídos, como ocorreu na quarta-feira, com informações desencontradas sobre intervenção no mercado de alimentos e especulações do que pode ou deve ser feito não contribui para conter os preços, cuja acomodação tem um componente de estabilidade. O custo da alimentação vem subindo mais do que a inflação há alguns anos e há indícios de que este ano também os itens básicos vão ficar mais caros. Nesse caso, o governo deve ter cautela, para não ser ele mais um fator a pressionar os preços.

Correio Braziliense
postado em 24/01/2025 06:00
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