
DANIELA UZIEL — Diretora da InovaUFRJ, núcleo de inovaçãotecnológica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é médica eprofessora da UFRJ, mestre e doutora em biofísica e políticaspúblicas
Como transformar descobertas que acontecem dentro dos laboratórios de universidades públicas em invenções práticas, que melhoram a vida das pessoas? Uma das respostas está nos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) das Instituições de Ciência e Tecnologia (ICTs), criados pela Lei nº 10.973/04. Os NITs fazem a gestão da propriedade intelectual da universidade, zelam pelas tecnologias e pelos ativos da instituição e encontram caminhos para transferi-los para a sociedade. São descobertas que envolvem não apenas as chamadas tecnologias "hard", como a invenção de novos medicamentos, mas também tecnologias sociais, que impactam a vida de milhares de pessoas desassistidas ou em situação de vulnerabilidade.
Parece fácil: basta ter uma boa ideia, certo? Infelizmente, não. No mundo, existe um número infinito de boas ideias, mas poucas resultam em inovação. Para inovar, o pesquisador precisa conhecer as necessidades do mercado e analisar se há convergência entre pesquisa e demanda. Outro fator importante é como financiar a pesquisa, pois inovar não é barato. Hoje, diversos editais fomentam a transformação de tecnologia em produto, como o Finep PI, que incentiva a realização de testes de viabilidade de novos produtos e processos provenientes de ICTs.
Há ainda outro obstáculo: existe um preconceito de que as pesquisas que são feitas na universidade não estão alinhadas com as demandas da sociedade ou que são tão básicas, ou seja, ainda muito distantes de uma aplicação prática, que precisam estar confinadas a um ambiente de especialistas. Na realidade, fato é que muitas das transformações existentes na sociedade são provenientes direta, ou indiretamente, de pesquisas feitas na academia.
Não é possível explorar o pré-sal, por exemplo, sem estudos sobre a localização dos poços, o impacto da perfuração, como a biodiversidade da região a ser explorada é afetada ou quais são os materiais resistentes às condições de profundidade dos poços. Isoladamente, essas informações, que a princípio parecem agregar pouco, permitem a exploração de milhões de barris de petróleo por dia e a geração de bilhões de dólares. O que a academia pesquisa tem impacto na forma como vivemos hoje e viveremos amanhã.
Para completar, não há ainda uma boa comunicação entre o mercado e a academia: as empresas não sabem o que é feito nos laboratórios da universidade e o contrário também é verdade. Existe ainda uma cultura de que a empresa e o pesquisador não conseguem falar a mesma língua ou que a relação com a universidade é extremamente morosa e não está alinhada com os prazos do mercado. Se isso foi verdade até pouco tempo atrás, já não é mais.
O segredo para fomentar criações pode estar dentro da própria universidade, que agora já conta com uma política de inovação aprovada. Para agregar, tirar do papel e transformar em algo concreto e prático, é preciso também ter processos internos bem estabelecidos, fontes com transparência e segurança jurídica, além de um time de especialistas que falam a língua do pesquisador e da empresa. Graças a alguns núcleos de inovação tecnológica de grandes universidades brasileiras já é possível, por exemplo, assinar contratos em menos de 15 dias após o acerto final das cláusulas, prazo menor do que o praticado em diversas empresas de grande porte.
A colaboração entre empresa e universidade vai muito além da simples transferência de tecnologia. Ao resolver desafios específicos da empresa, por meio de projetos de colaboração em pesquisa e desenvolvimento, a universidade mobiliza seus recursos humanos e sua infraestrutura e a empresa muda seu porte e sua importância, tanto em nível nacional quanto internacional. O compromisso agora é fazer essa colaboração crescer. Ganha a universidade, ganha a empresa e ganha o Brasil.