Visão do Correio

Mais tensão no Oriente Médio e os objetivos paralelos

A conveniência da nova escalada da morte não serve apenas a Netanyahu. Pode servir de moeda de troca para os Estados Unidos nas negociações conduzidas com a Rússia para alcançar uma trégua na invasão de Moscou na Ucrânia

Os sistemas de defesa aérea israelenses são ativados para interceptar mísseis iranianos sobre a cidade israelense de Tel Aviv na manhã de 18 de junho de 2025. -  (crédito: Menahem Kahana / AFP)
Os sistemas de defesa aérea israelenses são ativados para interceptar mísseis iranianos sobre a cidade israelense de Tel Aviv na manhã de 18 de junho de 2025. - (crédito: Menahem Kahana / AFP)

O mundo assiste a um novo conflito no Oriente Médio, entre Israel e Irã. Ao contrário do que acontece nos embates contra o Hezbollah no Líbano e contra o Hamas na Cisjordânia, Jerusalém tem, agora, um adversário com capacidade bélica bem mais ameaçadora, capaz de colocar em risco uma maior parte da população israelense. Essa constatação forçou líderes mundiais a alertarem para a retirada de seus civis dos dois países nos últimos dias — no Brasil, comitiva de prefeitos e secretários que visitava Israel conseguiu socorro a partir da Jordânia após momentos de muita apreensão. 

Diante de tantos riscos para o Oriente Médio, por que Israel dobrou a aposta ao atacar o Irã? Antigos aliados, Irã e Israel hoje ocupam lados opostos no xadrez da geopolítica. Enquanto o governo do aiatolá Ali Khamenei se aproxima da China e da Rússia — inclusive com intercâmbio de tecnologia armamentista com esse último país —, a gestão de Benjamin Netanyahu sempre esteve ao lado da Casa Branca.

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Desde a nova escalada entre Israel e Irã, algumas observações chamam a atenção. A primeira delas é o momento em que ocorre o ataque de Netanyahu. Pressionado internamente e na comunidade internacional pela ofensiva em Gaza, o primeiro-ministro israelense enfrentou uma moção que poderia significar o fim do seu governo neste mês. Mesmo ameaçado, permaneceu. Com ao menos seis meses de sobrevida, parece tentar criar um "fato novo" em busca de apoio popular, retirando o foco do conflito na Cisjordânia.

A conveniência da nova escalada da morte não serve apenas a Netanyahu. Pode servir de moeda de troca para os Estados Unidos nas negociações conduzidas com a Rússia para alcançar uma trégua na invasão de Moscou na Ucrânia — Trump e Putin reforçaram o diálogo nessa frente nas últimas semanas. Em um cenário de Kiev e Teerã em pratos opostos, a balança da paz pode ser alcançada nos dois embates? É uma aposta ousada, porém possível. 

O panorama do mais novo conflito também envolve líderes europeus, que se manifestaram a favor de Israel nas primeiras horas após o início do embate com o Irã. Como observou o doutor em sociologia e pesquisador Serge Katz em recente texto publicado na plataforma Substack, a posição adotada por Emmanuel Macron (França) e Keir Starmer (Reino Unido) é um claro alinhamento civilizacional dessas nações ao lado de Israel. Ambos veem a escalada do conservadorismo nos países que governam e, com ele, o aumento da resistência dos europeus aos muçulmanos, um fundo eleitoral relevante no mundo ocidental. A diplomacia dá lugar ao "nós contra eles", em defesa do Ocidente. 

 

O que está evidente no novo front no Oriente Médio é, mais uma vez, o uso da força militar com objetivos secundários, ignorando completamente os danos causados contra civis — em patamares muito superiores a guerras anteriores, a partir do uso de forças aéreas que não faziam parte, por exemplo, das ofensivas dos EUA no Afeganistão e no Iraque no início do século. Milhares de cidadãos e cidadãs do Irã e de Israel perderam a vida nos últimos dias em um confronto que parece estar longe do fim. Independentemente do desfecho, é o povo quem sempre sai derrotado.

 


Por Opinião
postado em 18/06/2025 06:00
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