Por Carlos Jacobino* — O Brasil vive um problema crônico: comemora qualquer avanço econômico como se fosse uma vitória definitiva, enquanto ignora que estamos, há décadas, presos na armadilha do quase. Quase potência. Quase competitivo. Quase desenvolvido.
O resultado do PIB no primeiro trimestre é um exemplo claro. Mas, para entendermos, precisamos abrir os dados. O país cresceu 1,4% no primeiro trimestre de 2025 em relação ao trimestre imediatamente anterior. Fomos puxados pelas safras generosas de soja e de milho. Mas nossa indústria segue estagnada, e boa parte dos serviços anda de lado. E, lamentavelmente, o país mantém uma das menores taxas de investimento entre as principais economias do mundo: pouco menos de 19% do PIB.
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Não podemos abrir mão da importância e da força do agronegócio brasileiro. Mas é preciso entender que, para além de apostar no ciclo das commodities, nossas vantagens comparativas, e no avanço das fronteiras agrícolas, é urgente que se olhe para as economias que geram riqueza, produtividade e inovação. Esses países operam em outro plano: o da tecnologia.
O Brasil é um dos maiores mercados de tecnologia da informação (TI) do mundo. De acordo com o mais recente estudo da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES), ocupamos hoje a 10ª posição no ranking global, com 1,7% do mercado mundial de TI. Na América Latina, somos líderes absolutos, com 44% do mercado regional. Só em 2023, o setor movimentou US$ 57 bilhões, crescendo 6,4%, quase o dobro da média global.
E aqui está o dado mais relevante: 77% desse volume vem de software e serviços, da economia do conhecimento, da inteligência e da inovação.
O setor de TI já responde por 6,8% do PIB brasileiro, com projeção de chegar a 8% até 2026, superando muitos setores tradicionais. E diferentemente do que muitos imaginam, não estamos falando de um setor de apoio, mas de um motor que impulsiona toda a economia.
Sem TI, não existe agro 4.0, não existe indústria competitiva, não existe logística eficiente, não existem serviços financeiros modernos e, muito menos, governo digital capaz de entregar serviços de qualidade e reduzir o custo da máquina pública.
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Aliás, os poucos avanços que tivemos no setor público, como o Gov.br e o Pix, são frutos da adoção de tecnologia, com ganhos expressivos em eficiência, agilidade e economia de recursos.
Mas, infelizmente, esses avanços são episódicos, não estruturais. Falta ao país uma política robusta de transformação digital.
Os dados internacionais são cristalinos. Segundo o Banco Mundial, a cada 10% de aumento na penetração da banda larga, o PIB dos países em desenvolvimento cresce, em média, 1,38%. No Brasil, onde a produtividade anda na contramão do resto do mundo, o impacto seria ainda maior. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) calcula que empresas que investem em tecnologia têm, em média, 22% de aumento na produtividade. E, segundo a Brasscom, cada R$ 1 investido em TI gera até R$ 4,30 em valor na economia.
Não se trata de estatizar a inovação ou criar mais burocracia. Ao contrário, significa remover as travas que sufocam empresas, reduzir o custo Brasil, modernizar o ambiente regulatório, investir pesado na formação de mão de obra qualificada e criar um ambiente em que o setor privado possa liderar o processo de transformação digital.
O setor de tecnologia precisa de segurança jurídica, liberdade para inovar e acesso a financiamento competitivo. Se quisermos destravar o crescimento do país, precisamos colocar a digitalização no centro da política econômica. Isso exige, de forma urgente, um conjunto de ações articuladas.
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Começa pela formação massiva de talentos, já que o país enfrenta um deficit de mais de 800 mil profissionais de tecnologia até 2026. É necessário também criar incentivos reais à transformação digital das empresas, e não apenas para startups, mas para toda a economia, incluindo pequenas, médias e grandes companhias.
Além disso, é indispensável investir de forma robusta em infraestrutura digital: mais conectividade, mais data centers, inteligência artificial, cibersegurança e soluções em nuvem. Por fim, é fundamental acelerar a transformação digital do próprio Estado, que, ao se tornar mais digital, custa menos, entrega mais e serve melhor à população, sem depender do inchaço da máquina pública.
O Brasil não pode mais ser o país do quase. Ou escolhemos ser protagonistas da nova economia, baseada em dados, inovação e tecnologia, ou vamos continuar sendo exportadores de soja, minério e carne, e importadores de crescimento, inovação e qualidade de vida.
* Presidente do Sindicato da Indústria da Informação do Distrito Federal*
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