
Ana Maria Nogales e Lucio Rennó — professores da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadores do ObservaDF
A saúde continua sendo apontada como o principal problema para aproximadamente metade da população do Distrito Federal e se mantém como a área mais mal avaliada do governo, sem demonstrar sinais de melhora. Uma pesquisa recente do ObservaDF (https://observadf.unb.br/pesquisas/), realizada em abril de 2025 com 1.000 entrevistas em 29 regiões administrativas (RAs), corrobora essa preocupação, revelando um panorama de insatisfação persistente e, em alguns aspectos, agravada em comparação com um estudo similar de 2022.
Apesar da maioria dos entrevistados declarar-se saudável, essa percepção de bem-estar diminui consideravelmente entre aqueles que residem em áreas de baixa renda e não têm plano de saúde. Apenas 31% dos entrevistados no DF possuem plano de saúde, e essa proporção despenca para 20% nas regiões mais pobres, evidenciando uma cobertura privada inferior entre os mais vulneráveis.
Essa vulnerabilidade se reflete diretamente na ausência de cuidados preventivos: 52,1% das pessoas não realizaram um checape médico no último ano, sendo que esse percentual é ainda maior (55,8%) entre os mais carentes e sem plano de saúde. Tendências análogas são observadas em consultas odontológicas (47,4% não foram ao dentista) e na prática regular de exercícios físicos (40,9% não realizam atividades regularmente), com percentuais mais altos nas RAs de baixa renda e entre os sem plano de saúde. Esses dados sublinham as profundas desigualdades sociais que impactam diretamente a saúde da população do DF.
O sistema público de saúde no Distrito Federal é amplamente utilizado, com 75,5% das famílias tendo procurado algum serviço no último ano. As Unidades Básicas de Saúde (UBS) são as mais buscadas, com 63,9% de uso. As UBS se destacam positivamente na vacinação (71,8% de avaliações favoráveis), na atuação de enfermeiros e nas farmácias. No entanto, a marcação de consultas é o principal ponto negativo, criticada por 37,7% dos usuários. Médicos, em geral, recebem avaliações negativas, mas aqueles que atuam nas UBS são mais positivamente avaliados.
As Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) são bem avaliadas pela estrutura física, mas severamente criticadas pelo longo tempo de espera (67% de avaliações negativas). Por outro lado, os hospitais públicos recebem avaliações majoritariamente negativas, com queixas concentradas em longas filas para emergências, exames, atendimento ambulatorial e, alarmantemente, cirurgias. Apenas a proximidade de casa e o atendimento de emergência nos hospitais têm avaliações relativamente positivas.
Profissionais como enfermeiros e agentes comunitários de saúde (ACS) são consistentemente melhor avaliados do que as instituições (UBS, UPAs e hospitais) e médicos, que registram altos níveis de insatisfação. As avaliações negativas, especialmente entre a população de baixa renda, se mantiveram ou pioraram em relação a 2022, indicando uma clara deterioração na qualidade do atendimento. As principais queixas espontâneas da população são: mau atendimento dos servidores (26%), filas nos prontos-socorros (14%) e falta de médicos (12,8%). Outras queixas relevantes incluem demora para tratamento, má gestão e falta de medicamentos.
Um achado interessante da pesquisa é que ter recebido visita de um agente comunitário de saúde (ACS) ou estar em programas como a Estratégia Saúde da Família (ESF) tende a melhorar a percepção sobre o sistema, especialmente sobre enfermeiros e UBS, embora a insatisfação com hospitais persista. A inclusão em programas de atenção primária, como a ESF, e o recebimento de visitas do ACS melhoram as percepções sobre o funcionamento geral do sistema.
Em resumo, o sistema público de saúde do Distrito Federal é um pilar essencial e amplamente utilizado, principalmente pelas camadas mais vulneráveis da população. Contudo, enfrenta altos níveis de insatisfação, com críticas consistentes voltadas à má qualidade do atendimento, às longas filas e à escassez de médicos. O ObservaDF, com este estudo detalhado, busca contribuir para o aprimoramento da atenção à saúde no Distrito Federal, evidenciando os principais "gargalos" e os aspectos de insatisfação da população, com a finalidade de subsidiar políticas públicas mais eficazes.
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