ARTIGO

Economia criativa: motor de inovação, identidade e desenvolvimento

A experiência demonstra como equipamentos culturais estruturados podem se transformar em plataformas de desenvolvimento territorial, ampliando acesso, dinamizando economias locais e promovendo identidade

 Sesi Lab: impacto econômico total de R$ 117,3 milhões em 2024
 -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
Sesi Lab: impacto econômico total de R$ 117,3 milhões em 2024 - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

CLÁUDIA RAMALHO, superintendente a Cultura do Sesi e GUSTAVO MEDEIROS BARBOSA, gerente executivo da FGV Projetos

A economia criativa tem se consolidado como um dos pilares estratégicos para o desenvolvimento sustentável na atualidade. Trata-se de um setor que articula cultura, inovação, ciência e tecnologia, representando 3% do PIB mundial, o equivalente a US$ 2,3 trilhões por ano, segundo a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).

Em países como o Reino Unido e a Coreia do Sul, políticas consistentes transformaram criatividade e cultura em ativos econômicos robustos: os britânicos alcançaram 6% do PIB com mais de 2 milhões de empregos no setor, enquanto a chamada "K-Economy", do país asiático, tornou-se potência de exportação cultural.

O Brasil também tem potencial expressivo. De acordo com o Observatório Itaú Cultural, a economia criativa representou 3,11% do PIB nacional em 2020, movimentando R$ 230 bilhões e empregando mais de 5 milhões de pessoas. Apesar disso, o financiamento público à cultura segue marcado pela instabilidade, pela concentração geográfica e por uma visão que, muitas vezes, a encara como gasto, não como investimento.

Exemplos recentes mostram como essa lógica pode, e deve, ser repensada. Estudos de impacto econômico realizados pela Fundação Getulio Vargas (FGV) revelam o potencial da economia criativa. No Rio de Janeiro, a Lei Paulo Gustavo, criada para apoiar o setor cultural, gerou mais de R$ 850 milhões a partir de investimentos de R$ 139 milhões. Estudo da mesma instituição mostrou a força da Lei Rouanet: entre 1993 e 2018, a legislação teve R$ 31 bilhões em renúncias fiscais, valor que retornou à sociedade e gerou mais R$ 18,5 bilhões — ou seja, o impacto econômico total foi de cerca de R$ 50 bilhões.

Em Brasília, um caso ilustrativo é o Sesi Lab: cada R$ 1 investido em iniciativas culturais retornou mais de R$ 3 para a economia brasileira em 2024 — índices comparáveis a setores tradicionais, como construção civil, indústria automotiva e tecnologia da informação. O impacto econômico total no ano passado foi de R$ 117,3 milhões e gerou mais de 1.400 empregos diretos e indiretos, além de R$ 16 milhões arrecadados em tributos. Em 2024, o museu de arte, ciência e tecnologia atraiu 212 mil visitantes — 52 mil deles estudantes — e mobilizou recursos por meio de bilheteria, patrocínios e operação comercial.

Trata-se de um efeito multiplicador imediato, já que a cultura tem capacidade de ativar cadeias produtivas diversas, desde alimentação e hotelaria até audiovisual, arquitetura e serviços especializados. A experiência demonstra como equipamentos culturais estruturados podem se transformar em plataformas de desenvolvimento territorial, ampliando acesso, dinamizando economias locais e promovendo identidade.

Para que a economia criativa se consolide como política de Estado no Brasil, é preciso mais do que exemplos isolados. São necessárias ações estruturadas, como financiar equipamentos culturais com vocação territorial e tecnológica; estimular parcerias entre setor produtivo, poder público e sociedade civil; ampliar o acesso a recursos culturais em todas as regiões do país, reduzindo desigualdades; e adotar métricas de impacto econômico e social como critérios centrais para políticas públicas.

Investir em cultura e criatividade não é apenas fortalecer a identidade nacional, é também diversificar a matriz produtiva, gerar empregos qualificados e criar novos vetores de crescimento. Ao contrário de setores que demandam anos até a maturação, a economia criativa responde de imediato com circulação de renda e impacto direto no cotidiano das cidades.

Quando a cultura é integrada às agendas de ciência, tecnologia e indústria, além de inspirar, ela movimenta, emprega, arrecada e transforma. Num país de criatividade abundante, o desafio não está na oferta cultural, mas em políticas capazes de transformar esse potencial em valor econômico e social. O tempo é agora. 

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Por Opinião
postado em 19/08/2025 06:03
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