A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) divulgou um parecer contrário à incorporação das canetas emagrecedoras de semaglutida e de liraglutida para o tratamento de obesidade no Sistema Único de Saúde (SUS). Tecnicamente, a Conitec é um órgão assessor e não tem o poder de proibir, mas de orientar o gestor, no caso o Ministério da Saúde (MS), responsável por tomar decisões de incorporação de medicamentos e tecnologias à rede pública. A orientação costuma ser seguida.
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Entre as justificativas listadas na decisão recente da Conitec, está a baixa relação custo-efetividade, diante do alto impacto orçamentário e fiscal da proposta avaliada. O MS apresentou um estudo cujo custo estimado para atendimento a pacientes da rede pública pode chegar a R$ 4,1 bilhões num período de cinco anos. Considerando casos que podem exigir tratamento contínuo, o valor ultrapassaria R$ 6 bilhões no mesmo período.
Paralelamente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apertou o controle na dispensação das canetas emagrecedoras no varejo, aplicando regras mais rígidas, como retenção de receita, além da proibição da manipulação dos princípios ativos por farmácias, motivada pelo uso fora de indicação e apontando riscos sanitários.
No mundo, em 2022, 2,5 bilhões de adultos tinham sobrepeso, dos quais 890 milhões viviam com obesidade (cerca de uma em cada oito pessoas), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). E as projeções indicam um cenário ainda pior. A Federação Mundial de Obesidade indica um contingente de 1,53 bilhão de adultos com obesidade até 2035.
O Brasil segue o fenômeno: dados oficiais mostram um crescimento contínuo do número de obesos ou com sobrepeso. O Vigitel 2023 reportou 24,3% de adultos com obesidade e 61,4% com excesso de peso — proporções que tornam a decisão de oferta gratuita universal dessas novas estratégias farmacológicas impraticável financeiramente.
É bem verdade que a obesidade já causa um impacto alto nas contas públicas. Estudo do Observatório Brasileiro de Hábitos Alimentares indica que, se mantida a tendência de aumento de peso na população, de 2021 a 2030, os gastos com atendimento no SUS — hospitalização e atendimento ambulatorial — e os custos à economia nacional com a mortalidade precoce somarão US$ 22 bilhões. Isso considerando complicações associadas ao excesso de peso, como doenças cardiovasculares, apneia obstrutiva do sono e cânceres.
O enfrentamento a esse grave problema de saúde pública, porém, precisa ser estratégico, para não se correr o risco de prejudicar outras demandas prioritárias. E elas são muitas: da atenção primária (como escassez de profissionais em unidades básicas de saúde e baixa informatização) aos atendimentos mais complexos, de transplantes a atendimentos oncológicos.
As políticas públicas de saúde com foco em obesidade e em suas comorbidades precisam mirar na tríade prevenção, ambiente alimentar e monitoramento frequente — estratégias a serem adotadas para além das unidades de saúde. Passam, também, por novas práticas nas escolas, por acesso a alimentos saudáveis, estímulo à prática de atividades físicas, suporte à saúde mental. Em um leque tão abrangente de intervenções, as apostas precisam ser muito bem avaliadas.
