Visão do Correio

CPMI do INSS não pode virar inquérito de ocasião

O país já assistiu a inúmeras comissões parlamentares que começaram com promessas de moralização e acabaram em relatórios inconclusos, arquivados sem punição

O colegiado acumulou mais de 300 horas de trabalho em pouco mais de dois meses. -  (crédito: Edilson Rodrigues/Agência Senado)
O colegiado acumulou mais de 300 horas de trabalho em pouco mais de dois meses. - (crédito: Edilson Rodrigues/Agência Senado)

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS chega a um ponto crítico pouco mais de dois meses depois de instalada. O colegiado acumulou mais de 300 horas de trabalho, dezenas de oitivas e produziu um vasto conjunto de documentos e provas. Mas o que poderia representar um avanço decisivo na luta contra a corrupção e a impunidade corre o risco de se dissolver na espuma dos discursos e das disputas políticas. O apelo dramático do presidente da comissão, senador Carlos Viana (Podemos-MG), para que o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), decrete as prisões já aprovadas é um gesto de desespero institucional — e, ao mesmo tempo, uma tentativa de resgatar a credibilidade de um inquérito que ameaça cair na rotina das "CPMIs de ocasião".

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O escândalo no Instituto Nacional do Seguro Social atinge o coração de um dos sistemas mais sensíveis do Estado brasileiro: a Previdência. O desvio de recursos destinados a aposentados e pensionistas não é apenas um crime contra o erário, é uma ofensa direta à dignidade de milhões de brasileiros que confiaram no Estado ao longo de décadas de contribuição. Quando o senador Viana afirma que "esses homens não vivem sob suspeita, vivem do roubo dos mais pobres", ele traduz o sentimento de indignação de quem vê o país conviver com a miséria de uns e a impunidade de outros.

A comissão conseguiu reunir elementos consistentes sobre as fraudes em descontos associativos ilegais, as movimentações de dinheiro ilícito e o papel de operadores como Antônio Carlos Camilo, o "Careca do INSS", e Felipe Macedo Gomes, ex-presidente da Amar Brasil, entidade apontada como fachada de um esquema que teria movimentado mais de R$ 1 bilhão. As investigações mostram que as fraudes atingiam diretamente os contracheques dos beneficiários, que viam o valor de seus proventos ser reduzido por cobranças indevidas, sem qualquer autorização ou contrapartida real.

O senador Viana acusa o governo federal de omissão, citando relatórios da Controladoria-Geral da União (CGU) de 2024 que alertavam para repasses suspeitos e não receberam providências. De fato, não basta lamentar as falhas de fiscalização, é preciso esclarecer se houve negligência ou conivência. A administração pública tem o dever de responder por eventuais omissões, sobretudo quando elas prejudicam os mais vulneráveis.

Ao longo dos trabalhos, a CPMI também foi palco de constrangimentos: bate-bocas entre parlamentares e advogados, depoentes amparados no direito ao silêncio, tentativas de manipular o foco da investigação e de transformá-la em arena política. A oposição busca capitalizar o escândalo, mas corre o risco de perder legitimidade se o inquérito descambar para a "pirotecnia", como advertiu o ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz.

O desafio agora é impedir que a CPMI termine sem consequências concretas. O país já assistiu a inúmeras comissões parlamentares que começaram com promessas de moralização e acabaram em relatórios inconclusos, arquivados sem punição. A CPMI do INSS não pode virar pizza.

 

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Por Opinião
postado em 25/10/2025 06:00
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