ARTIGO

Crédito assistido: a ponte entre política monetária e desenvolvimento dos pequenos negócios

Para os pequenos negócios, o crédito assistido é o elo que conecta a política monetária à economia real, transformando juros mais baixos em negócios sustentáveis

Valdir Oliveiraex-secretário de Desenvolvimento Econômico do Distrito Federal

A ata da reunião de dezembro do Comitê de Política Monetária (Copom) marca um avanço importante no diagnóstico da economia brasileira. O Banco Central reconhece, de forma mais clara, que a inflação está desacelerando — especialmente a inflação de serviços — e que a atividade econômica perde fôlego após longo período de juros elevados. Para os pequenos negócios, no entanto, o alerta para a principal mensagem da ata vai além da discussão sobre o momento de iniciar a queda da Selic: ela reforça a urgência de qualificar o uso do crédito, sob o risco de transformar uma oportunidade em um novo ciclo de endividamento, como aconteceu em um passado recente.

Para o Copom, a política monetária em patamar significativamente contracionista já vem produzindo os efeitos desejados. O consumo desacelerou, os setores mais sensíveis às condições financeiras sentiram, primeiro, o impacto, e a inflação dá sinais consistentes de arrefecimento. Esse cenário abre espaço para discutir a flexibilização monetária com a redução da Taxa Selic. Mas a experiência brasileira mostra que juros mais baixos não garantem, por si só, desenvolvimento econômico, especialmente para os pequenos negócios, principalmente quando pensamos no programa Pronampe, onde ampliamos a carteira de crédito no Brasil, com incertezas no mercado e nos negócios. O resultado foi um grande endividamento.

No universo das micro e pequenas empresas, o crédito funciona como um medicamento: na dosagem certa, salva o negócio; na dose errada, pode levá-lo à falência. Quando concedido sem um diagnóstico empresarial, orientação, planejamento e acompanhamento, o crédito tende a ser usado para tapar buracos de caixa, rolar dívidas ou sustentar modelos de negócio frágeis. O resultado é conhecido: aumento da inadimplência, fechamento precoce de empresas e desemprego. É justamente para romper esse ciclo que emerge o conceito de crédito assistido. A decisão da tomada do crédito, muitas vezes, está associada à emoção do sonho de ter um negócio próprio ou aproveitar uma oportunidade para crescimento no mercado. Aliar consultoria e capacitação à concessão de crédito é dar mais segurança para os pequenos empreendedores e para as instituições financeiras, equilibrando emoção e razão na decisão de implantar ou ampliar um negócio por meio da oferta de crédito.

A ata também traz um elemento novo e relevante ao separar, de forma explícita, fatores conjunturais e estruturais na análise do mercado de trabalho. Embora o desemprego permaneça baixo, já aparecem sinais de moderação, como a redução da população ocupada e da taxa de participação. Esse esfriamento gradual contribui para a desaceleração da inflação de serviços, mas também sinaliza um ambiente de maior cautela para os pequenos negócios, que precisam operar com margens mais apertadas e menor previsibilidade de demanda. Ter menos pessoas ocupadas e menor número de procura por trabalho é indicativo de desaceleração econômica, que pode impactar negativamente em consumo para os pequenos negócios.

Nesse contexto, a qualidade do crédito passa a ser mais importante do que o volume do crédito. O crédito assistido parte do princípio de que financiamento deve caminhar junto com consultoria, capacitação e gestão. O pequeno empreendedor, muitas vezes, não falha por falta de esforço, mas por ausência de apoio técnico na tomada de decisão financeira e na gestão do negócio. Crédito sem assistência pode acelerar o problema; crédito assistido transforma recursos financeiros em oportunidade de crescimento do negócio.

A sinalização de início do ciclo de cortes da Selic cria uma janela estratégica para fortalecer políticas públicas e instrumentos financeiros orientados. Fundos garantidores, programas de crédito com acompanhamento técnico e parcerias entre instituições financeiras e entidades de apoio empresarial são peças centrais dessa arquitetura. Eles reduzem o risco para os bancos, ampliam o acesso ao crédito e, sobretudo, aumentam a taxa de sobrevivência dos pequenos negócios.

A ata de dezembro revela um Banco Central mais confiante no controle da inflação. O desafio, agora, é garantir que a transição para juros mais baixos não reproduza erros do passado. O desenvolvimento não nasce do crédito fácil, mas do crédito bem utilizado. Para os pequenos negócios — base da economia brasileira e principal gerador de empregos —, o crédito assistido é o elo que conecta a política monetária à economia real, transformando juros mais baixos em negócios sustentáveis, menos inadimplência e crescimento de longo prazo.

 

 

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