Eleições 2020

Capital político de Bolsonaro não se transferiu para candidatos locais

Rio de Janeiro e São Paulo mostram que o capital político do presidente da República não se transfere para os candidatos locais. Apesar dos problemas na campanha, Russomanno e Crivella apostam na estratégia de manter vínculo com o Planalto

Ingrid Soares
Augusto Fernandes
postado em 01/11/2020 07:00
 (crédito: ALEX SILVA/ESTADÃO CONTEÚDO)
(crédito: ALEX SILVA/ESTADÃO CONTEÚDO)

Na última quinta-feira, em uma transmissão ao vivo nas redes sociais, o presidente Jair Bolsonaro declarou apoio a Celso Russomanno e Marcelo Crivella, candidatos do Republicanos à prefeitura do dois maiores colégios eleitorais do país. Além de defender a eleição dos dois, o presidente declarou apoio a mais três candidatos a prefeito e sete candidatos a vereador. É pouco, diante das 26 capitais e mais 5.542 municípios, que juntos somam 533 mil candidatos a prefeitos e vereadores.

Apesar do gesto presidencial, os apadrinhados do Planalto estão ficando para trás. Nas pesquisas de intenção de voto, a 15 dias das eleições, as alianças em São Paulo e Rio de Janeiro são um desastre anunciado. Russomanno, que liderava a corrida no começo de outubro (dia 3), com 26% de intenções de voto, segundo o Ibope, desabou. Está com 20%, no levantamento do dia 30, enquanto o atual prefeito, Bruno Covas (PSDB), passou de 21% para 26%, no mesmo período, ou seja, inverteram-se as posições. Guilherme Boulos (PSol) subiu de 8% para 13%, na terceira posição, e o ex-governador Márcio França (PSB), na quarta, de 7% para 11%. A mudança foi resultado da propaganda gratuita de tevê e de rádio dos candidatos.

Russomanno levou ao ar jingles que faziam menção a Bolsonaro, com trechos como “com Russomanno e Bolsonaro, quem ganha é a nossa cidade”, “com Russomanno e Bolsonaro, temos um voto do bem” e “e (com) Bolsonaro apoiando, São Paulo é quem sai ganhando”. Após notar a brusca queda nos números, o candidato dos Republicanos modificou as peças e, durante a última semana, deixou de vincular a sua candidatura ao presidente da República e tirou as partes da música que o citavam.

Pesquisas de intenção de voto já apontavam que Bolsonaro poderia não ser um padrinho eficiente para Russomanno, como revelou o Datafolha, em setembro: o presidente da República estava com 46% de rejeição entre os habitantes da capital paulista. Mesmo assim, Russomanno apostou na amizade com Bolsonaro. Agora, mesmo com a mudança no jingle de campanha, o candidato nega que esse apoio seja tóxico e promete a gravação de vídeos com o presidente nesta semana, para utilizar no horário eleitoral na reta final da campanha.

“Acho que nós definimos desde o começo a nossa campanha e o presidente Bolsonaro pode ajudar muito a gente, a trazer recursos para a campanha. Estamos juntos, vamos continuar juntos. Não vou mudar nada na campanha, a nossa está ótima”, afirmou Russomanno, durante caminhada na capital paulista. “Nós e o Planalto nunca estivemos tão próximos, trabalhando em soluções conjuntas para recuperar São Paulo”, acrescentou.

Crivella

Tentando renovar o mandato como prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella é mais um candidato de Bolsonaro em apuros. Mais importante político da Igreja Universal do Reino de Deus, da qual é bispo, Crivella é o principal aliado do clã Bolsonaro na capital fluminense, cuja prefeitura foi completamente aparelhada. Na sexta-feira passada, inclusive, os dois gravaram um vídeo no Palácio da Alvorada, que será utilizado na campanha do atual chefe do Executivo carioca. Mesmo antes da entrada oficial do presidente da República na campanha, sua imagem já era utilizada por Crivella, valendo-se de um jingle com a frase “essa parceria é nota 10”, em alusão ao seu número de urna.

A situação do prefeito do Rio de Janeiro é mais complicada ainda do que a de Russomanno. Crivella já corre o risco de ficar fora do segundo turno. Segundo Ibope divulgado na sexta-feira, está empatado com a delegada Marta Rocha (PDT), com 14% de intenções de votos. Enquanto Crivella subiu dois pontos, desde a pesquisa do começo de outubro (02), a candidata do PDT ascendeu seis pontos, e o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), que já liderava a disputa, saltou de 27% para 32% de intenções de votos. O maior problema de Crivella é a alta taxa de rejeição, que está em torno de 57%, a maior do país.

Não por acaso Crivella aposta as fichas em Bolsonaro para chegar ao segundo turno. Com tamanha rejeição, o apoio do presidente da República pode lhe carrear os votos de que precisa. “Esse momento é espetacular para a campanha. A parceria com o presidente é fundamental. Agora, ele está ao nosso lado na frente de batalha, para nos conduzir a uma grande vitória em favor do Rio. Me atrevo a dizer que a vitória do Crivella aqui no Rio é o primeiro passo para que o presidente se reeleja em 2022”, disse o prefeito, durante transmissão pela internet.

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Apoio também traz a rejeição

Outros candidatos bolsonaristas estão fracassando. Coronel Menezes (Patriota), em Manaus; Bruno Engler (PRTB), em Belo Horizonte; e Ivan Sartori (PSD), em Santos, que também obtiveram apoio público do presidente da República, estão atrás nas pesquisas com, respectivamente, 5%, 3% e 4,5% das intenções de voto, de acordo com levantamentos feitos por Ibope, Datafolha e Instituto de Pesquisas A Tribuna. No entanto, Bolsonaro procura manter o otimismo: “Comparo os municípios do Brasil com as células do corpo humano. Quanto mais células boas, melhor é para o corpo como um todo no Brasil”, disse Bolsonaro a apoiadores, na última sexta. Ele ainda aposta em Russomanno e Crivella. “Eu acho que vai ter segundo turno no Rio, como vai ter em São Paulo. A gente vai ganhar nos dois municípios.”

Para o cientista político André Rosa, especialista em relações governamentais pelo Ibmec, o apoio de Bolsonaro não significa necessariamente que o candidato será beneficiado. Segundo ele, o fator que mais conta é a situação regional de cada um deles. “Russomanno já ia cair (nas pesquisas) porque Bruno Covas tem a máquina pública na mãos. É muito mais fácil ele conseguir chegar na frente com o capital político que possui. Já Marcelo Crivella, por si só, já está em situação complicada por causa dos processos e problemas judiciais”, explicou.

O cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, avalia que o vínculo de Bolsonaro com os candidatos pode não ser eficiente, dada à rejeição do presidente em algumas capitais. “Esse bolsonarismo está muito centrado na figura do Bolsonaro, no carisma, que não é transferível. Você pode transferir votos, mas pode transferir junto a rejeição. E esses candidatos têm herdado muito mais a rejeição a Bolsonaro do que os aspectos positivos”, observa.

Para o consultor em estratégia Orlando Thomé Cordeiro, é mais provável que Bolsonaro exerça uma influência maior nos municípios com menos de 200 mil habitantes. Prova disso, de acordo com ele, é que há uma corrida para conseguir o “selo Bolsonaro” de parte desses candidatos. “Nesses municípios menores, a imagem de Bolsonaro será usada tanto por gente que tem relação de fato, quanto por bolsonaristas de ocasião.”

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