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Desfile de tanques provoca constrangimento na Esplanada

Passagem de blindados pela Praça dos Três Poderes - considerada uma tentativa do Planalto de intimidar Congresso, no dia da votação da PEC do voto impresso - causa vergonha no meio militar e rende piadas nas redes sociais

Augusto Fernandes
Renato Souza
postado em 11/08/2021 06:00
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A. Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A. Press)

Num ato organizado em poucos dias, dezenas de blindados militares entraram na Esplanada dos Ministérios e desfilaram até o Palácio do Planalto, onde o presidente Jair Bolsonaro os aguardava, acompanhado dos comandantes do Exército, Paulo Sérgio; da Marinha, Almir Garnier dos Santos; e da Aeronáutica, Baptista Junior. De acordo com interlocutores do governo, a intenção foi tentar intimidar o Congresso, no dia em que o Parlamento votou a proposta de retorno do voto impresso. No entanto, a precariedade dos equipamentos e a ausência de apoiadores transformou a parada num vexame e atingiu diretamente o meio militar.

Na rampa do Planalto, além dos comandantes, Bolsonaro estava acompanhado de ministros civis e militares, como o general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); e o ministro da Defesa, Walter Braga Netto. Convidados pelo chefe do Executivo por meio das redes sociais, os presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux; da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), não compareceram. Também não participou o vice-presidente Hamilton Mourão, num claro recado de enfraquecimento de Bolsonaro. “Não é o perfil dele, decidiu não ir”, disse um aliado de Mourão.

Apesar do fracasso, o desfile de blindados revelou um alinhamento mais incisivo da Marinha com o Poder Executivo e pressiona o comandante do Exército, Paulo Sérgio. Desde o começo do ano, Bolsonaro exige atos de lealdade e apoio dos militares ao governo. Desde que assumiu, Paulo Sérgio resiste em participar de atos políticos e endossar manifestações públicas das Forças, embora isso tenha ocorrido em notas editadas pelo Ministério da Defesa com ataques ao Congresso. De outro lado, o comandante da Marinha, Almir Garnier dos Santos, revela proximidade política com o Executivo.

O desfile foi realizado sob a alegação da Marinha de entregar um convite a Bolsonaro para participar do dia de Demonstração Operativa, no próximo dia 16, em Goiás. A chamada Operação Formosa ocorre todos os anos, e o presidente sempre é convidado para a cerimônia. Porém, neste ano, foi a primeira vez que ocorreu com uma “ação promocional” — designação dada por militares — de passagem de tanques no centro de Brasília. A sugestão da visita das tropas à Praça dos Três Poderes partiu da Marinha, foi chancelada por Braga Netto e autorizada por Bolsonaro.

A imagem de blindados emitindo fumaça em grande quantidade, em frente ao Planalto, virou piada na internet. Militares ouvidos pelo Correio se disseram envergonhados com o evento e destacaram que as tropas foram expostas. Os veículos mais novos da Força são os modelos Guaranis, produzidos em território nacional e que se deslocam sobre rodas. Os com esteira fazem parte de uma frota antiga, com raras renovações.

Ao todo, 150 veículos, procedentes do Rio de Janeiro, circularam pelo centro da capital. Do total, ao menos 50 foram até a Praça dos Três Poderes e menos de 10 estacionaram em frente ao Ministério da Defesa após a exibição.

Na noite de segunda-feira, a Marinha emitiu nota negando pressão pelo voto impresso. “Cabe destacar que essa entrega simbólica foi planejada antes da agenda para a votação da PEC 135/2019 no plenário da Câmara dos Deputados, não possuindo relação com a mesma, ou qualquer outro ato em curso nos Poderes da República”, dizia um trecho do comunicado.

 

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