PODER

Agronegócio defende harmonia institucional, após Fiesp adiar manifesto

Entidades do setor se dizem preocupadas com os "desafios à harmonia político-institucional" e pregam respeito à democracia. Posicionamento ocorre após Fiesp adiar a divulgação de documento em que pediria pacificação entre os três Poderes

Jorge Vasconcellos
Rosana Hessel
postado em 31/08/2021 06:00
 (crédito:  Credito:Alan Santos/PR)
(crédito: Credito:Alan Santos/PR)

A decisão da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) de adiar a divulgação do manifesto em que pede harmonia entre os Poderes provocou incômodo entre empresários e industriais. A iniciativa da entidade não foi oficialmente comunicada aos cerca de 200 signatários do documento. Eles ficaram sabendo do recuo por meio da imprensa e vários, entre os quais do agronegócio, resolveram se manifestar à parte.

Em posicionamento próprio, entidades do agronegócio enfatizaram a defesa do Estado democrático de direito. “Nós queremos nos diferenciar de lideranças do agronegócio que estão apostando no conflito”, disse o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar, ao Blog do Vicente. A Abiove é uma das sete signatárias do manifesto do setor agro.

No documento, entidades agrícolas demonstraram preocupação com a imagem do país no exterior “com os atuais desafios à harmonia político-institucional e, como consequência, à estabilidade econômica e social em nosso país”.

“Somos uma das maiores economias do planeta, um dos países mais importantes do mundo, sob qualquer aspecto, e não nos podemos apresentar à comunidade das nações como uma sociedade permanentemente tensionada em crises intermináveis, ou em risco de retrocessos e rupturas institucionais”, informa o texto. “O Brasil é muito maior e melhor do que a imagem que temos projetado ao mundo. Isso está nos custando caro e levará tempo para reverter.”

As entidades do agronegócio afirmam, ainda, que são “responsáveis pela geração de milhões de empregos, por forte participação na balança comercial e como base arrecadatória expressiva de tributos públicos”. O grupo também defendeu a Constituição Federal de 1988 e a lisura do processo eleitoral: “Mais de três décadas de trajetória democrática, não sem percalços ou frustrações, porém também repleta de conquistas e avanços dos quais podemos nos orgulhar. Mais de três décadas de liberdade e pluralismo, com alternância de poder em eleições legítimas e frequentes”.

O texto destaca, também, que o desenvolvimento econômico e social do Brasil precisa de paz e tranquilidade para ser efetivo e sustentável. Defende, ainda, “a diversidade, que viceja no confronto respeitoso entre ideias”, mas “sem qualquer tipo de violência entre pessoas ou grupos”.

Justificativa

O argumento da Fiesp para adiar a divulgação do manifesto é ampliar o prazo de adesões ao documento. De acordo com a entidade, o texto virá a público depois do feriado de 7 de setembro — dia em que ocorrerão manifestações em apoio ao presidente Jair Bolsonaro e contra o Supremo Tribunal Federal (STF). Entre os apoiadores do manifesto está a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), com a qual, em retaliação, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal decidiram romper.

Em nota, ontem, a Fiesp afirmou que, na última quinta-feira, enviou consulta a diversas entidades para subscreverem o manifesto em favor do entendimento e da harmonia entre os três Poderes. “Em 24 horas, recebemos mais de 200 adesões, das mais representativas entidades brasileiras. Dezenas de outras entidades também manifestaram interesse em participar”, disse o comunicado. “Em função desse cenário, informamos que estendemos o prazo para novas adesões, que poderão ser feitas ao longo da semana.”

Segundo uma versão do manifesto que circulava ontem entre os empresários, as entidades da sociedade civil que o assinam “veem com grande preocupação a escalada de tensões e hostilidades entre as autoridades públicas”. O texto enfatiza, ainda, que “o momento exige de todos serenidade, diálogo, pacificação política, estabilidade institucional e, sobretudo, foco em ações e medidas urgentes e necessárias para que o Brasil supere a pandemia, volte a crescer e a gerar empregos e, assim, possa reduzir as carências sociais que atingem amplos segmentos da população”.

O documento diz, também, que, “mais do que nunca, o momento exige do Legislativo, do Executivo e do Judiciário aproximação e cooperação”. “Que cada um atue com responsabilidade nos limites de sua competência, obedecidos os preceitos estabelecidos em nossa Carta Magna. Este é o anseio da nação brasileira.”

A Fiesp é presidida por Paulo Skaf, aliado de Bolsonaro. Segundo apurou o Correio, a entidade não quer que o manifesto, intitulado “A Praça é dos Três Poderes”, seja interpretado como uma crítica ao governo federal, mas um apelo à pacificação.

Skaf adiou a divulgação após conversa com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e em meio à pressão do Executivo, por meio do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. (Colaborou Raphael Felice)

MP do TCU quer ouvir Febraban

O subprocurador-geral do Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, acionou o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, para explicar por que Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal ameaçaram sair da entidade por causa do manifesto que pede a harmonia entre os três Poderes.

“Ao se confirmar a notícia, haveria risco ao sistema financeiro brasileiro advindo de possível politização dos bancos, privados e públicos”, disse Furtado no ofício. O subprocurador cita a visão da Febraban, que fala que um sistema financeiro “saudável, ético e eficiente é condição essencial para o desenvolvimento econômico, social e sustentável do país”.

Na área técnica do tribunal, há a avaliação de que a decisão de Caixa e Banco do Brasil demonstra um movimento das instituições em favor de um posicionamento político do controlador (União), o que pode configurar ingerência. Para os bancos públicos, segundo fontes, “o documento tem tom político contrário ao governo”.

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Bolsonaro critica decisões de STF e TSE

O presidente Jair Bolsonaro defendeu, ontem, as manifestações organizadas por apoiadores para o 7 de Setembro e disse que os participantes vão protestar contra decisões judicais que, segundo ele, violam a liberdade de expressão. O chefe do governo também voltou a criticar as prisões de aliados, decretadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).


Bolsonaro falou sobre os atos do próximo feriado durante entrevista à Rede Fonte de Comunicação, de Goiás. “Nessa (manifestação), agora, a grande pauta vai ser a liberdade de expressão. Não pode uma pessoa do Supremo Tribunal Federal (STF) e uma do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se arvorarem, agora, como as donas do mundo e que tudo decidem no tocante a esse campo da liberdade de expressão”, disse o presidente, numa referência a Moraes e a Luís Roberto Barroso, presidente do TSE.


Ele criticou as prisões do blogueiro Oswaldo Eustáquio, do deputado Daniel Silveira e do ex-deputado e presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson. Eles foram detidos por ofensas e ameaças aos membros do Supremo. “A liberdade de expressão é a alma da nossa democracia”, frisou.


Embora organizadores dos atos do 7 de Setembro estejam sendo investigados pela Polícia Federal por ameaçarem “invadir e quebrar o STF”, Bolsonaro sustentou que os apoiadores são pacíficos. “É mais uma manifestação espontânea por parte da população. Eles vão com as cores da bandeira do Brasil e estão questionando, estão colocando para fora os seus sentimentos. Isso é salutar, é previsto na Constituição”, destacou. “E essas pessoas são pacíficas, ordeiras, trabalhadores, trabalhadoras.”

Voto impresso

Bolsonaro disse, ainda, que a defesa do voto impresso nas eleições será outra bandeira importante dos atos marcados para o Dia da Independência. Os questionamentos do presidente sobre a segurança da urna eletrônica estão no centro da crise entre o Executivo e o Judiciário. Depois de dizer, reiteradamente, que não haverá eleições em 2022 sem o voto impresso, o chefe do Planalto se tornou alvo de inquéritos no STF e no TSE.
“Muitos vão falar também (nas manifestações) do voto impresso, do voto auditável, uma contagem pública. Estão pedindo muita coisa? Não estão pedindo nada além do normal, nada além daquilo que os próprios Poderes da República deviam atender essas pessoas”, afirmou o chefe do governo.


Ele criticou o Supremo também pelo julgamento sobre a aplicação do marco temporal para efeito de demarcação de terras indígenas. “O Supremo, agora, caso aprove o novo marco temporal, está mudando a Constituição, sendo que isso não é atribuição deles. Agora, qual o reflexo para o Brasil todo e, em especial, para os estados do Centro-Oeste? Novas reservas (indígenas) poderão surgir”, acrescentou. (JV)

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