Qualquer que seja o desfecho da votação da PEC dos Precatórios, o governo Bolsonaro já foi desenganado pelo mercado. Sua única alternativa, no contexto atual, seria mudar a lógica da atuação: em vez de reeleição a qualquer preço, equilíbrio das contas públicas e controle da inflação, mesmo com o novo mandato em risco. Vozes mais sensatas diriam a Bolsonaro que a segunda hipótese tornaria sua reeleição menos improvável, mas isso é exigir muito do "estado-maior" do Mito. Nem o ministro da Economia, Paulo Guedes, é capaz de sustentar essa posição.
Na trajetória da economia brasileira, desde o Plano Real até hoje, o controle da inflação foi precondição para a preservação do poder. Foi assim na eleição e reeleição de Fernando Henrique Cardoso, no primeiro e segundo mandatos de Lula e no primeiro mandato de Dilma Rousseff. Quando a inflação saiu do controle, a vaca foi para o brejo. Hoje, a inflação está tão descontrolada que a ata do Copom, divulgada ontem, sinalizou para o mercado uma taxa Selic de 12%. Cada ponto percentual na taxa de juros tem um impacto de até R$ 40 bilhões na dívida pública.
O presidente da República gosta de transferir responsabilidades e terceirizar os problemas. Por exemplo, no caso dos combustíveis, culpava reiteradamente os governadores, por causa do ICMS, que no caso da gasolina e do diesel é arrecadado no destino. Pela regra, o imposto corresponde a um percentual entre 25% e 34% incidente sobre o preço da venda da gasolina e de 12% a 25% sobre o diesel. A alíquota incide sobre o chamado Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final (PMPF) — valor de referência calculado a cada 15 dias, mas as tarifas foram congeladas pelos governadores, enquanto a nova regra proposta pelo governo, o ICMS fixo, calculado com base no preço médio dos combustíveis nos dois anos anteriores, aguarda votação no Senado. A arrecadação não poderia exceder, em reais por litro, o valor da média dos preços ao consumidor final usualmente praticados no mercado, considerado ao longo dos dois exercícios imediatamente anteriores.
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Patinhos feios
O congelamento da tarifa pelos governadores escancarou as contradições de Bolsonaro com a Petrobras, que não tem como deixar de acompanhar a alta do preço do petróleo no mercado mundial, que vem impactando fortemente o nosso câmbio. A empresa virou o patinho feio para Bolsonaro. Ele não perde uma oportunidade de criticá-la, por causa da pressão dos caminhoneiros de sua base eleitoral. Agora, parece decidido a vendê-la, apesar da resistência dos militares e dos setores nacionalistas de sua base eleitoral. O presidente da República considera os aumentos de combustível uma espécie de "fogo amigo" da empresa, que é presidida pelo general Joaquim Silva e Luna, ex-ministro da Defesa do governo Michel Temer.
Segundo o general, há uma espécie de "caça ao bode expiatório" pelo preço dos combustíveis. Ele diz que a empresa não controla o preço da gasolina e do diesel. "O fortalecimento do dólar em âmbito global e, em especial, no Brasil, tem alavancado os preços das commodities e incrementado a inflação. Mas essas incômodas verdades não parecem muito apelativas", argumenta. Durante a reunião do G20, em Roma, Bolsonaro disse ao presidente da Turquia, Recep Erdogan, que a Petrobras era um problema. Também na cidade italiana, voltou a falar em privatizar a Petrobras e anunciou um aumento de combustível em 20 dias, mas acabou desmentido pela direção da empresa.
E o Banco Central (BC)? A Ata do Copom afirma que "questionamentos relevantes em relação ao futuro do arcabouço fiscal atual" resultaram em "elevação dos prêmios de risco" e "das expectativas de inflação", o que implica "maior probabilidade para cenários alternativos que considerem taxas neutras de juros mais elevadas". Mais "fogo amigo". Para o mercado, isso significa que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, pretende calibrar os juros de acordo com o tamanho do rombo no teto de gastos, mesmo que isso provoque recessão. Será outro patinho feio.
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