Guerra no leste europeu

Governo ameaça congelar preços dos combustíveis para segurar inflação

Governo estuda levar a Petrobras a segurar valor dos combustíveis e quer forçar o desatrelamento dos reajustes do padrão internacional

Fernanda Strickland
Michelle Portela
Deborah Hana Cardoso
postado em 08/03/2022 06:00 / atualizado em 08/03/2022 06:01

O governo ameaça congelar os preços dos combustíveis para tentar evitar que aumentos vertiginosos empurrem a inflação para cima e afetem negativamente a imagem de Jair Bolsonaro, de forma a prejudicar o projeto de reeleição. Na segunda-feira (7/3), o presidente deu a entender que haverá uma intervenção na política da Petrobras de alinhamento à cotação internacional do barril.

"Tem uma legislação errada, feita lá atrás, que você tem a paridade com o preço internacional. Ou seja, o que é tirado do petróleo, leva-se em conta o preço fora do Brasil. Isso não pode continuar acontecendo", ameaçou Bolsonaro, durante entrevista a uma rádio.

A possibilidade de haver uma intervenção na política de preços da Petrobras, segundo o próprio presidente, fez as ações preferenciais da estatal desabarem 7,10%, fechando o dia em R$ 31,10. "Estamos tomando medidas porque é algo anormal. O barril do petróleo saiu da casa dos US$ 80 para US$ 120 dólares", destacou Bolsonaro, na mesma entrevista.

Estava marcada para ontem uma reunião ministerial para decidir as medidas que podem ser tomadas para evitar os reflexos, nos postos de combustíveis, da disparada da cotação internacional do petróleo por causa da guerra da Rússia contra a Ucrânia — foi transferida para hoje. Porém, o presidente já começou a tratar do assunto e conversou com os ministros da Casa Civil, Ciro Nogueira, e com o da Economia, Paulo Guedes.

Eleições

Nessa possibilidade de intervenção tem, também, um cálculo eleitoral. Seus adversários na corrida presidencial Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Ciro Gomes (PDT) têm pregado, abertamente, o descolamento dos preços da Petrobras em relação ao mercado externo. Além disso, caso haja novo reajuste nos combustíveis por causa da política de paridade, Bolsonaro terá de tourear os caminhoneiros — parte da sua base de apoiadores — que, há tempos, estão irritados com o preço do diesel. Sem contar o impacto inflacionário, que se refletiria nos índices de aprovação nas pesquisas de opinião.

O governo acompanha de perto a cotação do petróleo. A tendência de congelamento temporário nos preços dos combustíveis ganha força sobretudo porque, ontem, o barril do tipo Brent, referência do mercado, resvalou nos US$ 140 — aproximou-se do recorde absoluto de US$ 147,50, alcançado em julho de 2008. O recuo só veio depois de mais uma rodada de negociações entre russos e ucranianos, e fechou em alta de 4,31%, a US$ 123,21.

Por ser a Rússia o atual segundo maior produtor de petróleo do mundo — de acordo com o mais recente levantamento da Agência Internacional de Energia (IEA, sigla em inglês) —, os Estados Unidos negociam com Venezuela e Irã o aumento na produção para evitar a disparada no preço do barril. Trinta países liberaram seus estoques de emergência e colocaram à disposição 60 milhões de barris a fim de segurar a cotação. Além disso, alguns países já começam a tomar medidas para evitar da carestia, puxada pelo aumento dos combustíveis na bomba.

Pressão

De acordo com Carlos Heitor Campani, professor de Finanças do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead/UFRJ), "o petróleo da Rússia vai sair do mercado e gerar uma pressão muito alta por novos fornecedores, em função das sanções comerciais impostas à Rússia", explicou.

Para Flávio Conde, head de renda variável da Levante, o que interessa aos acionistas da Petrobras — que no ano passado teve um lucro recorde de R$ 106,6 bilhões — é não mexer na política de preços, para que a companhia não volte a gerar prejuízo, como no primeiro governo da presidente Dilma Rousseff, quando a estatal segurou os preços dos combustíveis para não provocar o aumento da inflação. Ele defende que o governo mexa nos impostos, como ICMS e PIS/Cofins, e não na política de preços da Petrobras. "A questão dos combustíveis está na mesa desde 2021, que são os impostos para atenuar os preços", apontou.

De acordo com o analista da Ouro Preto Investimentos Bruno Komura, a intervenção nos preços dos combustíveis será prejudicial para a Petrobras. "Essa parcela importada vai ter o custo internacional. Mas, se não há repasse desses custos, acaba gerando prejuizo", afirmou.

Em paralelo ao congelamento estudado pelo governo, o Senado começa a votar, amanhã, o Projeto de Lei (PL) 1.472/2021 e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 11/2020, que estabelecem medidas de alívio o bolso do consumidor e evitar o impacto generalizado que o alto preço do petróleo pode ter no mercado nacional. O primeiro estabelece a criação de diretrizes de preços para diesel, gasolina e GLP, institui imposto de exportação sobre o petróleo bruto e cria um Fundo de Estabilização para os preços, que seria abastecido por royalties da venda do petróleo.

Já o PLP 11/2020, propõe alterações na cobrança do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), arrecadado pelos estados. A proposta é que as alíquotas do tributo sejam aplicadas sobre o litro do combustível e não por um percentual no valor final da compra, como ocorre atualmente.

(Colaboraram Victor Correia e Fabio Grecchi)

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