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Bolsonaro diz que escolherá um vice sem 'ambições de assumir' a cadeira dele

O presidente indica que Braga Netto vai compor sua chapa e diz que precisa de alguém sem "ambições de assumir minha cadeira"

Em busca de um vice fiel e maleável para seu projeto de reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) indicou que o ministro da Defesa, Braga Netto, será o escolhido para compor sua chapa. "É nascido em Belo Horizonte e fez colégio militar", afirmou o chefe do Executivo, em entrevista à rádio Jovem Pan. O general nasceu na capital mineira.

Bolsonaro afirmou que o público saberia sua escolha a partir do dia 31, quando os ministros têm de deixar os cargos se forem se candidatar às eleições de outubro. "Eu não quero adiantar agora o nome dele, mas devemos ter um vice que não é para ajudar a ganhar a eleição, mas, sim, para governar o Brasil", afirmou. O presidente também não escondeu uma das preocupações em relação a quem se juntará a ele na chapa. "Eu tenho de ter um vice que não tenha ambições de assumir a minha cadeira ao longo do mandato."

Desde o começo da gestão, Bolsonaro tem engatado atritos com o vice Hamilton Mourão. O general assume posições e dá declarações na contramão do presidente. Na rusga mais recente, o chefe do Planalto o desautorizou de comentar a guerra entre Rússia e Ucrânia. Disse que o general deu "peruada naquilo que não lhe compete".

O presidente também já comparou o vice a um "cunhado" e afirmou que ele tem uma "independência muito grande" que, por vezes, acaba atrapalhando. "O vice é igual cunhado, né? Você casa e tem de aturar o cunhado do teu lado. Você não pode mandar o cunhado embora", frisou, na ocasião. Mourão também, por vezes, foi excluído de encontros no Planalto. Na primeira reunião ministerial do ano, por exemplo, ocorrida na semana passada, nem sequer foi convidado. Mourão (Republicanos), por sinal, pretende concorrer a uma vaga no Senado pelo Rio Grande do Sul.

Horas depois, numa festa no Palácio do Planalto, em que comemorou seus 67 anos, Bolsonaro voltou a se referir a Braga Netto e ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que é carioca, mas estudou em Belo Horizonte. "Hoje, eu falei que o meu vice vai ser mineiro. Estou vendo aqui Paulo Guedes e Braga Netto", riu. O ministro da Economia, prontamente, apontou para o general: "O mineiro é esse".

Sem luz própria

Na avaliação do general da reserva Paulo Chagas, Braga Netto não tem a projeção que Mourão alcançou. "Ele começou a ser notado pelo fato de ter sido convidado a integrar o governo", frisou. Segundo o general, a questão é que "Braga Netto está perfeitamente enquadrado com o que Bolsonaro quer: alguém que dependa dele, que faça o que ele manda, que não tenha luz própria".

Para Chagas, o ministro obedecerá às ordens que o presidente der. "Tem a disciplina intelectual do militar: essa é minha missão? Vou fazer. Não tem nada a ver com militares, isso é um problema político. O militar cidadão, cada um tem opinião, como instituição, não tem opinião", apontou.

Um outro militar, ouvido pelo Correio na condição de anonimato, destacou que "Braga Netto é general, não é tão político". "Eles se entendem muito. Esse é o ponto. O vice no Brasil é para construir alianças. Aqui, parece Roma: um querendo derrubar o outro. Mas afirmo que isso o Braga Netto não fará com o presidente", enfatizou.

Vice-presidente do PL, o deputado Capitão Augusto (SP) destacou que Bolsonaro tem capacidade de obter sozinho os votos de que precisa para uma recondução. "O presidente é uma coisa rara que tem na política, em que os votos são exclusivamente dele. Ele não precisa de vice para agregar voto nem perde voto por causa do vice", argumentou. "Isso dá uma liberdade muito grande para ele escolher quem quiser, da confiança dele, com quem vai sentir mais afinidade, quem achar que o ajudará no projeto", acrescentou.

Sem peso político

Juliano Cortinhas, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), disse que Braga Netto não agrega qualquer tipo de peso político. A identificação, na verdade, é a lealdade do general a Bolsonaro. "Ele se mostrou um escudeiro fiel, mas não me parece que acrescente eleitoralmente", afirmou.

O especialista destacou que, apesar das declarações do presidente de não se importar com a popularidade do vice, o Centrão — grupo de sustentação do governo — não entra em "barco furado". "Bolsonaro sabe que, se colocar um vice do Centrão, corre o mesmo risco da ex-presidente Dilma Rousseff (PT): o de eles se articularem, no segundo mandato, pelo impeachment", avaliou. "Apesar de o presidente ter cometido vários crimes de responsabilidade e, certamente, cometerá novamente, tendo um vice do Centrão, o impeachment não se torna só possível, como provável. Seria fácil o Congresso se articular para deslocá-lo do poder. Parece-me que ele vê esse risco e vai manter um militar que foi muito leal a ele durante esta gestão", apontou.

General em 4 atos

  • Atrito com Guedes: Em abril de 2020, quando era ministro-chefe da Casa Civil, Braga Netto capitaneou o Plano Pró-Brasil, com medidas paraaretormada da economia no pós-covid-19, apesar das divergências com o ministro da Economia, Paulo Guedes.
  • Troca nas Forças Armadas: Ao assumir o Ministério da Defesa, em março de 2021, Braga Netto trocou as cúpulas de Exército, Marinha e Aeronáutica, numa ação sem precedentes na história das Forças. Ele agiu por pressão do presidente Jair Bolsonaro, insatisfeito com os comandantes, que resistiam em politizar as instituições.
  • Sigilo de 100 anos: Em junho de 2021, Walter Braga Netto impôs sigilo de 100 anos no processo administrativo aberto pelo Exército contraogeneral Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, pela participação de ato em apoio ao presidente Jair Bolsonaro, no Rio de Janeiro.
  • Atos antidemocráticos: Em meados de julho do ano passado, o general enviou um recado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PPAL), de que não haveria eleições em 2022 sem voto impresso e auditável. À época, o Congresso Nacional estava analisando a proposta, defendida por Bolsonaro.

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