Congresso Nacional

PL pode mudar a Lei da Arbitragem e tirar Brasil de padrões internacionais

Câmara pode aprovar urgência para tramitação de projeto que prevê, entre outras medidas, a divulgação de informações sensíveis de uma disputa e limitações para a atuação de mediadores. Texto, porém, sofre críticas

Victor Correia
postado em 01/08/2022 05:55
Margarete é autora do PL que revê a Lei de Arbitragem, cujo texto é considerado um retrocesso e na contramão do padrão internacional -  (crédito: Nilson Bastian/Agência Câmara)
Margarete é autora do PL que revê a Lei de Arbitragem, cujo texto é considerado um retrocesso e na contramão do padrão internacional - (crédito: Nilson Bastian/Agência Câmara)

No primeiro dia depois do recesso legislativo, a Câmara dos Deputados pode votar, hoje, um requerimento de urgência para o Projeto de Lei (PL) 3.293/21, que altera a Lei da Arbitragem. A prática é uma forma de solucionar conflitos entre partes privadas, como empresas, sem passar pelo Judiciário. O texto em tramitação prevê, entre outras medidas, a divulgação de informações envolvidas na disputa e limitações para a atuação dos árbitros. Especialistas e entidades da área, porém, defendem que o PL é prejudicial ao setor.

O projeto é de autoria da deputada federal Margarete Coelho (PP-PI) e foi apresentado em novembro do ano passado. A argumentação do texto traz que as alterações propostas na Lei 9.307/96 visam "prover limites objetivos à atuação do árbitro e otimizar o dever de revelação às partes". Caso o PL seja aprovado, os árbitros não poderão atuar em mais de 10 processos ao mesmo tempo, nem compor tribunais com os mesmos membros.

Outro ponto importante é a obrigatoriedade de se publicar informações referentes às disputas arbitradas, como os valores envolvidos. A deputada defende que a lei não obriga que as arbitragens sejam confidenciais, e que a divulgação dos dados pode dissuadir os pedidos indevidos de anulação das decisões. Além disso, conforme salientou, "ajudará a criar uma verdadeira jurisprudência, tão cara ao sistema jurídico, mas inexistente na arbitragem".

O PL está na Comissão de Constituição, Justiça e Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara, onde foram apresentadas cinco emendas. O colegiado, porém, ainda não votou a matéria.

Em 6 de julho, foi apresentado um requerimento de urgência pelos deputados André Fufuca (PP-MA), Igor Timo (Podemos-MG), Elmar Nascimento (União-BA), Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), Altineu Côrtes (PL-RJ), Christiane de Souza Yared (PP-PR) e Antônio Brito (PSD-BA). O requerimento está previsto para apreciação na sessão de hoje. Caso aprovado, o PL poderá ser enviado a votação no plenário sem passar pelas comissões.

Rejeição

Desde a apresentação do pedido de urgência, entidades ligadas à arbitragem, ao Direito e federações industriais criticam o projeto, que avaliam como prejudicial à arbitragem no país. O Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) emitiu uma nota técnica criticando o pedido de urgência e citando mais de 50 instituições jurídicas contrárias ao texto.

Segundo a nota, assinada pelo advogado Joaquim de Paiva Muniz, membro da comissão permanente de arbitragem e mediação do IAB, as alterações propostas no PL podem levar "a redução de casos, a migração das arbitragens brasileiras para outros países e a eliminação do país como possível sede de arbitragens internacionais, gerando, ao fim, prejuízos à economia brasileira".

Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), além do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC) e da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham), também se manifestaram contrários ao PL.

Segundo o presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr), André Abbud, as mudanças na legislação trazem "regras sem paralelo com nenhum país que tenha a arbitragem como um método desenvolvido. Se aprovado, (o projeto) vai fazer com que a nossa legislação sobre a arbitragem seja única no mundo, completamente atípica e fora dos padrões internacionais", lamentou.

Abbud defende que a limitação a 10 arbitragens por profissional é absurda e a compara com os juízes de Direito, que atuam em centenas de casos. "O projeto está assumindo que tudo o que os juízes fazem todos os dias no Brasil não presta", ironiza.

Ele explica, ainda, que a confidencialidade é um dos grandes incentivos à arbitragem, que envolvem disputas contratuais com informações sensíveis, segredos comerciais e valores que as empresas em confronto não querem tornar públicas.

O presidente da CBAr aponta, também, que as entidades ligadas à arbitragem não foram consultadas na apresentação e tramitação do projeto. E considera inadequado o pedido de urgência.

"Por que não deixar ele (o PL) ser discutido na CCJC, em audiência pública? Não vemos razão pela qual o debate em torno desse projeto precise ser feito com urgência para aprovar ao longo desta semana", critica.

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