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PEC do STF: voto de Jaques Wagner foi uma forma de agradar Pacheco

Voto do líder do governo no Senado a favor da PEC que limita ação do STF é visto como uma forma de manter canal aberto para pautas econômicas. E de não expor o presidente da Casa a uma derrota de consequências imprevisíveis

Ação de Wagner também foi pensada para não expor Pacheco a derrota cujas consequências seriam imprevisíveis -  (crédito: Roque de Sá/Agência Senado)
Ação de Wagner também foi pensada para não expor Pacheco a derrota cujas consequências seriam imprevisíveis - (crédito: Roque de Sá/Agência Senado)
postado em 25/11/2023 03:55

O voto do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita poderes do Supremo Tribunal Federal pegou de surpresa muita gente que acompanha de perto as articulações políticas em Brasília. O texto aprovado por 52 x 18 provocou reações imediatas no STF e na base aliada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas poucos acreditam que a decisão de Wagner esteja descolada dos interesses do Palácio do Planalto. Ao contrário: foi uma forma de agradar ao presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), diante da vasta agenda econômica que o governo espera ver aprovada no Congresso.

O Correio conversou com políticos, assessores e analistas para mapear o que estava em jogo. Há quase um consenso em torno da intenção do governo de dar a Pacheco uma carta para ser usada mais à frente, quando ele definirá o futuro político depois de deixar a Presidência do Senado, em 2025. O confronto com o STF agrada ao eleitorado conservador, justamente aquele que o senador pretende influenciar caso decida se candidatar a algum cargo majoritário por Minas Gerais, em 2026.

Em troca, o governo estreita a relação com sua base de centro-direita no Senado para facilitar a aprovação de medidas estratégicas (como o novo Marco Fiscal e a Reforma Tributária), além de projetos de infraestrutura e de bem-estar social. Projetos que dependem de estabilidade econômica e recursos orçamentários.

Depois de anunciar o voto a favor da PEC, contrariando a orientação da liderança do PT, Wagner evitou dar explicações. Limitou-se a publicar, numa rede social, uma declaração de que a decisão "foi estritamente pessoal, fruto de acordo que retirou do texto qualquer possibilidade de interpretação de eventual intervenção do Legislativo".

Mas ninguém comprou a ideia de que a posição de Wagner foi de caráter "estritamente pessoal". Um senador lembrou que o colega é um dos poucos políticos no qual Lula deposita plena confiança.

Remar contra a orientação dada à bancada pelo líder do PT no Senado, Fabiano Cantarato (ES), foi uma estratégia pragmática de Wagner, com o conhecimento de Lula, segundo fontes do Palácio, que pesou prós e contras em relação à PEC. E a conclusão foi que não seria conveniente ao governo contribuir para uma derrota de Pacheco nesse momento. Ter como bandeira o confronto com o STF interessa a boa parte do Congresso, majoritariamente conservador.

"Veja que a oposição deve acalmar um pouco, depois dessa entrega às bases. Isso deverá facilitar a vida do governo e do Pacheco no que resta deste ano e no início de 2024", avalia o cientista político Leandro Gabiati.

Ponte à direita

Ao votar com o Centrão, Wagner "construiu uma boa ponte com a direita", disse outra fonte do Parlamento. Para ela, uma derrota de Pacheco seria "humilhante" e não interessava ao governo deixar o presidente do Senado fragilizado.

Lideranças do PT e do MDB — os dois partidos que encaminharam voto contrário à PEC — criticaram Wagner. O que mais irritou os emedebistas foi que a matéria estava condenada à rejeição.

"(Os defensores da PEC) tinham 47 votos. Quando Wagner entrou, virou o jogo. Essa votação só serviu para criar constrangimento", queixou-se um interlocutor do MDB

Ele observa que há, como pano de fundo, a disputa pela Presidência do Senado, em 2025. Pacheco e o presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Davi Alcolumbre (União-AP), têm interesse em mobilizar a bancada bolsonarista no Senado para viabilizar a candidatura do próprio Alcolumbre, que deseja voltar a comandar a Casa.

A PEC, entretanto, não terá tramitação fácil na Câmara. A aposta do governo e de lideranças da base aliada é que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), não se esforçará para o texto avançar. "Esse projeto (PEC) não será aprovado. E ainda vai fortalecer Lira na disputa com Pacheco", vaticina um parlamentar.

Reação desproporcional

Pacheco considerou a reação dos ministros do STF à PEC que limita decisões monocráticas como "desproporcional". O comentário foi feito ontem, durante a solenidade de outorga da Medalha de Honra ao Mérito Jurídico 2023, na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), em São Paulo.

"O único propósito foi de estabelecer equilíbrio entre os Poderes, com uma essência básica, muito simples, do que é essa emenda constitucional, cuja reação foi absolutamente desproporcional. Significa que uma lei votada na Câmara, no Senado, sancionada por um presidente, não pode ser revista por um ato unilateral de um único membro do Poder Judiciário", frisou.

Na tentativa de apaziguar a relação entre Legislativo e Judiciário, Lula na quinta-feira recebeu os ministros Gilmar Mendes, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes para jantar no Palácio da Alvorada. Do encontro participaram o advogado-geral da União, Jorge Messias, e o ministro da Justiça, Flávio Dino, ambos cotados para a 11ª cadeira no STF.

A pacificação buscada por Lula em por trás o interesse de que o Supremo dê andamento à pauta dos precatórios, cujo relator é o ministro Luiz Fux, mas não há data definida para julgamento. Na ação, um dos questionamentos envolve a imposição de limite, entre 2022 e 2026, para o pagamento das dívidas da União com pessoas físicas e jurídicas. (Colaborou Ândrea Malcher)

 

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