Entrevista | KATIA SASTRE | DEPUTADA FEDERAL SUPLENTE (PL-SP)

"Violência doméstica não é crime militar", diz autora de PL aprovado na Câmara

A deputada suplente Katia Sastre propõe que crimes de violência doméstica cometidos por militares contra a mulher também militar sejam transferidos para a Justiça comum sob amparo da Lei Maria da Penha

  Deputada Policial Katia Sastre  ( PL  SP ), durante sessão na Camara dos Deputados -  (crédito:  Billy Boss/Camara dos Deputados)
Deputada Policial Katia Sastre ( PL SP ), durante sessão na Camara dos Deputados - (crédito: Billy Boss/Camara dos Deputados)
postado em 15/01/2024 03:55

Hoje na suplência, a deputada federal Policial Katia Sastre (PL-SP) é autora de um dos projetos aprovados por unanimidade no pacote de proteção e combate à violência contra as mulheres, no fim do ano passado, na Câmara. Sastre propõe que os crimes de violência doméstica ou familiar cometidos por militares, sejam policiais ou das Forças Armadas, contra a cônjuge também militar, sejam transferidos da Justiça Militar para a justiça comum.

Para Katia Sastre, que é aliada política do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a Justiça castrense falha ao não punir esses agressores fardados por tratar esse tipo de crime com base no Código Penal Militar, desconsiderando os avanços da Lei Maria da Penha. Essa legislação prevê as formas de violência doméstica contra a mulher como físicas, psicológicas, sexuais, patrimoniais e morais.

 

 

Ao Correio, Sastre contou que, quando apresentou a proposta, em 2021, foi abordada, principalmente, por militares das Forças Armadas — e até por algumas esposas e companheiras de integrantes das corporações militares — para não avançar com o tema.

Depois de 21 anos como PM — se aposentou da carreira depois que entrou na política —, Sastre diz que "o militar é machista" e que os que cometem agressões devem ser submetidos ao rigor da Lei Maria da Penha.

Por que a senhora decidiu apresentar esse projeto?

Na Polícia Militar existem muitos casais que se conheceram no percurso natural da profissão, no serviço. É o meu caso, por exemplo. Só que, quando entre policiais envolve crime de violência doméstica, não é invocada a Lei Maria da Penha. E o caso é tratado como crime militar. Não pode! Está errado. Se é uma violência que ocorre dentro da sua casa, do casal, tem que ser sim aplicada essa lei. Não é como se fosse algo dentro do quartel. Nesses 21 anos na PM a gente vê isso. A PM é, geralmente, machista. Como em outras profissões. E a gente sabe que a instituição é um pouco machista mesmo.

Hoje, como tramita esse tipo de denúncia?

Tinha esse problema. Quando a denúncia de violência contra a mulher chega numa delegacia, hoje, vai parar nas mãos do superior hierárquico militar. E muitos deles acabam relaxando para defender o amigo, a instituição. E, aí, chama o superior, que tira a competência de um delegado. E vai para a Corregedoria, na esfera militar.

Com que frequência isso ocorre?

Há uns dois ou três anos, uma juíza me disse que 70% das denúncias eram sobre crimes de violência doméstica, contra mulheres. E que não iam para a frente por conta disso. Vi a necessidade de apresentar esse projeto porque conheço essa realidade da convivência com esses militares. Era uma necessidade, a de tirar essa responsabilidade da Corregedoria e de o caso ser julgado com base na Lei Maria da Penha. Algo que acontece dentro da casa do casal não é assunto militar, mas, sim, de família.

E a senhora conheceu e testemunhou muitos casos de mulheres militares agredidas pelos maridos militares?

Sim. Infelizmente, é um tipo de crime muito comum no nosso meio. Como nos outros. Não tem classe social. Não é por sermos defensores da lei e da ordem, que isso não ocorre na polícia. É algo do ser humano, não tem diferença por causa da profissão que exerce. Como ocorre em outras. Não existia concurso para mulheres nas polícias. O mundo é machista ainda.

Quando a sra. apresentou o projeto, em 2021, enfrentou resistências?

Sim, muita resistência. Em especial, das Forças Armadas. Chegaram a pedir reunião comigo. Foram várias reuniões com o pessoal das Forças Armadas. Afinal, um general não quer ser preso por um delegado (caso cometa a violência contra uma mulher). E digo mais, fui procurada até por mulheres de militares das forças para não seguir adiante.

A sra. é uma deputada do PL, suplente mas esteve no mandato, da base do ex-presidente Jair Bolsonaro. Não se incomodaram com o projeto?

Não. Não teve nenhuma resistência. Quando eu estava no mandato, inclusive, outros parlamentares me apoiaram. Do PL mesmo, me apoiaram a seguir com o projeto. Não teve resistência da direita, não.

Como a sra. recebeu a inclusão do projeto no pacote da bancada feminina?

Tenho acompanhado a tramitação e fiquei muito feliz. Foi aprovado por unanimidade. Nós, deputadas, que conhecemos certas realidades, que atuamos diretamente em alguns setores e áreas, conhecemos cada instituição. Por isso é importante ter deputados de todas as áreas, porque sabem onde está errado, onde existem os problemas.

Que mensagem pode deixar se o projeto for aprovado no Senado e se tornar lei?

Se aprovado, será um grande avanço. É muito necessário para o país. E esses militares infratores serão julgados na esfera devida e serão presos. Não quer ser preso? Simples. Não agrida. Não faça.

 

 

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