Eleições

"Lira quer ser primeiro-ministro", diz Sérgio Abranches

Novo colunista dos Diários Associados analisa relação do Legislativo com o Executivo. Amanhã, ele estreia coluna quinzenal

O cientista político e escritor, Sérgio Henrique Abranches.
      
       -  (crédito:  Chico Cerchiaro/Divulgação)
O cientista político e escritor, Sérgio Henrique Abranches. - (crédito: Chico Cerchiaro/Divulgação)
Bernardo Estillac - Estado de Minas
postado em 18/02/2024 10:44

Os ainda incipientes movimentos da política em Brasília em 2024 já anunciam que a relação entre os poderes na capital federal deve seguir conturbada. Com menos de duas semanas de trabalhos legislativos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve reuniões particulares com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em resposta a uma classe de parlamentares que anuncia de forma cada vez mais clara seu desejo de avanço sobre o orçamento da União. Em entrevista, o novo colunista político dos Diários Associados, o cientista político e sociólogo Sérgio Abranches, autor de livros como Presidencialismo de coalizão e Tempos dos governantes incidentais, comenta o atual cenário do país e seus possíveis desdobramentos em ano de eleições municipais.

Eleições 2024

Não acredito muito que o avanço do Legislativo sobre o Orçamento pode ter impacto nas eleições municipais. A eleição municipal tem uma lógica muito diferente da eleição geral, ela tem muito a ver também com o desempenho e a capacidade do prefeito. Eu conheço cidades em que o prefeito está reeleito independentemente de ser ligado ao Bolsonaro ou ao Lula, mas porque ele tem o apoio da população por fazer uma boa gestão. Agora, nas capitais e nas grandes cidades, essa polarização que ainda existe entre o Lula, PT e a extrema direita ligada ao Bolsonaro pode produzir resultados desagradáveis para ambos os lados.

Relação Lula X Lira

Claramente, o Lira tem em mente fazer uma transformação possível sem a convocação de uma assembleia para rever a Constituição. Ele está querendo fazer isso paulatinamente dentro de um processo de descaracterização do presidencialismo brasileiro para transformá-lo em uma espécie de semipresidencialismo, nos moldes de Portugal ou Espanha, com a transferência do poder de fato do Executivo para o Legislativo. Por isso, ele acha que o Orçamento pode ser executado pelo Congresso. Mas isso é uma anomalia, prejudica a governabilidade.

Aproximação

Após o discurso na Câmara, Lira teve uma reunião considerada amistosa com Lula, mas acho que isso não muda a situação. Acho que, de novo, Lira está tentando ser um ‘primeiro-ministro’. Ele vai e conversa com o Lula e negocia determinados aspectos da pauta. Naquilo que ele concorda com o presidente, ele usa seu poder para aprovar. Ele negocia diretamente com o presidente, embora não faça parte da coalizão presidencial.

Negociações

O Lula é muito bom negociador, mas está acostumado a ceder. Sempre foi pragmático. Fazia greves, usava todos os recursos, mas na hora H, no momento de bater martelo, era capaz de aceitar menos do que ele desejava. Eu acho que é isso que está acontecendo na relação dele com o Lira.

Concessões

As concessões a Lira podem prejudicar o governo na capacidade de investimentos. O Brasil tem uma situação orçamentária muito peculiar, o nosso orçamento é muito rígido no sentido das verbas que são destinadas obrigatoriamente a determinados setores. Há uma certa flexibilidade na alocação dentro do setor, mas sobra muito pouco para o presidente fazer a marca política dele. É nessa área que a cunha do Legislativo, sobretudo a da Câmara dos Deputados, está aumentando.

Rodrigo Pacheco

A aproximação entre Lula e Pacheco pode ter como um dos objetivos frear os avanços não só de Lira, mas do bolsonarismo em geral. Na eleição de 2018, houve uma ruptura em que o eixo de disputa presidencial ficou com um espaço vazio, porque o PSDB desapareceu e ainda não tem nenhum partido que ocupe esse lugar. O Lula, durante todos os seus governos, achou que o PSDB era o grande mal porque havia uma polarização. Mas era uma polarização que não era radicalizada como se tornou a com Bolsonaro. Então ele aprendeu que é melhor ter um opositor como o PSDB do que como o Bolsonaro e está em busca de alguém, de algum partido, que faça o papel dos tucanos.

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