
O advogado Demóstenes Torres, representante do almirante Almir Garnier, de 64 anos, acusou a Procuradoria-Geral da República (PGR) de ampliar indevidamente a denúncia contra o seu cliente no julgamento sobre a tentativa de golpe de Estado, ao incluir episódios que não constavam no processo original.
Segundo ele, a medida viola o artigo 384 do Código de Processo Penal. “Se tiver que imputar dois outros fatos, tem que fazer o aditamento à denúncia. Ou, se não, o Supremo Tribunal Federal tem que pedir para desconsiderar no julgamento esses dois fatos, que são fatos novos”, afirmou.
Entre os exemplos citados por Torres estão o desfile da Marinha em 10 de agosto de 2021, interpretado como ato simbólico de apoio a uma ruptura institucional, e a ausência de Garnier na cerimônia de passagem do comando da Marinha em 2023. Para o advogado, ambos não poderiam ser usados como base de acusação. “A proposta do procurador-geral é injurídica, não existe, e carregará inúmeros problemas para o Supremo Tribunal Federal caso seja aceita”, sustentou.
Delação de Cid
Outro alvo da defesa foi a delação premiada do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, cuja credibilidade foi fortemente questionada. Torres lembrou que o próprio procurador-geral Paulo Gonet qualificou Cid como “omisso, contraditório, resistente ao cumprimento das obrigações pactuadas” e faltoso com a lealdade durante o acordo.
“Então eu pergunto a vossas excelências: é possível convalidar essa delação ou ela tem que ser rescindida?”, indagou o advogado, alegando que aceitar a colaboração em tais condições comprometeria a integridade do julgamento.
Para ele, a tentativa da PGR de mitigar o acordo, mantendo a validade das informações, mas reduzindo os benefícios ao delator, é “incongruente” e fere decisões anteriores do próprio Supremo. “Essa mitigação não existe em nosso ordenamento. Ou a colaboração é homologada e cumprida em sua integralidade, ou é rescindida”, afirmou.
Na estratégia de fragilizar a acusação, Torres também levantou a tese de que o 8 de janeiro não configuraria crime consumado, mas um caso de “desistência”. Ele citou o episódio em que o ex-procurador-geral Rodrigo Janot entrou armado no STF para atentar contra o ministro Gilmar Mendes, mas não foi processado por tentativa de homicídio por ter desistido da ação. “Essa narrativa do 8 de janeiro é bastante incongruente. Se tudo isso aconteceu, eles desistiram. O arrependimento existe”, comparou.
O advogado ainda destacou que o desfile militar de agosto de 2021 não poderia ser criminalizado, pois tratava-se de evento previamente articulado no Congresso em meio à votação do voto impresso. Segundo ele, há registros oficiais e matérias da época que confirmam o caráter institucional da agenda.
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Por fim, pediu que, caso não haja absolvição, ao menos sejam aplicados princípios de absorção entre crimes semelhantes, como no caso de dano ao patrimônio público e dano ao patrimônio tombado. “Há várias alternativas, caso vossas excelências não se decidam pela absolvição, para que essa pena seja melhorada. Mas peço a absolvição”, concluiu.
O julgamento da Ação Penal 2668 começou nesta terça-feira (2/9) e seguirá nos dias 3, 9, 10 e 12 de setembro. A denúncia lista crimes como organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e dano qualificado ao patrimônio público. Caso seja condenado, Jair Bolsonaro pode receber uma pena de até 39 anos de prisão.
Elogios
Antes de apresentar os pontos centrais de sua contestação, Torres fez uma longa introdução em tom pessoal, elogiando a biografia e a trajetória dos ministros da Corte.
Em meio aos comentários, declarou: “É possível gostar do presidente do STF Alexandre de Moraes e do ex-presidente Bolsonaro. Eu respondo: sim. Sou eu! Se Bolsonaro precisar que eu leve cigarro para ele em qualquer lugar, pode contar comigo. Pois eu gosto dele, igual gosto do ministro Moraes”, afirmou o advogado.