Brasil x Estados Unidos

Sem anúncios concretos, Trump e Lula avançam na revisão do tarifaço

Reunião entre os dois presidentes, na Malásia, abre caminho para flexibilização da política tarifária dos EUA e aponta para novos acordos comerciais entre os dois países, mas ainda não há prazos definidos nem setores que podem ser contemplados

Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva negociam flexibilização de tarifaço, na Malásia -  (crédito: Ricardo Stuckert / PR)
Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva negociam flexibilização de tarifaço, na Malásia - (crédito: Ricardo Stuckert / PR)

O governo brasileiro espera para os próximos dias o anúncio, pela Casa Branca, das primeiras medidas de flexibilização da política tarifária sobre produtos brasileiros, com o avanço das negociações bilaterais entre Brasil e Estados Unidos. O otimismo é consequência da reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump, na tarde de ontem, em Kuala Lumpur, na Malásia. Os dois líderes acreditam que a agenda foi positiva para ambos os países e usaram as redes sociais para fazer comentários elogiosos um ao outro.

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"É uma grande honra estar ao lado do presidente do Brasil. Acredito que poderemos fazer bons acordos para ambos os países. Sempre mantivemos uma boa relação, acredito que ela continuará", escreveu Trump, na plataforma X, após a reunião.

O presidente Lula, por sua vez, descreveu o encontro como "ótimo" e disse estar confiante na reversão não só da política comercial norte-americana em relação ao Brasil, como das sanções impostas a autoridades brasileiras. "Discutimos de forma franca e construtiva a agenda comercial e econômica bilateral. Acertamos que nossas equipes vão se reunir imediatamente para avançar na busca de soluções para as tarifas e as sanções contra as autoridades brasileiras", escreveu o presidente, em um post no Instagram.

Logo após a conversa entre os líderes, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, revelou que as equipes dos dois países se encontrariam no mesmo dia para retomar as conversas sobre a revisão do tarifaço. Atualmente, uma série de produtos brasileiros que chegam nos Estados Unidos recebe uma sobretaxa de 50% no desembarque, o que inclui itens importantes para a pauta exportadora brasileira, como café, laranja, carne bovina e pescados.

O chanceler brasileiro disse que o saldo final do encontro foi "ótimo" e que o presidente Trump declarou que instruiria a sua equipe a iniciar um processo de negociação bilateral entre os dois países. Ele disse ainda que a questão do tarifaço deve ser resolvida "em pouco tempo" e que há interesse de ambas as nações para que isso aconteça, mas não foram acertados prazos ou datas.

O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Márcio Rosa, informou que o presidente Lula deixou claro, na reunião, que a motivação dos Estados Unidos para impor a elevação de tarifas ao restante do mundo não deveria ser aplicada ao Brasil, devido à balança comercial favorável para os estadunidenses. "(Lula) disse e repetiu isso diversas vezes. Mostrou, também, que a nossa pauta comercial e a relação diplomática de mais de 200 anos sempre foram muito boas", narrou a jornalistas que aguardavam o fim do encontro.

Visitas recíprocas

A aguardada conversa presencial entre os dois presidentes durou 45 minutos e, para Mauro Vieira, foi "descontraída" e "alegre". Segundo o chanceler, o presidente norte-americano disse admirar a história política de Lula. "O presidente Trump declarou admirar o perfil da carreira política do presidente Lula, já tendo sido duas vezes presidente da República, tendo sido perseguido no Brasil e voltado; provado sua inocência e voltado a se apresentar; e, vitoriosamente conquistado seu terceiro mandato à frente da Presidência da República."

Segundo o ministro, os presidentes combinaram de fazer visitas recíprocas, ainda sem data definida. Lula concordou em ir aos Estados Unidos, e Trump, em viajar ao Brasil. "O presidente Trump disse que admira o Brasil, que gosta imensamente do Brasil e do povo brasileiro e, portanto, a conclusão final é de que a reunião foi muito positiva e nós esperamos, em pouco tempo, em algumas semanas, concluir uma negociação bilateral que trate de cada um dos setores da atual tributação americana ao Brasil", pontuou.

"Passo relevante"

O aumento das tensões entre Brasil e Estados Unidos teve início no mês de julho, quando Trump anunciou, por meio de uma carta endereçada a Lula, uma tarifa de 50% motivada, além de questões comerciais, pela condução do processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros réus por trama golpista após as eleições de 2022. Com a conclusão do julgamento que resultou na prisão do ex-presidente e de outros acusados, houve um movimento de aproximação dos dois líderes, sobretudo durante a Cúpula das Nações Unidas (ONU), em Nova York, no fim do mês passado. Na ocasião, Trump disse publicamente ter havido uma "química" entre os dois.

Venezuela

Na reunião de ontem, Lula ainda se propôs a ajudar na mediação do conflito entre Estados Unidos e Venezuela. Segundo o chanceler Mauro Vieira, o objetivo é buscar soluções "mutuamente aceitáveis e corretas entre os dois países". A tensão com o regime do presidente Nicolás Maduro se intensificou ainda em agosto, quando os EUA enviaram navios de guerra e aviões militares para o Mar do Caribe.

Ontem, o governo venezuelano criticou o envio de um navio lançador de mísseis dos Estados Unidos a Trinidad e Tobago, arquipélago situado a apenas 11 km de distância do mar territorial da Venezuela. O regime de Maduro classificou a ação como uma "provocação" do país vizinho, "em coordenação com a CIA", a agência de inteligência norte-americana.

O presidente brasileiro vem mantendo uma postura crítica à ameaça de ataques a outros países sob a justificativa de combate ao narcotráfico, como alega o governo Trump em sua cruzada contra a Venezuela. "Se a moda pega, cada um acha que pode invadir o território do outro para fazer o que quer. Onde é que vai surgir a palavra respeitabilidade à soberania dos países?", disse Lula, antes do encontro com o presidente dos EUA.

Apesar disso, a ajuda brasileira foi encarada de forma positiva pela equipe de Donald Trump. O secretário de Estado, Marco Rubio, disse, em outra ocasião, que já havia interesse em uma mediação brasileira: "Nem mesmo Lula reconhece Maduro como o vencedor das eleições ou o líder legítimo da Venezuela. Então, não sei se eles (governo brasileiro) podem ser úteis ou não. Mas eu quero, é interessante", destacou.

Magnitsky e China

Na reunião de ontem, Lula também reforçou o pedido para a revogação de sanções, via Lei Magnitsky, a autoridades brasileiras e se disse disposto a negociar. A imprensa assistiu à primeira parte da reunião. Depois, os presidentes tiveram uma conversa de 45 minutos com a participação apenas das equipes de ambos os mandatários. Do lado norte-americano, o secretário de Estado, Marco Rubio, designado para negociar com o Brasil, esteve presente, assim como o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, e o representante comercial dos Estados Unidos, Jamieson Greer.

Após o encontro, Lula participou de uma reunião com empresários asiáticos, em Kuala Lumpur, durante a 47ª Cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean). Sem ter sido citada na reunião com Trump, Lula falou sobre a relação do Brasil com a China, um dos focos de conflito com a administração norte-americana. Para o líder brasileiro, não há espaço para uma nova Guerra Fria, em alusão à disputa pelo protagonismo mundial entre EUA e União Soviética após a Segunda Guerra Mundial.

"A Asean é um parceiro muito importante e tende a ser muito mais importante, porque o mundo de hoje não aceita mais uma nova Guerra Fria. Nós não queremos ficar disputando, como se disputou, a partir da Segunda Guerra Mundial, o que era do lado da Rússia, o que era do lado dos Estados Unidos. A gente não quer uma nova disputa do lado dos Estados Unidos, do lado da China. A gente quer estar do lado da China, dos Estados Unidos, da Malásia, da Indonésia, de todos os países do mundo que queiram fazer negócio conosco", afirmou.

 

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postado em 27/10/2025 03:54
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