Relações internacionais

Tarifaço na mesa de Vieira e Rubio

Chanceler e secretário dos EUA darão início, em encontro em Washington, às negociações sobre taxação às exportações brasileiras

O ministro Mauro Vieira, das Relações Exteriores, conversou ontem, por telefone, com o secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, sobre a abertura de negociações relacionadas ao tarifaço de 50% imposto pelo governo dos Estados Unidos às exportações do Brasil. O diálogo foi divulgado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em entrevista à rádio Piatã, da Bahia, e confirmado pelo Itamaraty. Segundo nota da pasta, Rubio convidou Vieira para integrar uma delegação que, em Washington, negociará diretamente as "questões econômico-comerciais" entre os países, conforme acertado na conversa segunda-feira entre Lula e o presidente Donald Trump, no primeiro contato entre os dois desde que o republicano voltou à Casa Branca.

"A pessoa que ele (Trump) indicou, que é o secretário de Estado Marco Rubio, ligou para o meu ministro Mauro Vieira. Talvez comece a ter conversa, a partir de agora. E vamos ver se a gente consegue se acertar, porque o Brasil não quer briga com os Estados Unidos", explicou Lula, acrescentando que ficou "surpreso" com a conversa que teve com o presidente norte-americano.

"O dado concreto é que ele me telefonou e, no telefonema, havia uma expectativa de que ia ter muita discussão. Ele me ligou da forma mais gentil que um ser humano pode lidar com outro. Eu tratando de forma civilizada, e ele me tratando de forma civilizada. Foi uma coisa extraordinária. Falei com ele aquilo que deveria falar, que era preciso retirar a taxação dos produtos brasileiros, que ele tinha sido mal informado. Então, agora, começa um outro momento", frisou Lula.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, o diálogo entre Rubio e Vieira foi consequência direita do contato entre os presidentes. Em nota, a chancelaria afirmou que houve um "diálogo muito positivo" entre os dois ministros. "O secretário de Estado convidou o ministro Mauro Vieira para que integre a delegação, de modo a permitir uma reunião presencial entre ambos, para tratar dos temas prioritários da relação entre o Brasil e os Estados Unidos", observa o MRE.

"Após diálogo muito positivo sobre a agenda bilateral, (Rubio e Vieira) acordaram que as equipes de ambos os governos manterão reunião, proximamente, em Washington, em data a ser definida, para dar seguimento ao tratamento das questões econômico-comerciais entre os dois países, conforme definido pelos presidentes", adianta a Chancelaria.

Rubio ocupa cargo equivalente ao de ministro das Relações Exteriores, e foi indicado por Trump, após a conversa com Lula, como o responsável por coordenar as negociações entre os países. Por sua vez, o Departamento de Estado norte-americano também classificou o contato entre os chanceleres como positivo, em nota oficial assinada pelo porta-voz adjunto da pasta Tommy Pigott. "O secretário Rubio e o ministro Vieira concordaram em se encontrarem breve e estabelecer um mecanismo bilateral para avançar com os interesses econômicos mútuos e outras prioridades-chave regionais", diz o documento.

Ataques

Até a conversa entre Lula e Trump, Rubio era uma das autoridades americanas mais eloquentes em criticar o Brasil, especialmente, o Supremo Tribunal Federal. Em postagens nas redes sociais e entrevistas, ele acusou o ministro Alexandre de Moraes, do STF, de praticar "censura" e promover "perseguição" contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos e três meses de prisão por encabeçar uma quadrilha que tentou dar golpe de Estado para manter-se no poder.

Inclusive, quando Trump citou, na Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 23 de setembro, chamou a atenção uma imagem captada na transmissão do discurso que flagrou Rubio com aparente expressão de contrariedade para aquele que foi o pontapé inicial para a aproximação entre os presidentes.

A indicação de Rubio como negociador animou os bolsonaristas, como o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) — que divulgou a versão de que a colocação do secretário de Estado era uma "pegadinha" de Trump —, e deixou autoridades brasileiras cautelosas. Rubio, porém, tem um relacionamento de muitos anos com Vieira. Os dois se conheceram quando o chanceler brasileiro era embaixador do Brasil em Washington, entre 2010 e 2015, e Rubio era senador pela Flórida.

A expectativa no governo federal é de que o secretário norte-americano siga as determinações de Trump e trate, somente, da relação comercial entre os países. Mesmo porque, nos contatos realizados até agora, o nome de Bolsonaro sequer foi mencionado — o julgamento do ex-presidente, porém, o pretexto usado por Trump para impore o tarifaço ao Brasil.

 

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