A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, ontem, por unanimidade, condenar mais nove pessoas por envolvimento na tentativa de golpe de Estado para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder após derrota nas urnas, em 2022. A maioria dos réus é conhecida por integrar o grupo dos "kids pretos", que fazem parte do Núcleo 3 da trama, acusados de planejar o assassinato de autoridades e de pressionar o Alto Comando do Exército para adesão ao plano criminoso. No julgamento, o colegiado também decidiu absolver o general da reserva Estevam Theophilo, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército.
Até o momento, 24 pessoas foram condenadas no STF pelo plano golpista. Essa foi a primeira vez que o relator, ministro Alexandre de Moraes, votou pela absolvição de um dos réus. Segundo o magistrado, a acusação contra o general carece de provas concretas, e foi baseada na delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, o que, segundo ele, gera dúvida razoável e impede a condenação. O entendimento foi acompanhado por todos os integrantes da Turma.
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Dois réus, o coronel do Exército Márcio Nunes de Resende Jr. e o tenente-coronel Ronald Ferreira de Araújo Jr., foram condenados por incitação ao crime e associação criminosa, com penas de 3 anos e 5 meses e de 1 ano e 11 meses, respectivamente, em regime aberto. Os outros sete tiveram penas que variaram de 16 a 24 anos de prisão em regime fechado, além de multa. Eles foram acusados de pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O relator considerou que há um "conjunto robusto de provas" da participação do grupo, que integra uma unidade de forças especiais do Exército. O magistrado também apontou a estratégia para deslegitimar o processo eleitoral brasileiro. "Tudo interligado para o cometimento dos crimes. Total interação. Toda a organização criminosa atuando em conjunto", afirmou.
Moraes ressaltou que os planos para matar autoridades são a faceta mais violenta do plano golpista. "A ideia era provocar um impacto, um caos social, para depois uma grande adesão das Forças Armadas e das pessoas que estavam sendo manipuladas, financiadas e mantidas na frente dos quartéis para que dessem o golpe", declarou.
Argumentos
As investigações apontam que a organização criminosa se utilizou de elevado nível de conhecimento técnico-militar para planejar, coordenar e executar ações ilícitas nos meses de novembro e dezembro de 2022. Alexandre de Moraes afirmou que a organização criminosa pretendia criar desordem social para justificar uma operação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e, depois, a assinatura de uma minuta golpista que previa a instauração de um Estado de exceção.
"Não há, então, nenhuma dúvida, a instrução processual demonstrou que o núcleo crucial cooptou esses militares próximos ao colaborador Mauro Cid e forças especiais com o objetivo de apoio, execução ao intento golpista e ruptura constitucional. Não há nenhuma dúvida, as provas são fartas", afirmou.
"Comprovou-se a presença, como foi demonstrado aqui pelo eminente relator, de documentos indicativos do uso da força para que se mantivesse o grupo político no poder", disse o ministro Cristiano Zanin, ao acompanhar o relator.
A ministra Cármen Lúcia ressaltou que esse grupo atuou de forma consciente e coordenada para fabricar narrativas falsas sobre o processo eleitoral, monitorar clandestinamente autoridades e elaborar planos operacionais para ruptura institucional.
"Não era apenas um passeio no parque. Era um golpe que ia prender e matar pessoas, cassar a Constituição, a cidadania e a imprensa livre. E isso não são conjecturas: estava escrito no planejamento apreendido com esses vários agentes públicos", declarou o presidente da Turma, ministro Flávio Dino.
O núcleo também foi responsável por planejar os assassinatos do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do próprio ministro Alexandre de Moraes. Segundo a investigação, o plano foi batizado pelos golpistas de "punhal verde e amarelo" e aconteceria em 15 de dezembro de 2022, três dias após a diplomação da chapa Lula e Alckmin no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e também três dias depois dos ataques na sede da Polícia Federal, em Brasília.
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