Polarização

Boicote às chinelas Havaianas vai parar no New York Times

Na matéria publicada no dia de Natal, o jornal norte-americano afirma que a sandália favorita do Brasil foi arrastada para o centro de uma "tempestade política"

A 10 meses das eleições presidenciais de 2026, o Brasil segue polarizado e agora mais um produto nacional passa a ser atribuído à política. A camisa amarela da seleção brasileira já havia sido "tomada" pela direita como símbolo dos bolsonaristas, agora chegou a vez das sandálias havaianas serem atribuídas aos petistas. A confirmação dessa polarização vem da última pesquisa do Datafolha, que mostra que a maioria da população segue dividida entre lulistas e bolsonaristas, mesmo após a condenação judicial do líder da direita, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

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Segundo o levantamento, 74% dos brasileiros afirmam se identificar com um dos grupos, da direita ou da esquerda. Do total pesquisado, 40% apoiam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e 34% são simpatizantes de Bolsonaro, que está internado em Brasília, se recuperando de uma cirurgia de hérnia inguinal. Apenas 18% se posicionaram na faixa de neutros, 6% disseram não apoiar nenhum deles e 1% não soube responder.

Tanto a pesquisa quanto as últimas reações populares em querer boicotar a marca Havaianas, por um comercial de TV que foi ao ar, são evidências de que esse ambiente de radicalização permanente tem produzido efeitos que vão além das instituições políticas. Na semana passada, um comercial de TV das Havaianas, estrelado pela atriz Fernanda Torres, foi ao ar em rede nacional. Na peça publicitária, ela diz: "Desculpa, mas eu não quero que você comece em 2026 com o pé direito". Em seguida, explica: "Não é nada contra a sorte, mas vamos combinar que sorte não depende de você. Depende da sorte. O que eu desejo é que você comece o ano novo com os dois pés. Os dois pés na porta, os dois pés na estrada. Os dois pés na jaca. Os dois pés onde você quiser — vai com tudo. De corpo e alma, da cabeça aos pés. Havaianas, todo mundo usa".

A atriz de 60 anos, que atuou no filme vencedor do Oscar Ainda Estou Aqui, que abordou a ditadura militar brasileira, ganhou projeção internacional, concedendo entrevistas nos principais canais de imprensa do mundo, onde ela fez duras críticas ao ex-presidente, um militar negacionista. Por se posicionar contra a direita, Fernanda passou a ser vista como um símbolo nacional de luta contra a ditadura e contra os bolsonaristas. A recente campanha de TV veio como a gota d'água para um grupo mais radical, que ligou a personagem à marca e vice-versa.

"Divisões latentes"

A polêmica, incentivada pelos filhos do ex-presidente, ganhou holofotes, repercutindo nacionalmente em veículos de comunicação e nas redes sociais. Gerou milhares de menções e memes nas redes sociais de políticos, artistas e anônimos. Os principais jornais do mundo também publicizaram a polêmica criada pelos bolsonaristas. O New York Times publicou reportagem, na quinta-feira, afirmando que a publicidade "reacendeu divisões políticas latentes no Brasil, que se intensificaram neste ano após o Supremo Tribunal Federal condenar Bolsonaro a 27 anos de prisão por planejar um golpe de Estado depois de perder a última eleição presidencial. O julgamento dividiu o país e provocou manifestações tanto da esquerda quanto da direita", diz um trecho da publicação.

Na matéria publicada no dia de Natal, o jornal norte-americano afirma ainda que a sandália favorita do Brasil foi arrastada para o centro de uma “tempestade política”. Citando o slogan da marca, “todo mundo usa, todo mundo adora”, o texto do NYT ressalta que, mesmo com as divisões políticas que fragmentaram o maior país da América Latina, o amor inabalável pelas sandálias Havaianas sempre foi um ponto de consenso nacional. Até agora.

Os dados do Datafolha também revelam que o petismo apresenta maior concentração entre mulheres, aposentados, pessoas com menor escolaridade e moradores da região Nordeste, além de forte presença entre católicos. Já o bolsonarismo é mais expressivo entre homens, empresários, pessoas com renda intermediária e eleitores da região Sul, com destaque entre os evangélicos. Outras pesquisas, publicadas nos últimos meses, apontam que o presidente Lula continua liderando as intenções de voto tanto no primeiro quanto no segundo turno, reforçando a percepção de continuidade, mais do que renovação.

A pesquisa foi realizada entre os dias 2 e 4 de dezembro. Foram ouvidas mais de 2 mil pessoas, em 113 municípios.

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