poder

Vorcaro e ex-presidente do BRB se contradizem

Ouvidos separadamente, dono do Master e Paulo Henrique Costa apresentam versões divergentes em depoimento à delegada da Polícia Federal que conduz o inquérito. Logo na sequência, foram acareados para explicar os pontos em que se desentenderam

O dono do Banco Master, Daniel Vorcaro, e o ex-presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, entraram em contradição, ontem, no depoimento que prestaram no Supremo Tribunal Federal (STF) para esclarecer pontos da liquidação extrajudicial da instrituição financeira, decretada pelo Banco Central (BC). Por causa disso, logo na sequência dos depoimentos, a delegada federal Janaína Palazzo — que pediu a prisão do banqueiro e conduziu os trabalhos — os colocou frente a frente para elucidarem as discordâncias. A acareação durou menos de uma hora.

Houve ainda uma terceira oitiva: a do diretor de Fiscalização do BC, Aílton de Aquino Santos, na condição de testemunha. Ele recomendou o voto pela liquidação do Master à diretoria colegiada da autoridade monetária. Também partiu dele, junto com o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, a iniciativa de informar o MPF sobre os indícios de fraude encontrados no banco de Vorcaro, liquidado em 18 de novembro.

Aílton, o banqueiro e o ex-presidente do BRB foram ouvidos separadamente. As sessões tiveram acompanhamento de um integrante do Ministério Público Federal (MPF) e do juiz auxiliar Carlos Vieira Von Adamek, do gabinete do ministro Dias Toffoli.

Conflito

Não foi, porém, uma sessão tranquila. No depoimento de Vorcaro, Janaína se desentendeu com Von Adamek em função de uma lista de perguntas de Toffoli, entregues pelo magistrado à delegada. Ela não aceitou e retrucou afirmando que a PF era quem conduzia a oitiva. Ele chegou a ligar para o ministro, que ordenou que as indagações fossem feitas. A situação se acalmou quando Von Adamek disse que tratavam-se de "sugestões".

Chamou a atenção uma pergunta ao banqueiro sobre como avaliava a atuação do BC em função do tempo de reação da instituição desde o momento em que tomou conhecimento dos indícios de que o Master tinha problemas até a decretação da liquidação. A indagação estava na lista de Toffoli, mas foi feita pela delegada.

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular

Há o temor do mercado financeiro de que venha algum tipo de intervenção na decisão do BC. Para especialistas ouvidos pelo Correio na condição de anonimato, a preocupação é de que uma reversão da liquidação extrajudicial do Master lance a sombra da desconfiança sobre todo o sistema financeiro.

Na tentativa de se antecipar a isso, no sábado passado, quatro entidades que representam bancos, financeiras e fintechs divulgaram nota conjunta em defesa da atuação do BC pela liquidação. Assinaram a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a Associação Brasileira de Bancos (ABBC), a Associação Nacional das Instituições de Crédito (Acrefi) e a Zetta (que representa empresas do setor financeiro e de meios de pagamento). Juntas, representam mais de 100 instituições, cerca de 90% do setor financeiro e 98% dos ativos do sistema. O documento pede a preservação da autoridade técnica e da independência institucional do BC no episódio. "(O Banco Central exerce esse papel com) supervisão bancária atenta e independente, de forma exclusivamente técnica, prudente e vigilante".

Na segunda-feira, foi a vez de a Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE) sair em defesa do BC, frisando a "autoridade técnica e o pleno e autônomo exercício das funções do Banco Central, (...) condição indispensável para a manutenção da estabilidade, credibilidade, confiança, higidez e bom funcionamento do sistema financeiro nacional". A entidade congrega 35 instituições financeiras, entre bancos públicos federais, subnacionais, agências de fomento, cooperativas de crédito, Finep e Sebrae.

A preocupação sobre uma eventual reversão da liquidação do Master não vem apenas do STF, mas, também, do Tribunal de Contas da União. A posição da autoridade monetária foi anexada a um despacho movido pelo ministro Jhonatan de Jesus, do TCU, que questionava os motivos da decisão do BC. A resposta — assinada pelo diretor Ailton e por Renato Brito Gomes, diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução, cujo mandato no BC termina hoje — será analisada por um departamento técnico da Corte e, somente depois, entregue para análise de Jhonatan. O TCU, porém, está em recesso e não há data para uma decisão.

O processo, que também corre em sigilo na Corte de contas, repercute uma representação formulada pelo MPF junto ao TCU para investigar possíveis falhas na supervisão do BC sobre o Master e suas empresas controladas. Segundo o despacho, o processo de liquidação extrajudicial da instituição pode ter apresentado falhas em uma possível omissão ou demora da autoridade monetária em reagir a sinais de degradação financeira do banco.

Vários alertas

Conforme mostram registros do Fundo Garantidor de Crédito (saiba como funciona no quadro), há vários alertas do mercado financeiro sobre os problemas de liquidez do banco de Vorcaro. Desde junho passado, o Master parou de fazer os depósitos compulsórios para o caixa do BC e pediu ao FGC a abertura de linhas de créditos — considerados indícios fortes de problemas de liquidez. Inclusive, no site do Fundo Garantidor, duas instituções ligadas a Vorcaro, o Master e o Master de Investimento, aparecem como insituições com pagamento "em andamento" no ressarcimento de clientes.

O depoimento de Vorcaro durou cerca de 2h30. O seguinte foi o do ex-presidente do BRB, que durou aproximadamente 2h. Por último ficou o diretor do BC, que deu explicações em pouco mais de uma hora.

A investigação do Master foi enviada ao Supremo por causa da apreensão com Vorcaro de um documento que citava o deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA). Tratava-se de uma suposta promessa de compra e venda de um empreendimento imobiliário, em Porto Seguro (BA). O parlamentar afirmou que o papel era uma opção de compra dada ao banqueiro, que teria interesse no negócio. Mas a transação não teria se concretizado devido às dificuldades financeiras enfrentadas pelo Master.

 

Mais Lidas

Ana Rayssa/CB/D.A Press - 13/03/2020. Credito: Ana Rayssa/CB/D.A. Press. Brasil. Brasilia - DF. CB Poder. Entrevista com o presidente do BRB, Paulo Henrique Costa.
Reprodução - Vorcaro foi o primeiro a depor sobre as inconsistências que levaram à liquidação do Master