
O papilomavírus humano (HPV) é uma das infecções sexualmente transmissíveis mais comuns do mundo e está diretamente associado ao câncer de colo do útero, responsável por 99% dos casos da doença. No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), mais de 17 mil novos diagnósticos surgem todos os anos, principalmente em mulheres entre 30 e 50 anos, resultando em cerca de 7 mil mortes anuais. Entre as mulheres com menos de 35 anos, o câncer do colo do útero é o que mais mata.
O vírus pode permanecer silencioso por anos e, quando não diagnosticado a tempo, evoluir para diferentes tipos de câncer, como vulva, vagina, ânus, pênis e orofaringe. Apesar da gravidade, a prevenção é altamente eficaz por meio da vacinação e de exames regulares, como o Papanicolau e o teste de DNA do HPV.
Para ampliar o debate, foi criado o Setembro em Flor, campanha nacional organizada pelo Grupo EVA (Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos). A iniciativa chama atenção para os cinco principais cânceres ginecológicos — colo do útero, ovário, endométrio, vulva e vagina — e conta com a participação de especialistas que reforçam a importância da prevenção. O ginecologista e professor de ginecologia e obstetrícia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Agnaldo Lopes destacou que a desinformação e o medo ainda são barreiras significativas para alcançar altas taxas de vacinação.
Embora o Brasil tenha avançado em relação à cobertura vacinal — atingindo 82,8% entre meninas e 67,3% entre meninos em 2024 — ainda há regiões com índices preocupantes. Além disso, estudos recentes mostram que 54,6% dos jovens entre 16 e 25 anos já tiveram contato com o HPV, número que reforça a necessidade de estratégias educativas e maior adesão à imunização.
Ainda que o HPV seja mais associado às mulheres, ele também afeta diretamente os homens, que podem desenvolver verrugas genitais e cânceres de pênis, ânus e orofaringe. Além de transmitirem o vírus a parceiros sexuais, muitos homens permanecem assintomáticos, o que dificulta a detecção precoce.
A atriz e modelo Aline Campos, de 37 anos, compartilhou sua experiência com o HPV, diagnosticado em duas ocasiões distintas, durante o lançamento da campanha e ressaltou o impacto da informação. "Quando descobri, não fazia ideia da gravidade. O HPV mudou minha vida, mas também me fez entender a importância da vacina e dos exames de rotina. Hoje, falo para que outras mulheres não passem pelo que eu passei", contou.
No evento, Aline dividiu a informação com o público de que recentemente seu exame apontou resultado negativado para o HPV. Quando recebeu o diagnóstico inicial, o quadro era de Neoplastia Intraepitelial Cervical (NIC) 1, que evoluiu para NIC 3, exigindo cirurgia pelo estágio avançado da doença pré-cancerígena. Após o procedimento, o acompanhamento médico exige retornos e exames periódicos a cada seis meses, durante dois anos. Já no primeiro retorno, a notícia foi positiva: o exame mostrou a negativação do vírus, indicando que o tratamento está se encaminhando de forma favorável.
Sintomas
Muitas vezes assintomático;
Lesões genitais (verrugas) em alguns casos;
Pode evoluir silenciosamente para câncer.
Transmissão
Principalmente por contato sexual sem preservativo;
Também pode ocorrer por contato pele a pele na região genital;
Afeta homens, mulheres e pessoas trans.
Prevenção
Vacinação gratuita pelo SUS para meninos e meninas de 9 a 14 anos;
Exames regulares (Papanicolau e teste de DNA do HPV);
Uso de preservativo em todas as relações sexuais.
Riscos
99% dos casos de câncer de colo do útero têm relação com o HPV;
Pode causar também câncer de ânus, pênis, vulva, vagina e orofaringe;
Jovens entre 16 e 25 anos são os mais expostos.
Dados no Brasil
Mais de 17 mil novos casos de câncer de colo do útero por ano;
Cerca de 7 mil mortes anuais;
54,6% dos jovens já tiveram contato com o HPV.
Panorama global
A OMS estima que 80% da população sexualmente ativa têm contato com o vírus;
Cerca de 600 mil casos de câncer do colo do útero são registrados anualmente;
Atenção especial
Homens trans também devem realizar rastreamento cervical e anal;
Informação e combate a tabus são fundamentais para aumentar a adesão à vacina;
A OMS estima que é possível eliminar o câncer de colo de útero no futuro com vacinação, rastreamento e tratamento.
Mitos sobre o HPV
HPV só afeta mulheres ;
HPV sempre terá sintomas;
HPV significa câncer imediato;
Preservativo elimina completamente o risco;
Vacina não é necessária se já teve o vírus.
Importância da vacina
9 a 14 anos: eficácia de 74% a 93%;
15 a 18 anos: eficácia de 12% a 90%.
Palavra do especialista
Quais são os principais desafios para ampliar a adesão à vacina, especialmente entre os meninos?
Um dos maiores obstáculos é o tabu em torno do HPV. Muitas pessoas acreditam, de forma equivocada, que quem está em relacionamento estável não corre risco e, por isso, não precisa se vacinar. Esse mito reduz a percepção de vulnerabilidade e afeta tanto homens quanto mulheres: relacionamentos estáveis não eliminam a possibilidade de exposição ao vírus, que pode ficar latente sem apresentar sintomas por muitos e muitos anos. Além disso, o fato de a vacinação do PNI ter sido inicialmente voltada apenas para meninas alimentou a impressão de que a prevenção não é uma preocupação masculina. Isso gera uma falsa sensação de que a vacina não é necessária para os meninos, quando, na verdade, a infecção pode causar lesões e cânceres em ambos os sexos. Vale lembrar também que vacinar homens, além de protegê-los, ajuda a proteger as mulheres, pois reduz a circulação do vírus.
É possível imaginar um futuro sem câncer de colo do útero no Brasil, como propõe a OMS?
Seguindo a tríade da OMS — vacinação, rastreamento e tratamento adequado — acreditamos que é, sim, possível eliminar o câncer de colo de útero no Brasil. A MSD continuará sendo parceira estratégica do país na oferta do imunizante, nas campanhas de conscientização e no desenvolvimento de estudos. O futuro sem câncer de colo de útero depende de políticas públicas contínuas e da participação ativa da sociedade.
Em relação à vacina nonavalente, disponível na rede privada, há planos de disponibilização no SUS, que hoje oferece a quadrivalente? Qual seria o impacto na prevenção?
A vacina nonavalente oferece proteção contra nove tipos do vírus HPV (6, 11, 16, 18, 31, 33, 45, 52 e 58) e está disponível para todas as pessoas entre 9 e 45 anos na rede privada. A proteção ampliada pode trazer impactos significativos para a saúde pública. Estudos indicam que os cinco tipos que chegam nessa nova vacina são responsáveis por um acréscimo de 20% dos casos de câncer de colo do útero (além dos 70% causados pelos quatro subtipos contidos na vacina quadrivalente, disponível no SUS), ou seja, a nonavalente atinge 90% de proteção contra o câncer de colo do útero. Além disso, aumenta em 5% a proteção para o câncer vaginal; entre 10% e 15% para o de vulva; e de 20% a 35% para o anal, em comparação com a quadrivalente.
Fernando Cerino é diretor de Vacinas da MSD Brasil, farmacêutica que produz, em parceria com o Instituto Butantan, a vacina contra HPV no país
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte
*A estagiária viajou a São Paulo a convite do Grupo Eva
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