Cientistas da Universidade de Chicago e do Laboratório Nacional de Argonne (em Lemont, no Illinois) desenvolveram um sensor portátil capaz de identificar, em menos de dois minutos, traços minúsculos de substâncias tóxicas conhecidas como perfluoroalquílicas e polifluoralquílicas (PFAS).
Também chamadas de "químicos eternos", elas se destacam pela durabilidade extrema no meio ambiente e no corpo humano. Há anos, essas fórmulas são utilizadas na composição de diversos produtos domésticos, como panelas antiaderentes, tecidos resistentes a manchas, espumas para combate a incêndios e, também, em aplicações industriais. Algumas delas estão associadas a uma série de problemas de saúde, incluindo o câncer.
As concentrações ínfimas de PFAS referem-se a 250 partes por quatrilhão (pqq) — equivalentes a um grão de areia dentro de uma piscina olímpica. Isso torna o sensor especialmente útil para o monitoramento da água potável em relação a duas dessas substâncias mais tóxicas: o ácido perfluoro-octanoico (PFOA) e o ácido perfluoro-octanossulfônico (PFOS). Para ambos, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) propôs, recentemente, um limite de quatro partes por trilhão.
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Para criar a tecnologia, descrita em artigo publicado na revista Nature Water, os pesquisadores desenvolveram um método que utiliza sondas exclusivas para quantificar os níveis de PFAS. Ele foi produzido por meio de técnicas de aprendizado de máquina, que tornaram o sensor altamente seletivo, ou seja, capaz de reconhecer apenas a PFAS desejada, mesmo em meio a dezenas de outros contaminantes.
Junhong Chen, líder da pesquisa e professor de engenharia molecular na Universidade de Chicago, contou ao Correio que sua equipe usou simulações de dinâmica molecular para compreender, em detalhes, as interações entre a sonda e as moléculas-alvo. "Essas descobertas computacionais forneceram a base para o trabalho de aprendizado de máquina que estamos conduzindo atualmente."
Aparelho
O biomédico Pedro Veloso explica que técnicas de aprendizado de máquina são mecanismos que permitem ao computador identificar padrões em grandes volumes de dados para fazer previsões. "Nesse estudo, elas ajudaram a selecionar sondas moleculares com maior afinidade e seletividade para o PFOS, acelerando o desenvolvimento de um sensor mais preciso e sensível", afirmou.
O funcionamento do sensor se baseia em uma alteração na condutividade elétrica na superfície de um chip de silício, no momento em que uma molécula de PFAS se liga a ele. "Nós optamos pelo chip de silício padrão por seu baixo custo e pela possibilidade de produção em larga escala. Também estamos explorando chips baseados em nanomateriais, que podem aprimorar ainda mais o desempenho do sensor", acrescenta Chen.
De acordo com ele, o principal desafio técnico de construir o sensor foi desenvolver uma forma de identificar as PFAS de maneira específica e em concentrações extremamente baixas, conforme os limites regulatórios definidos pela EPA.
Veloso esclarece que o chip funciona como o próprio sensor. A sonda, por sua vez, é uma película química fixada ao sensor, que se liga ao PFOS e produz uma alteração elétrica. "O dispositivo portátil apenas acomoda o chip, faz a água circular por ele e interpreta o sinal, para exibir o resultado", afirma. O biomédico acrescenta que "o uso de aprendizado de máquina foi fundamental para selecionar a sonda mais eficaz". No entanto, ressaltou que o chip é o responsável pela detecção da substância tóxica, ao funcionar como um "nariz eletrônico" do sensor".
Vantagens e futuro
Entre os principais benefícios do sensor, estão a resposta rápida; o limite de identificação ultrabaixo, na ordem de partes por quatrilhão; e a alta seletividade, diante de outros interferentes. O dispositivo permite o monitoramento contínuo em linha, ou seja, a observação em tempo real. "Na prática, isso viabiliza a triagem em campo, reduz os custos logísticos com análises laboratoriais e antecipa decisões de gestão da água, algo que os laboratórios convencionais, sozinhos, não conseguem fazer com a mesma rapidez", afirma Veloso.
Embora ainda não esteja disponível no mercado, Chen revela que a equipe trabalha intensamente para transformar a tecnologia em produtos comerciais. "Nosso objetivo é desenvolver filtros de água inteligentes integrados a esses sensores", revela. O líder da pesquisa ressalta que comunidades poderão utilizar o chip de baixo custo para detectar rapidamente a presença de PFAS no abastecimento de água. "Isso é fundamental, pois o consumo de água contaminada com PFAS pode levar ao comprometimento do sistema imunológico, danos ao corpo e até mesmo câncer. O dispositivo é muito fácil de usar, semelhante aos testes de glicose domiciliares, e não requer treinamento especializado", conclui.
* Estagiária sob a supervisão
de Rodrigo Craveiro
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