Biotecnologia

Cientistas criam fungos com gosto e textura de carne

Biotecnologia chinesa melhora sabor e aparência de alimento que pode servir como fonte de proteína; opção deve aumentar a variedade na dieta de pessoas vegetarianas e veganas

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A nova versão do fungo com gosto de carne criada em laboratório -  (crédito: Xiao Liu/Universidade de Jiangnan)
A nova versão do fungo com gosto de carne criada em laboratório - (crédito: Xiao Liu/Universidade de Jiangnan)
postado em 01/12/2025 15:40 / atualizado em 01/12/2025 15:44

Microbianas — nome técnico das proteínas encontradas em alguns seres vivos, como bactérias, fungos e algas — têm grande valor nutricional e vêm sendo cada vez mais usadas como fonte de alimentação para pessoas que não comem carne. Com essa demanda por opções que não sejam de origem animal em alta, a indústria de alimentos fúngicos tem uma nova opção, criada com biotecnologia, de um produto melhor e mais barato.

Cientistas chineses aprimoraram as propriedades de um fungo, que tem gosto e textura de carne, e muito potencial para ser usado em grande escala como alimento. O Fusarium venetatum, nome científico da espécie, já era usado como alternativa à carne, mas sua versão "original", presente na natureza, é muito difícil de ser digerida pelo corpo humano. O trabalho modificou geneticamente o organismo, e criou uma nova forma do fungo, mais fina – o que facilita a digestão e aumenta a aparência de carne animal – e fácil de ser cultivada. O trabalho foi publicado na revista Trends in Biotechnology.

A vice-coordenadora em Brasília da Sociedade Brasileira de Veganismo (SBV), Mila Monteiro, explica que as opções fúngicas atuais não são as principais alternativas para o dia a dia de alguém vegano ou vegetariano. "O valor proteico dos cogumelos já conhecidos não é alto, não sendo considerados relevantes como fonte de proteína. Quantidades mais similares ao da carne animal encontramos, por exemplo, na soja", afirma.

Sabor e ecologia

A técnica usada por pesquisadores da Universidade de Jiangnan, em Wuxi, na China, é baseada na alteração genética do fungo que existe atualmente. Para isso, dois genes foram retirados das células fúngicas. Um deles aumenta a rigidez e espessura da espécie, algo que dificulta a digestão e faz com que boa parte das proteínas acabe desperdiçada, pois o corpo humano não consegue "quebrar" as partes do alimento. O outro gene é responsável pelo metabolismo celular ainda na fase de cultivo. Essa parte do DNA original determina que o fungo tenha um processo de crescimento que exige muitos nutrientes, o que, na produção, gera maior gasto de recursos para nutrir a "plantação".

Sem esses dois genes, o Fusarium venetatum ficou muito mais macio e saboroso, e mais fácil de ser produzido, consumindo bem menos nutrientes para crescer – algo que pode baratear o alimento e aumentar a sua oferta. Esse processo mais simples de cultivo ainda teve outro resultado importante para a indústria alimentícia e para o planeta: o impacto ambiental, com as emissões durante toda a produção do fungo, caiu 60% em relação ao "plantio" da versão atual. Esse número considera as liberações de gases do efeito estufa.

Mila Monteiro, da SBV, vê com bons olhos a descoberta chinesa, caso o produto seja seguro e se concretize como opção proteica. "É positiva toda alternativa que puder reduzir até eliminar a exploração animal, desde que seja sustentável ao meio ambiente, saudável às pessoas, financeiramente acessível e, principalmente, gostoso, né?", destaca ela. "Isso pode reduzir o impacto da nossa alimentação nas mudanças climáticas", acrescenta.

 *Estagiário sob supervisão de Lourenço Flores

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