A segunda audiência de instrução do processo que apura a responsabilidade pela morte do gari Laudemir Fernandes de Souza ocorre nesta quarta-feira (26/11), no 1º Tribunal do Júri do Fórum Lafayette, no Centro de Belo Horizonte. Na sessão de hoje, estão previstos os depoimentos de seis testemunhas de defesa, além do interrogatório do réu.
Na terça-feira (25/11), foram ouvidas oito testemunhas de acusação, entre elas três garis que presenciaram o assassinato do colega enquanto ele trabalhava no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste da capital. Laudemir, de 44 anos, foi morto com um tiro disparado pelo empresário Renê da Silva Nogueira, de 47 anos, que, segundo a denúncia, utilizou a arma pertencente à esposa, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira.
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Eledias Aparecida Rodrigues, de 44 anos, Tiago Rodrigues, de 38, e Adilson Sérgio Ferreira, de 36, relataram momentos de forte comoção ao relembrar o crime, ocorrido em agosto deste ano. O trio estava no caminhão de coleta de lixo no dia do crime, que era dirigido pela motorista Eledias. Ela contou ao jornal Estado de Minas como sua vida se transformou desde o dia 11 de agosto.
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“A morte do Laudemir, o assassinato de uma pessoas boníssima, afetou minha vida por completo. Até hoje não voltei à normalidade”, conta. “Em primeiro lugar, estou fazendo terapia. Cheguei a pensar em parar de trabalhar, de deixar de ser motorista de caminhão de lixo. Minha ansiedade disparou. Estou tomando remédios para conter a ansiedade, para me controlar”, afirma Eledias. Ela também não consegue dormir direito, diz que se sente constrangida e não sabe explicar o motivo. Tudo está diferente, embora siga trabalhando na coleta de lixo do mesmo bairro onde ocorreu o crime, o Vista Alegre.
Dois dos parceiros de Eledias, Tiago e Adilson, estavam no momento em que Laudemir foi morto. Eles não estão mais na mesma linha de trabalho. Ela, ao contrário, preferiu continuar lá. “As pessoas do bairro são ótimas, amorosas, são acolhedoras. Depois do crime, passaram a me tratar melhor ainda”.
Sobre a expectativa do julgamento, Eledias diz que espera que Renê pague pelo crime cometido. “Existe o problema do poder econômico, que é o exemplo que fica nesse crime. É preciso que se entenda que ali, no caminhão, estavam profissionais, trabalhadores, dando duro. É preciso entender que, na sociedade, todos precisam de todos. Médicos, engenheiros, policiais, garis. Não importa. Cada um tem seu papel e todos se ajudam”.
Para ela, o assassinato não foi um acidente. “Ele, o Renê, o assassino, olhou pra mim primeiro. Era um olhar ameaçador. Ele saiu do carro, retornou ao volante, arrancou o carro e parou. Desceu novamente, armado, e voltou na nossa direção. Nesse momento, o recipiente de balas, da arma, caiu. Ele abaixou e o apanhou, colocando-o na arma novamente. Mirou em mim, depois no Adilson. Laudemir, nesse momento, carregava um saco de lixo e se dirigia para o compactador do caminhão, onde se coloca o lixo. O Renê mirava no caminhão e atirou. Acertou o Laudemir. O matou."
Eledias diz que hoje perdoa Renê, mas entende que ele tem de pagar, que tem de ficar na cadeia, e que lá possa meditar sobre o que fez, "que matou um inocente". Ela fala também sobre a delegada. Diz sentir pena dela. “Ela é uma pessoa infeliz, se deixou levar por um homem que a enganou. É difícil a gente imaginar o porquê ficou com esse homem”.
Tiago, o outro gari testemunha, diz que tudo o que aconteceu o faz pensar. “Só me preocupo hoje em valorizar a vida. Minha família, sou pai, é prioridade. Estas são as minhas prioridades”.
Em busca de um futuro
Depois da morte do amigo Laudemir, Tiago diz que pensou em deixar a profissão de gari. No entanto, não vislumbra nada de imediato que pudesse fazer, pois tem uma família para sustentar. “Eu preferi mudar de linha, sair do Bairro Vista Alegre. Não quero ficar revivendo a cena. Não é bom para o meu psicológico. Isso não é nada bom. Penso em trocar de profissão e, muito disso, por causa de brincadeiras, completamente sem graça, que fazem com a gente na rua”, diz.
Tiago fala que as pessoas quando o veem gritam coisas como: “Olha o tiro” ou "Olha o Renê aí”. Ele diz que finge não escutar, o que considera ser a melhor atitude.
O gari espera pela condenação de Renê. “Espero justiça. Não se pode passar a mão na cabeça de um criminoso, assassino. Já pensou se ele é solto e sai por aí. Vai acabar chegando numa esquina e matar outra pessoa. E vai dizer, novamente, que não foi ele”.
Adilson também conta que sofre a cada dia, sempre que abre os olhos, ao acordar. “Nada é como antes. É uma grande tragédia. Afetou a vida de todos nós que trabalhávamos com o Laudemir. O tiro acertou não só nele, mas em todos nós, garis”.
Assim como Eledias e Tiago, Adilson diz que espera pela condenação de Renê. “Não podemos esperar mais nada, além disso”.
O assistente da acusação, o advogado Tiago Lenoir, diz que espera pela decisão de que Renê seja levado a júri popular. “Hoje é dia de sentença de pronúncia. Nesta terça-feira serão ouvidas as testemunhas de acusação. Depois será a vez dos policiais militares e civis que trabalharam no caso. Na quarta-feira, será a vez das testemunhas de defesa e do réu. Tudo está muito claro. Renê foi preso em flagrante. Não tem o que contestar. Laudemir estava trabalhando e, em momento algum, ameaçou ou se dirigiu a Renê.
Como foi o crime?
A equipe de limpeza estava na Rua Modestina de Souza, no Bairro Vista Alegre, quando Eledias percebeu que uma fila de carros se formava atrás dela e decidiu manobrar o caminhão para a direita e permitir a passagem dos veículos, entre eles um BYD conduzido pelo empresário Renê da Silva.
Segundo o depoimento de Eledias, ela e os outros garis disseram ao suspeito “vem, vem, pode vim (sic)”, orientando que havia espaço suficiente para ele passar com o carro. Logo depois, Renê pegou uma arma e apontou para a motorista, ameaçando atirar. O gari Tiago Rodrigues, então, posicionou-se entre o empresário e a colega, questionando: “Você vai dar um tiro na mulher trabalhando? Vai matar ela dentro do caminhão?”.
Renê conseguiu passar sem esbarrar no caminhão e parou cerca de três metros à frente. Desceu do carro com a arma em punho, apontou para os trabalhadores, disparou e atingiu Laudemir no abdômen.
Conforme os registros, o tiro acertou o lado direito das costelas e saiu pelo esquerdo. Ele deu entrada no Hospital Santa Rita, em Contagem, na Grande BH, mas morreu momentos depois por hemorragia interna. No local do crime, foi recolhido um projétil intacto de munição calibre .380.
Oito testemunhas de acusação foram ouvidas e a primeira audiência de instrução foi encerrada às 13h30. O réu, Renê da Silva Nogueira Júnior, acompanhou as oitivas por videoconferência. Das oito testemunhas, metade era composta por colegas de Laudemir que estavam na cena do crime, e a outra, por policiais civis e militares. As testemunhas de defesa, policiais civis e militares que trabalharam no caso, e o réu prestarão depoimento nesta quarta-feira (26/11).
