Entrei no Parque Güell em Barcelona e uma música lindíssima acariciou-me os ouvidos. Um violinista tocava Bachianas Brasileiras, de Heitor Villa-Lobos. Fiquei orgulhoso de ser brasileiro. Entrei no Alla Scala em Milão, e logo no saguão vi o busto de Carlos Gomes. Fiquei orgulhoso de ser brasileiro. Entrei num avião da LOT em São Petersburgo, rumo a Varsóvia, com um empuxo poderoso na decolagem. Curioso, abri o folheto na bolsa do encosto: era um EMB 192, da Embraer. Fiquei orgulhoso de ser brasileiro.
Agora em O Globo e Estadão leio razões para me envergonhar do meu país, de esquecer o ufanismo do Conde Afonso Celso e parecer ironia o verso de Bilac "não verás país nenhum como este". São informações sobre o contrato de 129 milhões do Banco Master com o escritório de advocacia da família do ministro Moraes. O contrato é suficientemente eloquente para dispensar adjetivos — tal como os 430 mil guardados no flat de Sóstenes, o líder do PL. O senador do MDB por Sergipe Alessandro Vieira colhe assinaturas para investigar as razões do contrato, já que envolve um banco que faliu por ações nada éticas e um escritório da família de um ministro da Suprema Corte. Segundo Malu Gaspar, na página de opinião de O Globo, Moraes agiu como advogado de Vorcaro, do Master, junto ao presidente do Banco Central. O senador Alessandro e o ministro Alexandre devem ter diferenças que vão muito além das letras do nome.
Suponho que o senador ficou muito inquieto quando percebeu que o escândalo não escandalizou o Supremo, nem os jornais, nem os brasileiros. Parece que já nos familiarizamos com a falta de ética, desde que foram anuladas as decisões e sentenças da maior reação que o país teve contra sua cultural impunidade, em que condenados foram descondenados, multados foram desmultados, e foram esquecidos até os que devolveram o que roubaram. E da permissividade em julgar ações que envolvem escritórios familiares. Imagino que, bem cedo, em Passo Fundo, os pais do menino Alessandro incutiram nele a importância da ética, do equilíbrio da Justiça, do respeito às leis, dos princípios básicos da moralidade nas relações humanas. Ele agora não conseguiu engolir o escândalo como se fosse um sapo goela abaixo, e colhe assinaturas para levar a luz da verdade e tentar recuperar a moral perdida nos desvãos do Estado brasileiro.
Tenho dito que se o problema ético é do Estado brasileiro, a solução está em nós, origem do poder, e em nossos representantes; essa é nossa responsabilidade. Mas se o problema ético também está em nós, na cumplicidade, na falta de nos escandalizarmos com escândalos, então, não temos solução. Nem Trump nem Deus agirão por nós. Como também me educaram na ética, fico com aquele que quer investigar se houve proteção ao Master com pressões sobre o Banco Central, como li em O Globo e, no sigilo que Toffoli impôs sobre as relações do banqueiro Vorcaro, dois dias depois do voo com um dos diretores do Master. CPI para saber quem são os protegidos. Fachin quer código de conduta porque os supremos estão acima do Conselho Nacional de Justiça e da lei Orgânica da Magistratura. Gilmar alega que não precisa. Também acho. Código de conduta é forjado na medula desde criança, em casa. Ou ética, ou abismo moral.
